Cuanza-Norte: que haja emprego em 2018

Cuanza-Norte: que haja emprego em 2018

Falta de oportunidade de emprego e uma completa estagnação sócio-económica é a nota de relevo apontada pelos entrevistados de OPAÍS num exercício de recolha de opinião na cidade de Ndalatando, a propósito do ano novo.

POR: André Mussamo

Continua a ser um exercício difícil obter opinião analítica sobre a província no seio das pessoas comuns na cidade de Ndalatando. Numa recente recolha na capital do Cuanza-Norte, saltou à vista a relutância que os transeuntes mostraram sempre que contactados para debitar a sua opinião. Os poucos que acederam falar a OPAÍS, solicitaram o anonimato, entretanto foi possível discernir que a falta de emprego e a aparente estagnação do estágio de desenvolvimento da província são apontados como as principais notas negativas de 2017.

Natal Castro, licenciado pela Escola Superior Politécnica de Ndalatando, encontra no exercício da actividade de táxi a principal fonte de rendimento para garantir a sua sobrevivência e de mais 3 membros da sua família. O jovem de 34 anos de idade, teve de recuperar um velho Toyota Corolla e todos os dias liga várias vezes as cidades de Ndalatando e Dondo a troco de “míseros” fretes que diz partilhar com agentes da polícia para livrar-se das multas atendendo que exerce a actividade de forma ilegal.

O jovem, dono de uma apurada retórica, reafirma que o problema da província do Cuanza-Norte é a falta de um verdadeiro desenvolvimento a todos os níveis. “Aqui não temos empresários, não temos fazendeiros e nem grandes industriais. A grande fábrica que existe é a cervejeira do Dondo, que não tem um movimento de emprego regular”, conta o jovem para justificar os seus argumentos. Para ele, a província é “um corpo inerte”, como escreveu Agostinho Neto, atendendo que a única esperança de emprego para a mão-de-obra local é o ingresso na função pública.

O taxista, que não arrisca viagens para lá do Dondo, não culpa a governação actual pelo cancro de empobrecimento galopante que afecta grande parte dos cidadãos na província, mas aponta a falta de políticas nacionais de desenvolvimento e a acentuada assimetria promovidas pelos governos centrais anteriores. Para ele, o facto de Ndalatando estar relativamente próximo da capital do país poderia ter sido uma vantagem caso a política de desenvolvimento seguisse uma estratégia para “desafogar Luanda e incentivar a retenção e implantação dos talentos locais na terra”. Aponta que a saída para os Cuanza-nortenhos é emigração e quase sempre em direcção a Luanda. “Ficar aqui é auto-condenar-se a permanente pobreza”, remata em nota conclusiva.

Castro chegou a empreender pelo mesmo caminho, mas os custos da renda habitacional e propinas escolares que não estavam ao seu alcance levaram-no a “regressar à procedência”. Sente-se feliz porque está vivo, mas apela a políticas mais assertivas em 2018, porque entende que Ndalatando pode servir de “tampão a Luanda e descongestionar o sobre povoamento do qual a capital se ressente”. O nosso entrevistado não têm receio de apontar o sector informal como o que “emprega” o maior número de trabalhadores na província. “Basta olhar para a forma como surgem em mercados informais em todas as esquinas e bairros da cidade. O exemplo é seguido em muitos municípios. Basta olhar para a proliferação da actividade dos moto- táxis. Esta à vista de todos. Só não acredita quem não quer aceitar a realidade”.

Aquicultura é uma miragem

Um pequeno empreendedor que solicitou o anonimato aponta o incentivo da política do crédito à actividade produtiva como um dos caminhos para tirar a província da estagnação e marasmo em que se encontra. Conta que no seu caso investiu alguns parcos recursos na actividade de piscicultura acalentado pela promessa de apoio anunciado pelo Estado, mas hoje diz-se “desiludido” porque de seu próprio bolso não consegue sustentar os custos da aquicultura.

“Prometeram-nos apoio técnico e logístico. Falou-se em crédito para o exercício desta actividade, mas rapidamente as nossas esperanças passaram a pesadelos”, revela o empreendedor completamente desolado. Diz que o pouco que produz serve para alimentação familiar e partilha com alguns amigos porquanto o produto não atinge os padrões de qualidade capaz de catapultá-lo para a rede comercial. “Não temos ração, consequentemente o pescado não cresce. Com a baixa do nível de pluviosidade vão faltando recursos hídricos. Entretanto a própria tutela conta anedotas todos os dias na midia dizendo que a aquicultura está em ascendente desenvolvimento na província. É uma miragem”.

