Período de graça para o repatriamento voluntário de capitais não terá prorrogação

Período de graça para o repatriamento voluntário de capitais não terá prorrogação

O Presidente da República proferiu ontem, Segunda-feira, 15, pela segunda vez, a mensagem sobre o Estado da Nação, num discurso que durou quase uma hora, durante o qual efectuou um balanço das acções efectuadas pelo Executivo que dirige no o seu primeiro ano de mandato.

Em Dezembro próximo termina o período de graça, previsto por lei, para o repatriamento voluntário de capitais de angolanos detentores de fortunas no exterior, e o Presidente da República alertou os cidadãos visados a aproveitarem esta oportunidade que, afirmou, será única, sem prorrogação, nem retorno. Recomendou aos cidadãos nesta condição que se mostrem “arrependidos” e que disponibilizem os referidos recursos ao serviço da economia. “Findo este período, o Estado tem toda a legitimidade para utilizar todos os mecanismos legais, policiais e diplomáticos para recuperar esses recursos espalhados pelo mundo, a favor de Angola, de onde nunca deviam ter saído”, disse.

No discurso que marcou o arranque da 2ª sessão legislativa da IV Legislatura da Assembleia Nacional, o Chefe de Estado explicou à nação estarem a ser realizadas importantes reformas no sistema judicial e de investigação, de modo a que, referiu, se possa combater a corrupção com eficiência, conferir maior celeridade na resolução de litígios que afectem as relações e a dinâmica da economia nacional, bem como assegurar a eficácia das leis na defesa dos direitos e garantias de todos os seus cidadãos e agentes económicos. Afirmou que a luta a favor do combate contra a corrupção e outros crimes de colarinho branco, violentos, de vandalização e sabotagem de bens e património público, é de todos, desde o Executivo aos órgãos de investigação criminal, Ministério Público, comunicação social, sociedade civil e tribunais.

Promessa cumprida

Passado um ano de mandato, João Lourenço sabe que é prematuro fazer um balanço exaustivo de tudo o que foi feito, todavia, referiu estar “claro” que o Executivo está a tomar as medidas consideradas essenciais para melhorar o que está bem e corrigir o que está mal. “Devemos todos estar conscientes de que se trata de um processo que exige algum tempo para se afirmar e consolidar, sobretudo quando muitas destas medidas afectam ou neutralizam poderosos interesses instalados”, disse. Ressaltou algumas das acções desenvolvidas desde a última mensagem sobre o Estado da Nação que, referiu, atestam a seriedade e a firmeza com que o Executivo se propôs contrariar uma tendência que, considerou, se estava a instalar de aceitação e banalização de práticas não saudáveis, nem recomendáveis para a gestão da vida do país e que, pela sua prática reiterada estavam a criar um sentimento que considerou de total impunidade. “Neste primeiro ano do nosso mandato pudemos já começar a pôr um freio e mesmo a anular algumas das práticas que mais lesavam o erário público e os interesses da grande maioria do nosso povo, confirmando assim a promessa feita de que ninguém teria privilégios perante a lei”, afirmou.

Próximo ano com previsões optimistas

Em Dezembro do ano passado o Executivo aprovou o Programa de Estabilização Macroeconómica que entrou em vigor em Janeiro deste ano, o Presidente da República referiu que este programa veio fazer face aos acentuados desequilíbrios que se evidenciavam nas contas internas e externas de Angola, como resultado da queda acentuada e prolongada do preço do petróleo no mercado internacional que se foi verificando desde meados de 2014 até a relativamente pouco tempo. Passados cerca de nove meses de execução, afirmou que os resultados são encorajadores. Referiu que as medidas conducentes à consolidação fiscal têm levado a uma redução do deficit orçamental. De facto, em 2017 registou-se um deficit de 5,6% do PIB. Mas, para o ano em curso perspectiva- se um deficit inferior a 1% do PIB, abaixo dos 3,4% previstos no OGE para o ano de 2018. Para o ano de 2019, o Presidente da República garantiu uma previsão de recuperação mais dinâmica com o sector petrolífero e o não petrolífero a exibirem taxas de crescimento positivas.

Negociação com o FMI

Com vista a apoiar o Executivo no seu esforço de estabilização e relançamento da economia nacional, explicou estar em negociação, desde o início do corrente mês, um “programa de financiamento ampliado” com o Fundo Monetário Internacional (FMI), “baseado no nosso Programa de Estabilização Macroeconómica e no Plano de Desenvolvimento Nacional (2018-2022)”. “Com esta medida, estaremos em condições de, tendencialmente, passarmos a negociar financiamentos sem garantia de petróleo”, afirmou. O Chefe de Estado falou do Programa de apoio à produção nacional, de promoção das exportações e substituição das importações (PRODESI), de maneira que este poderá melhorar o ambiente de negócios do país. Falou ainda da nova lei do Investimento Privado e da Lei da Concorrência.

