MEA-CULPA E A CRUZADA CONTRA A CORRUPÇÃO

MEA-CULPA E A CRUZADA CONTRA A CORRUPÇÃO

O MPLA assume responsabilidades no crescimento da corrupção, por “inacção”, e quer maior fiscalização do parlamento ao Governo. Ao mesmo tempo, quer o repatriamento do dinheiro ilegalmente posto no estrangeiro, voluntária, ou coercivamente, e promete reforçar a UIF, SIC, a PGR e os tribunais.

João Lourenço, na qualidade de vice-presidente do MPLA, disse, ontem, no enceramento do seminário organizado pelo grupo parlamentar do partido sobre o combate à corrupção, que decorreu desde Segunda-feira, 11, no Centro de Conferência de Belas, em Luanda, que “a direcção do MPLA, como órgão colegial, assume, colectivamente, a responsabilidade do que se passou, que se deveu à nossa inacção, e de cujas consequências (da corrupção) está hoje o país a pagar”

O seminário, considerou, veio em boa hora, com mérito, mas avançou que a iniciativa pecou por ser tardia, considerando que o país vive em paz há quinze anos, em plena fase de reconstrução nacional, no quadro de uma economia de mercado, e que foi precisamente nesse período que esses fenómenos perniciosos e condenáveis (corrupção e nepotismo) nasceram, cresceram, se enraizaram e ameaçavam se perpectuar sem que se tivesse enfrentado com a determinação e coragem que se impunham”.

Apesar disso, continuou, pelas suas tradições, pelos valores que defende, às vezes desviados por pessoas, pelo apoio indefectível que sempre encontrou junto do povo angolano, considerou o MPLA como sendo, efetivamente, “o partido mais bem preparado para realizar este difícil combate”. Contudo, mostrou-se consciente das dificuldades, pois tal combate “enfrentará interesses profundamente enraizados e vai por em causa agentes públicos que colocam os seus interesses pessoais e de família acima do interesse público”.

Mas João Lourenço tem tal combate como fundamental para a diversificação económica, com a atracão de investimentos estrangeiros. Disse também que o país deve deixar de depender de um único produto de exportação. “Foi importante ter sido referenciado pelo presidente do partido que o programa de reformas do anterior Governo, financiado pelo sector do petróleo, foi gravemente afectado pela quebra do preço do produto no mercado internacional, tendo baixado substancialmente as reservas internacionais líquidas no primeiro semestre do corrente ano, situação que se arrastou até à tomada de posse do novo Executivo, uma razão mais para que o país deixe de depender de um único produto de exportação, até porque não é crível que o petróleo volte a atingir alguma vez os elevados preços do passado”.

Corrupção é igual a epidemia que mata

Programa de desenvolvimento económico 2017 / 2022, disse, aponta os caminhos possíveis, mas tem de passar a haver maior exigência na formação dos funcionários da educação, da saúde e da assistência social e uma atenção redobrada aos problemas destas áreas.

Apelou a um cuidado “extremo” na aplicação dos fundos públicos nessas áreas, para corrigir as insuficiências desses serviços que afectam directamente o bemestar e podem pôr em risco a vida dos que deles dependem. A realização deste seminário, augurou, que seja entendida como vontade e determinação expressa do MPLA em levar a cabo uma “verdadeira cruzada de luta contra a corrupção, o nepotismo, o compadrio em todas as esferas da sociedade e a todos os níveis, “até algum dia podermos declarar o nosso país livre destes males, a exemplo de quando se declara quando um país se livra de uma epidemia que a todos ameaça, porque a semelhança e comparação destes dois factos nos parece adequada”.

Estes males serão combatidos contando com a participação de todos na moralização da sociedade, com todos os partidos políticos, as igrejas, as organizações não governamentais, as associações socioprofissionais, as organizações juvenis, e femininas, as universidades, na promoção de programas de educação para o respeito e preservação do bem publico.

Parlamento é para fiscalizar

João Lourenço disse esperar que o parlamento, “desta vez, finalmente, e ao cabo de muitos anos de indefinição, exerça, de facto, a sua função fiscalizadora do Executivo, nos termos previsto na Constituição e na lei”. Já sobre o Executivo, o vice-presidente do MPLA, que também é Titular do Poder Executivo e chefe de Estado, espera que desempenhe um importante papel na luta conta a corrupção e outros males.

“Que haja transparência na adjudicação de obras públicas: barragens hidroeléctricas, portos, aeroportos e outras, que se respeite a necessidade da realização de concursos públicos, que a privatização total ou parcial de empresas públicas, a exemplo do que vai acontecer em breve com a Angola Telecom, ou com a quarta licença de telefonia móvel, seja feita de forma transparente, através de concurso público, ou através da venda de acções na em bolsas de valores se reunirem requisitos para tal”.