Planalto de Camabatela estagnado

Outro entrevistado, um criador de gado implantado na região de Camabatela, condicionou o seu depoimento à ser identificado apenas pela alcunha dos tempos de tropa que era “Quitexe”. Garante que não teme “represálias”, mas na salvaguarda de interesses colectivos prefere o semi-anonimato. O fazendeiro, que diz possuir algumas dezenas de cabeças de gado bovino e algumas centenas de caprinos, considera que a “estagnação da província” é uma consequência politica.

Defende o argumento de que os “folgados” resultados conseguidos pelo partido no poder desde a implantação da democracia pluripartidária promove uma espécie de marginalização desta parcela do território nacional. “Devemos aprender com o tempo e usar melhor o nosso voto pode ser um caminho para reclamarmos mais atenção e merecermos alguma apoio do governo central”, de-fende Quitexe que se auto intitula “fazendeiro da pimpa”. “Os nossos colegas fazendeiros no Sul contam o efectivo de gado aos milhares por cá 100 animais é já um milagre. As férteis terras do planalto de Camabatela foram talhonadas para servir interesses de latifundiários que não produzem”, desabafa Quitexe.

Quitexe está temporariamente em Ndalatando onde cria condições para transferir dois filhos que doravante deverão instalar-se na capital da província para concluírem estudos universitários. Tem noção de que pela natureza da actividade que desenvolve seria recomendável incentivar os filhos a virarem os seus planos de formação para o sector agropecuário, mas diz que não quer “comprometer o futuro dos filhos” porquanto a realidade mostra que emprego garantido é apenas e somente na função publica e para lá deve encaminhar os seus descendentes. “Têm que se formar e entrar na função pública. Estou a ficar velho e com este gado raquítico e sem assistência tenho a certeza de que não vou a lado algum”, desabafa.

Algumas boas noticias: 526 profissionais da Saúde formados

Quinhentos e 26 profissionais de Saúde foram formados durante quatro anos pela Escola Técnica de Saúde “Arminda Faria”, em Ndalatando, Cuanza Norte. A escola, um projecto pensado e concretizado pelo então governador Manuel Pedro Pacavira é um dos poucos “chamarizes” que vai atraindo alguma massa estudantil para a província. Muito frequentado por idos de todas as partes, particularmente de Luanda, aquela instituição formou no ano que finda 404 técnicos de enfermagem geral, 55 de análises clinicas, 23 farmacêuticos, 21 fisioterapeutas e 19 especialistas em radiologia.

As autoridades locais apelam os recém formados a ”elevarem” o nome do profissional da Saúde mas no seio dos formados o novo dilema agora chama-se emprego. Sem um sector privado firmado, os profissionais da Saúde estão na totalidade de olhos virado para a função pública cujos concursos dizem acontecem a um ritmo de “conta gotas”. As estatísticas apontam que a instituição já escoou para o mercado de trabalho desde a data da sua criação em 2001, dois mil, 411 profissionais.

Tida como a capital económica da província, há muito que a velha e histórica cidade do Dondo é sombra de si mesma. Edifícios envelhecidos e escassa oferta habitacional, mais uma vez é o sector informal que “acolhe” a mão-deobra local. Em tempos, quando a cerveja era uma raridade no país, a comercialização da eka era uma espécie de camanga para os locais, todavia hoje a então ‘loirinha tropical’ perdeu valor fruto da concorrência e do inundar no mercado com variada e abundante oferta. O Dondo, uma localidade ribeirinha ao majestoso rio Cuanza, tem eventos surreais como falta de água de qualidade para os seus habitantes e deficiente fornecimento de energia eléctrica mesmo acolhendo o aproveitamento Hidroelétrico de Cambambe.

A boa noticia para uma terra cansada de altas temperaturas e várias notícias “sem novidade”, como fez questão de referir um nativo, é que finalmente a cidade do Dondo, sede do município de Cambambe, voltará a ter água canalizada através de uma nova rede de distribuição, em instalação desde 2015, no quadro de um investimento do Ministério da Energia e Águas.

A garantia foi dada a semana passada pelo encarregado das obras, Valentim Alfredo, que garantiu que 55% do total da empreitada estava executado. Já foram lançados 36 quilómetros e 919 metros de tubo do tipo polietileno, a construção de 30 chafarizes, dos 50 previstos, e mais de mil ligações domiciliárias conectadas à rede em alguns bairros. Indicou que as obras que presentemente prosseguem conheceram um período de suspensão, por razões financeiras decorrentes da crise económica que desde 2014 assola o país e cuja ultrapassagem gradual permitiu o reinício dos trabalhos em Outubro último. Serão ainda reabilitados dois reservatórios, sendo um com capacidade para 700 metros cúbicos e outro de 300 metros.