Defesa de Válter quer Nunes Júnior, Armando Manuel e Edeltrudes Costa em tribunal como declarantes

os declarantes arrolados no mediático caso dos 500 milhões de dólares poderão começar a ser ouvidos no Tribunal Supremo a partir de Terça-feira, se se concluir na Segunda-feira o interrogatório de Válter Filipe, exgovernador do Banco Nacional de Angola (BNA)

Por:Paulo Sérgio

Sérgio Raimundo, advogado do antigo governador do Banco Nacional de Angola (BNA), Válter Filipe, requereu ao Tribunal Supremo a inclusão de Manuel Nunes Júnior (ministro de Estado do Desenvolvimento Económico), Armando Manuel (ex-ministro das Finanças) e Edeltrudes da Costa (director do Gabinete do Presidente da República) entre os declarantes neste processo. O causídico manifestou-se, na primeira audiência de julgamento, surpreso com o facto de as individualidades acima mencionadas não constarem entre as pessoas que serão ouvidas, como declarantes e testemunhas.

O juiz-presidente da causa, João da Cruz Pitra, prometeu responder quando começar a fase de audição. Manuel Nunes Júnior e Archer Mangueira (ex-ministro das Finanças e actual governador provincial do Namibe) estão entre os auxiliares do então Presidente da República, José Eduardo dos Santos, por terem participado numa reunião com os alegados promotores do Fundo de Investimento Estratégico de 30 mil milhões de dólares, realizada em 2017, no Palácio da colina de São José.

Para fazer prova da participação deles no encontro promovido pela Casa Civil do Presidente da República, o antigo presidente do Fundo Soberano, José Filomeno de Sousa dos Santos “Zenu”, um dos participantes, fez chegar ao tribunal o convite e uma fotografia em que todos aparecem nesse evento. Incluindo os empresários Jorge Gaudens Pontes Sebastião (pela Mais Financial Service, S.A), Hugo Onderwater (dono da Resource Conversion) e o brasileiro Samuel Barbosa da Cunha (dono da Bar Trading, em representação da Perfectbit), alegados promotores da iniciativa de criação do fundo.

Entre as pessoas chamadas pelo Ministério Público a contribuírem para a descoberta da verdade material neste processo estão Archer Mangueira, José de Lima Massano (substituto de Válter Filipe no cargo de governador do BNA) e Manuel António Tiago Dias (vice-governador do BNA). Archer Mangueira é apontado, na acusação, como tendo enviado ao então Presidente da República, José Eduardo dos Santos, uma avaliação técnica sobre a proposta de criação do alegado fundo. O governante fez essa apreciação técnica depois de te sido mandatado por José Eduardo dos Santos a coordenar uma delegação (integrando Válter Filipe e Zenu), que se deslocou a Lisboa em Junho de 2017, a fim de obterem mais informações sobre o referido fundo, que os promotores descreviam como sendo constituído por um sindicato de bancos europeus, asiáticos e americanos.

De acordo com a acusação, dentre as recomendações, Archer Mangueira advertia que, para proteger o Estado angolano, era mister iniciar as negociações para a implementação do alegado Fundo de Investimento com um memorando de entendimento e não com um contrato. “Por quanto, o memorando não engajaria as partes e evitaria qualquer evento que não fosse de acordo com os interesses do Executivo angolano, porque ainda se estava numa fase embrionária”, lê-se do documento a que OPAÍS teve acesso. O Ministério Público diz que tal proposta foi aceite, baseando-se num despacho exarado por José Eduardo dos Santos no mesmo dia (21 de Junho de 2017) em que recebeu o relatório de Archer Mangueira, anexado ao processo como uma das provas materiais.

O Tribunal procura aclarar por que razão o governante, que permaneceu no cargo durante os primeiros dois anos do Governo de João Lourenço, terá sido afastado na primeira fase de negociação e o memorando não foi assinado, conforme faz menção a acusação.

O regresso do dossier Archer Mangueira

O antigo director do departamento de Gestão de Reservas do BNA, António Samalia Bule Manuel, arrolado no processo como arguido, declarou em tribunal, na Quintafeira, que o antigo ministro das Finanças voltou a ter este dossier em cima da mesa já na época do Governo de João Lourenço.Ao tomar conhecimento da transferência, o Chefe de Estado incumbiu-lhe a missão de chefiar a delegação que foi a Londres, em Outubro de 2017, para avaliar os termos em que foram estabelecidos os acordos, de custódia e administração de valores monetários, entre as empresas Perfectbit e o consórcio Mais Financial Services & Resource Partnership, a 17 de Agosto desse ano. Foi por força desse acordo que Válter Filipe terá ordenado, no dia 18 de Agosto, que se fizesse a transferência dos 500 milhões de dólares da conta do BNA, domiciliada no banco Standard Chartered, em Londres, para a conta nº 400515 76514832 da Perfectbit, sediada no banco HSBC, na mesma cidade.

De realçar que 13 dias antes das eleições gerais de 2017, a 10 de Agosto, Válter Filipe havia celebrado, em representação do BNA, um Acordo de Alocação e Gestão de Activos com as empresas de Jorge Gaudens e Hugo Onderwater, em Londres. António Samalia, que integrou a delegação chefiada por Archer Mangueira, em representação do BNA, declarou que tal contrato previa o regresso dos 500 milhões de dólares à origem, sem qualquer ónus para o Estado Angolano, após a constituição do fundo.

“Isto é normal. Se estamos a dar dinheiro a alguém para gerir, é normal que ele depois nos devolva”, frisou. Acrescentou de seguida que “os fundos, antes de serem criados, têm de ser capitalizados. Se não forem capitalizados não é fundo. É assim que acontece em todo o mundo”. Para convencer fundamentalmente os juízes e procuradores que estava a dizer “a verdade e somente a verdade”, contou que as grandes estradas, portos e aeroportos são executados com recurso a financiamentos de fundos, constituídos por várias instituições. Os Estados entram apenas com uma parte por não terem capacidade de financiamento na totalidade.