Cruzada contra a corrupção alargada a todo o país

Cruzada contra a corrupção alargada a todo o país

Qual fénix renascida das suas próprias cinzas, em Angola, a Procuradoria Geral da República (PGR ) é hoje uma instituição mais visível e todos os dias é contemplada com tempo de exposição nos media. Razão: a grande cruzada contra a corrupção que leva à investigação centenas de processos envolvendo milhares de milhões do erário.

Das terras altas da Chela terá sido disparado o tiro de largada. Foi de lá que chegaram os primeiros sinais de uma PGR renascida. Aos poucos, de processos considerados como tendo como alvo “peixe miúdo”, viu-se o alargar dos tentáculos a funcionários públicos de mais alto escalão. A detenção do sócio-gerente e o proprietário da empresa SICO- Soluções Gestão e Empreendimentos, ocorrida em Agosto em plena capital angolana e depois levado sob custódia à Huíla, pelo Serviço de Investigação Criminal (SIC), por suposta burla de 200 milhões de Kwanzas que recebera do Governo Provincial em 2015, para adquirir 23 laboratórios para escolas do II ciclo, foi só o começo da procissão. Logo a seguir, nova bomba, e, para não variar, “deflagra” igualmente no Lubango.

O então director do Gabinete provincial da Educação da Huíla, Américo Chicoty, e o ex-delegado das Finanças da mesma província, Sousa Dala, entretanto investido de novas funções na vizinha província do Huambo, eram dois dos quatro cidadãos detidos no Serviço Provincial de Investigação Criminal (Spic), por, supostamente, estarem implicados no desvio de mais de 2 mil milhões de Kwanzas que serviriam para pagar a professores locais. Num ápice, choveram anúncios dos 4 cantos de Angola, como que se a instituição tivesse feito soar o alarme para o combate à corrupção em todo o território nacional. Da província do Cunene chega ram notícias de dezenas de processos sob alçada do Ministério Público, onde pontificam crimes de branqueamento de capital e conexos, com 41 arguidos constituídos, segundo uma fonte judicial.

O sub-procurador da República no Cunene, citado pela agência noticiosa angolana, Angop, revelou recentemente que dos processos em causa, 15 estavam associados a branqueamento de capital e associação criminosa, envolvendo 41 arguidos, entre titulares e ex-titulares de cargos públicos e funcionários do Governo provincial. Dos 15 processos referenciados, dois tinham sido introduzidos em juízo, tendo um deles sido já pronunciado e encontrar-se no Tribunal Supremo, e o outro aguarda a realização da instrução contraditória. Os restantes 13 processos continuam na instrução preparatória pelo Serviço de Investigação Criminal (SIC). O sub-procurador da República do Cunene reconheceu a morosidade da investigação e instrução preparatória de alguns processos, uma vez que vários dos arguidos, declarantes e testemunhas, residem fora da província. O magistrado do Ministério Público admitiu a possibilidade de um aumento do número de casos de crimes de corrupção e conexos, em função do incremento das denúncias de cidadãos.

Do Planalto Central chegaram igualmente novidades em torno do “furacão” que vem fazendo mossa na nossa justiça. Domingos Joaquim, um dos representantes do Ministério Público no Huambo, sinalizou a existência de processos em curso quase todos eles derivados do “mau exercício” na gestão do OGE traduzindo- se sobretudo em desvios de fundos públicos para determinados fins que não os previstos. Qualquer coisa como 51 processos- crime, sobre 24 empresas, 12 das quais com sede na província do Huambo, encontram-se em fase “muito avançada”, tal como os de vários funcionários suspeitos, estando a decorrer a recolha de elementos de prova para posterior responsabilização ou não. A Norte, os primeiros sinais chegaram das “Terras do Bago Vermelho”, Uíge, com a detenção temporária de professores universitários por falsificação de comprovativos de títulos académicos, segundo se fez constar, e 17 docentes foram, num ápice, conduzidos ao Serviço local de Investigação Criminal, num processo rocambolesco cujos detalhes ainda não foram suficientemente clarificados.

Na vizinha província do Cuanza- Norte, apesar da discrição com que se faz a coisa, OPAÍS apurou que há muito tempo que dezenas de processos andam pelos corredores da sede da PGR local e do SIC, tendo na última semana resultado na detenção de alguns funcionários públicos. Os órgãos locais, que se recusam a falar do assunto, dizem apenas que os processos estão em curso e em “breve serão apresentadas mais informações aos órgãos de comunicação social”. Os municípios de Cazengo, Cambambe e Gulungo Alto podem ser os primeiros a vir a ter “arguidos detidos”, tais são as evidências de prática de ilicitudes. Uma fonte local assegura que se as coisas forem feitas com verdade, “poucos gestores públicos em efectividade até antes das eleições de 2017 escaparão deste furacão”. Fontes judiciais na região Leste confirmam a OPAÍS que por lá também tramitam dezenas de processos, todos eles associados a gestão do erário e em breve “teremos novidades”. Portanto, parece que ninguém quer ficar para trás e um pouco dos quatro cantos do país chovem denúncias de processos na justiça, mas alguns observadores atentos continuam expectantes à espera do dia em que esta “cruzada” há-de alargar a sua acção ao topo do funcionalismo publico em Angola. É que, exceptuando o grupo de Luanda, com Augusto Tomás à cabeça, parece que o poder do “furacão” não reuniu forças suficientes para abanar o poder de “elites suficientemente instaladas” em actos que depredaram ao longo de anos o erário nacional.