É indispensável abalar o sentimento de impunidade que leva os praticantes de actos ilícitos a considerarem- se a salvo de qualquer acção das autoridades constituídas ou que qualquer eventual punição. A legislação existente no país sobre esta matéria constitui base suficiente para se iniciar uma cruzada mobilizadora em defesa da causa pública, sem prejuízo da adopção de outras medidas no futuro, considerou.

Conforto de milhões

Do mais alto magistrado da Nação, enquanto Presidente da República e Titular do Poder Executivo, “usando os poderes e faculdades que a Constituição, a lei e o mandato do povo lhe conferem”, continuou, “espera-se que assuma a liderança desta luta que sabemos ser feroz e prolongada, mas da qual sairemos vencedores porque ele não está sozinho. Somos milhões e contra milhões ninguém combate, quem tentar será derrotado, como dizia Agostinho Neto”.

Este conforto nos milhões de angolanos que querem o combate à corrupção. Já Lourenço o havia referenciado na campanha eleitora que o levou ao cargo de Presidente da República. Necessitando o país de capitais para se desenvolver, para realizar investimento público em projectos geradores de riqueza, mas sobretudo de emprego para os angolanos, para os jovens, disse que o neste momento se está a trabalhar na remoção dos factores inibidores do investimento privado estrangeiro, como a morosidade na concessão de vistos, a burocracia dos serviços públicos que têm a missão de aprovar os projectos até à sua implementação e “a corrupção de que estamos a falar neste seminário e outros, para atrair o investimento estrangeiro para Angola”. E deu explicou-se:

“As perspectivas são boas e encorajadoras, se tivermos em conta que muitas intenções de investimento têm surgido para diferentes ramos da economia, com destaque para mais de quinze ofertas de refinarias de petróleo após a tomada de posse do novo Conselho de Administração da Sonangol, mas pretendemos que os angolanos detentores de verdadeiras fortunas no estrangeiro sejam os primeiros a vir investir no seu próprio país”, desafiando-os com um “se são mesmo verdadeiros patriotas”.

Estado versus famílias

Já perto do fim do seu discurso, João Lourenço apelou a que “não se confunda a luta contra a corrupção e outros comportamentos funestos com a perseguição aos ricos ou a famílias abastadas. Esta é a arma utilizada para confundir e desencorajar os que têm a missão de materializar as orientações do partido”. Em todas as sociedades de economia de mercado há ricos, disse o vice-presidente do MPLA, que, num aceno, enfatizou, sobre os ricos, que “eles são bem-vindos, desde que as suas fortunas sejam realizadas de forma lícita, aceitando a sã concorrência e, consequentemente, combatendo os monopólios.

Os ricos são bem-vindos se produzirem bens e serviços, gerarem empregos e contribuído com os impostos para que os Estado possa ir retirando da pobreza um número cada vez maior de cidadãos e fortalecendo a classe média”. Já no fim do seu discurso, João Lourenço disse que não se pode adiar por muito mais tempo a tomada das medidas necessárias para corrigir o que está mal e melhorar o que está bem, lembrando que na sua última sessão o Comité Central do MPLA pediu pede celeridade na aplicação das medidas das reformas programadas.

Dinheiro no estrangeiro tem de voltar

O Executivo vai, no início do ano, estabelecer um período de graça durante o qual todos aqueles cidadãos angolanos que repatriarem capital do estrangeiro para Angola e os investirem na economia, em empresas geradoras de bens, de serviços e de empregos não serão molestados, “não serão interrogados sobre as razões de terem tido dinheiro lá fora. Não serão processados judicialmente.

Mas, findo este prazo, o Estado angolano sente-se no direito de o considerar dinheiro de Angola e dos angolanos e, como tal, agir, junto das autoridades dos países de domicílio, para tê-lo de volta e em sua posse”. Este tema foi outro dos retomados dos seus discursos durante a campanha eleitoral, o que demonstra a seriedade com que o Titular do Poder Executivo o trata.

O Executivo, disse João Lourenço, encoraja as entidades competentes na luta contra ao corrupção e o branqueamento de capitais, como a Unidade de Informação Financeira (UIF), os Serviços de Investigação Criminal (SIC), a Procuradoria-Geral da República (PGR) e os tribunais competentes, através da melhor formação e capacitação dos seus quadros, bem como de melhor oferta de condições de trabalho e meios técnicos para o cumprimento do dever que cada um, ao seu nível tem perante a nação. Uma forma de o fazer é obter uma resposta clara, fundamentada por parte da administração pública e erradicar das instituições os criminosos que lesam o interesse público.

Tenos de ser nós a fazer o nosso dever e a cumprir o nosso papel, não deixando, por desleixo ou por descaso, avolumar crimes que não podem continuar a ser tratados como inerentes à crise. Devemos defender a transparência em todos os actos públicos, evitar as situações susceptíveis de potenciais conflitos de interesses e usar com legitimidade a investigação séria dos comportamentos suspeitos e a punição exemplar dos infractores.