Privatizações começam este ano

Tendo em vista a redução da participação do Estado na economia como produtor directo de bens e serviços e a promoção de condições favoráveis à iniciativa privada, ao investimento estrangeiro e à aquisição de know-how, o Titular do Poder do Executivo anunciou o arranque, este ano, do programa de privatizações de várias empresas de que o Estado é proprietário ou em que tem participações. No discurso foi garantido que serão implementadas medidas que visam acautelar a não redução das receitas fiscais que o Estado arrecada, orientando, por isso, que se estude a aplicação de uma política tributária de equilíbrio, que salvaguarde, por um lado, os interesses do Estado e, por outro, os das empresas. Para tal, sugeriu a redução parcial e gradual da carga fiscal sobre as empresas enquanto se alarga consideravelmente a base de tributação. Anunciou que o Executivo está empenhado em mobilizar linhas de crédito que, por via da banca comercial, possam conceder créditos ao sector empresarial privado, sobretudo para os de mão-de- obra intensiva, como a agricultura, as indústrias diversas, as pescas e o turismo.

Reestruturação na Sonangol

Relativamente ao sector petrolífero, destacou a aprovação da Lei da indústria de exploração e produção do gás não associado, aprovada para fazer face à queda da produção petrolífera que se vem registando nos últimos anos, bem como o processo de implementação da Agência Nacional de Petróleo e Gás que irá assumir a função de concessionária nacional de petróleo e gás. Falou do plano de reestruturação da Sonangol e do processo de privatização de grande parte das suas empresas não nucleares, quer sejam subsidiárias ou participadas, que têm como principal objectivo concentrar a actividade da empresa na cadeia de valor do petróleo e gás. Referiu estar em execução uma estratégia para a refinação do crude, tendo sido lançados concursos públicos para a construção de uma grande refinaria no Lobito, com capitais mistos, uma refinaria em Cabinda com capitais privados e dimensionada àquele mercado, bem como o aumento da capacidade da refinaria de Luanda. Falou também do processo, em curso, de revisão da legislação sobre o conteúdo local, a nível do sector petrolífero.

Combate ao garimpo

O Presidente da República reiterou o combate ao garimpo e ao comércio ilegal de diamantes, de modo a conformar cada vez mais este mercado às exigências legais e a aumentar as receitas do Estado. “A imigração ilegal ligada ao garimpo e comércio ilegal de diamantes atingiu níveis alarmantes em pelo menos sete províncias do país”, afirmou. Por este facto, e por se tratar de uma questão de segurança nacional e de defesa e protecção dos recursos naturais, João Lourenço justificou estar a ser levado a cabo um combate, que considerou sem tréguas, contra este fenómeno “que se instalou no nosso país aos olhos de todos, e com a conivência e protecção de muitos cidadãos nacionais que passam também a ser responsabilizados”. Anunciou estarem em curso medidas para a melhoria da atractividade no sector mineiro em geral, para que as multinacionais que operam neste domínio possam fazer investimentos na prospecção, exploração e transformação dos vários recursos minerais existentes no nosso país. Neste sector foi elaborada uma nova política de comercialização de diamantes que, referiu, permitirá maior abertura do mercado, aumentar as receitas do Estado e das empresas produtoras, bem como incentivar mais investimentos na prospecção e exploração de diamantes e respectiva indústria local de lapidação, que introduzirá valor acrescentado às pedras em bruto e criará postos de trabalho qualificado para os angolanos. Neste âmbito, foi iniciado também o processo de reestruturação da Endiama.

Autarquias em 10 anos

No domínio da reforma da Administração Pública, disse terem sido aprovadas medidas com vista a uma maior intervenção dos Governos Provinciais e das Administrações Municipais na gestão dos problemas das comunidades. O Presidente da República garantiu mesmo que a partir de 2019 o Orçamento Geral do Estado (OGE) começará a acompanhar esta dinâmica, devendo proceder- se à transferência de mais recursos financeiros para os órgãos da Administração Local, de acordo com as novas competências atribuídas a estas na legislação recentemente aprovada. No âmbito do novo regime financeiro local, disse estarem já a ser mensalmente disponibilizados, de forma directa, a todos os municípios, valores para fazer face aos programas municipais, principalmente os relacionados com o Programa de Desenvolvimento Local e Combate à Pobreza. Com isso, João Lourenço disse estarem a ser lançadas as bases para que em 2020 se dê início ao processo de descentralização administrativa, criando as autarquias locais, cuja proposta de base submetida à discussão pública pelo Ministério da Administração do Território definia um período de implementação faseada que se estenderia por 15 anos. Todavia, o Chefe de Estado referiu que a consulta pública permitiu distinguir duas posições dominantes, sendo uma que reconhecia a incapacidade de realização das eleições de uma só vez em todos os municípios do país, recomendando por isso prudência e realismo na abordagem do tema, e uma outra que, ignorando factores constrangedores como o facto de se tratarem de 164 eleições diferentes.

Assim sendo, e tendo em conta estes dois pontos de vista, o Presidente da República anunciou que o Executivo considera a possibilidade da redução do prazo de institucionalização faseada das autarquias em todo o país para um período não superior a 10 anos desde o seu arranque Sobre a religião, João Lourenço declarou que o Estado não tolerará a utilização da mesma por indivíduos que classificou “sem escrúpulos, que, a coberto da religião, procuram enriquecer facilmente extorquindo valores dos fiéis em sí já pobres, com promessas vãs de milagres que jamais acontecem e com práticas que atentam contra a dignidade humana, a saúde e a vida dos fiéis”. O Presidente da República garantiu estar em vista a implementação de um conjunto de medidas diversas, para pôr cobro à situação que considerou reinante de verdadeiro caos e desordem. Destacou, por outro lado, a construção de infra-estruturas que na sua totalidade atenderão a 5.414 habitações, correspondendo a 35.988 beneficiários, num conjunto de 8 centralidades, distribuídas por 5 províncias: Benguela, Bié, Luanda, Namibe e Uíge, que, estando prontas, não estão habitadas ainda, por falta das redes técnicas. Os equipamentos sociais dessas centralidades, sendo 11 jardins- de-infância e 14 escolas, totalizam um número de 258 salas de aulas construídas, e que beneficiarão 22.980 crianças/estudantes uma vez postos ao serviço da comunidade. Garantiu que o Estado não será o principal agente construtor, tendo considerado que o negócio deve ser reservado ao sector privado que investe na imobiliária, que na ocasião foram convidados “a sair da letargia”. Afirmou que o sector da comunicação social está mais dinâmico e próximo das populações. Disse estarem a ser “removidos os obstáculos legais” e operacionais que impediam a abertura de canais de televisão e emissoras de rádio, como é o caso da extensão do sinal da Rádio Ecclésia para todo o território nacional.

OGE passará a ser elaborado com base em programa do PND

O Presidente da República afirmou, que para os próximos quatro anos o principal instrumento de governação do país será o Plano de Desenvolvimento Nacional (PDN) 2018-2022. Referiu que os orçamentos do Estado a partir de agora passarão a estar baseados nos 83 programas previstos no referido plano.

Destino do diferencial das receitas petrolíferas

Nos primeiros nove meses do ano, de Janeiro a Setembro, o preço do crude esteve acima do que se projectou no OGE 2018 em cerca de 40%, entretanto, a produção média do petróleo esteve abaixo do programado em cerca de 12%, passando de 1.7 para 1.4 milhões de barris por dia. De acordo com o Titular do Poder do Executivo, estas variações, contrárias uma da outra, geraram para os cofres do Estado um diferencial positivo total de cerca de 4 mil milhões de dólares americanos que servirão para fazer face à dívida interna titulada. No domínio não petrolífero, os principais motores do crescimento, segundo referiu, serão os sectores da Agricultura, com uma taxa média de crescimento de 8.9%, das Pescas, com uma taxa média de 4.8%, da Indústria transformadora, com uma taxa de 5.9%, dos Serviços, incluindo o Turismo, com 5.9% e da Construção com uma média de 3.8%. Porém, para que as metas contidas no PDN sobre a produção nacional sejam alcançadas, o Presidente da República afirmou ser necessário haver rigor e disciplina na implementação do Programa de Apoio a Produção Nacional e da promoção das exportações e substituição das importações, o PRODESI.

Diplomacia económica arrecadou 11.2 mil milhões de dólares

No decorrer deste primeiro ano de mandato, João Lourenço realizou uma série de deslocações oficiais a outros países, com o objectivo de reforçar as relações de amizade e de cooperação, atrair o investimento estrangeiro e encontrar linhas de financiamento. Desta “campanha diplomática” resultou, entre outros, um financiamento de 500 milhões de dólares do UKEF do Reino Unido, a emissão de 3.5 mil milhões de dólares de Eurobonds, bem como a garantia de um crédito de 500 milhões de dólares americanos do Credit Agricole e de mais 79 milhões de euros da Agência Francesa de Desenvolvimento, ambos de França. Foi possível, segundo dados divulgados, obter um crédito de 500 milhões de dólares americanos do KFW Bank da Alemanha e, na extensão da linha de crédito COSEC de Portugal, em mais 500 milhões de euros, após a visita do 1º Ministro português a Angola. Resultou ainda na concessão de um crédito de 2 mil milhões de dólares americanos do Banco de Desenvolvimento CDB, de 3,5 mil milhões de dólares americanos do Banco Comercial e Industrial ICBC e de mais 620 milhões de dólares americanos do EXIMBANK, todos da China, e a oferta de 500 bolsas de estudo para o ensino superior anunciada pelo própio Presidente Xi Jinping. Angola consegiu também do Banco Africano de Desenvolvimento (BAD) 110 milhões. No cômputo geral, segundo o Presidente da República, esses financiamentos totalizam 11.2 mil milhões de dólares americanos e mais 579 milhões de euros, para além das manifestas intenções de investimento privado directo. “É caso para se dizer que fizemos uma verdadeira diplomacia económica”, afirmou.