Enfermeiros da Cabala recebem ‘nota negativa’

Enfermeiros da Cabala recebem ‘nota negativa’

A responsável pela coordenação da vila da Cabala, município do Icolo e Bengo, em Luanda, está descontente com o desempenho dos técnicos de saúde destacados no único posto médico da referida zona ribeirinha, ao ponto de desejar que, nos próximos concursos públicos, se coloque, na área que coordena, enfermeiros residentes.

POR: Alberto Bambi

“Quando vêm trabalhar , aparecem aqui depois das nove horas e fecham o posto antes das 12 ou 13, e dizem sempre que é porque moram distante. Aqui na Cabala, normalmente, os casos de doença aparecem mais no período da tarde e os mais graves, de noite”, disse Dona Eva, como é tratada por familiares, vizinhos e conhecidos. Aos 77 anos de idade, mais de 20 dos quais no comando dos destinos da vila, a anciã não acredita que a alternativa para tal situação seja a construção de residências para os enfermeiros, uma vez que, segundo ela, já houve uma tentativa no sentido de acomodar os trabalhadores do posto na localidade, mas a resposta dos beneficiários não foi positiva.

“Pelos vistos, os enfermeiros querem continuar na condição de trabalhadores não residentes, a fim de manterem justificados os seus atrasos e ausências”, vaticinou Dona Eva, referindo que não foi esse o compromisso que fizeram, aquando da colocação no vilarejo que fica a escassos quilómetros da Nova Caxicane. A insatisfação da líder da coordenação abranda quando se recorda da única funcionária que chega cedo e larga tarde. Trata-se da missionária a quem a comunidade denomina de Irmã Joana, sendo que nos dias que não lhe cabe estar no posto, tudo volta ao normal. Referindo que o seu descontentamento data de há mais de três anos e que já fora manifestado perante aos dirigentes da administração municipal de Icolo e Bengo, a coordenadora da Cabala é de opinião que, nos concursos a seguir, os administradores exijam que se potencie a força de trabalho local.

Questionada se entre os residentes da área existem cidadãos que se formaram na área de saúde, acenando com a cabeça, num movimento muito rápido, consentiu que havia muitos rapazes nativos da zona a frequentar o referido curso e outros poucos que já terminaram, ao nível médio e superior, tendo-se prontificado a apontá-los, se houvesse dificuldades. “Até alguns desses miúdos vêm ter comigo e perguntam-me se eles não podem ajudar a sua terra natal”, revelou Dona Eva. Refira-se que durante a entrevista , que concedeu na sua própria casa, Dona Eva se encontrava doente, assolada por dores na coluna e nas pernas, conforme fez questão de referir, uma situação que a leva a insistir na sua substituição. A idosa disse também que ficaria muito feliz se a sua pequena Cabala tivesse condições técnicas e humanas para tratar da sua condição actual de saúde, ao invés de buscar temporariamente a cura nos hospitais de Luanda. “Não gosto muito de sair da minha terra”, desabafou, sem puder evitar o primeiro sorriso da conversa.

Sacrifício discente encurtado

Se antes os miúdos da zona ribeirinha tinham de percorrer distâncias para chegarem às escolas da sede do município, sujeitando- se a ficar, em grupos, à beira da Estrada Nacional Nº 110, de algum tempo a esta parte tal situação minimizou, devido ao arranque do estabelecimento escolar secundário do I Ciclo da Nova Caxicane. Há dois anos, o percurso tornou- se mais curto ainda, com a entrada em cena da escola secundária localizada na Ilha Dourada, na outra margem do Rio Kwanza, onde as crianças da Cabala já podem ir e vir a pé, quando não há dinheiro para o autocarro.

“Água é só de ver”

A falta do considerado precioso líquido é outro problema que preocupa a população da Cabala, ao ponto de terem como recurso a água retirada directamente do Rio Kwanza. “Como veem, o rio mesmo está aí, a menos de 30 metros da minha casa, mas aqui tenho de comprar água para beber”, disse, apontando com o dedo em riste para a corrente fluvial, a partir do seu humilde quintal. Luís Bambi, morador da vila, contou ter havido algumas tentativas de construção de alguns centros de captação a favor dos habitantes, porém, segundo ele, todos os projectos ficaram por dar resultados esperados. O habitante ainda fez alusão ao programa de transportação de água, por via dos carros comunitários da administração municipal. Sobre o assunto, a coordenadora desabafou dizendo que não gostava de falar do invocado projecto, porque quase não chegou a ver os referidos automóveis. “Se calhar paravam em Caxicane e Muxima”, ironizou.

“Professores de casa na nova escola”

A coordenação da Cabala não pretende ver na educação um quadro semelhante do da saúde, quando se inaugurar a escola que, supostamente, vai atender os alunos do ensino secundário do I Ciclo. “Está a construir-se uma escola que vai ter mais de seis salas e vai matricular crianças da 7ª, 8ª e 9ª classes, por isso, não queremos ter aí professores que dizem que vivem longe. Então, eu já costuma a dizer, mas vou voltar a pedir para darem o emprego aos que moram aqui ou obrigar os professores de fora a serem responsáveis e comprometidos, porque nós queremos ver os nossos filhos bem formados”,

“Energia fica pelos postes”

Alguns residentes, que pediram para não serem identificados nesta reportagem, relataram que, antes das eleições de Agosto de 2017, houve na Cabala equipas da Empresa Nacional de Distribuição de Energia (ENDE) destacadas em jornadas diárias para erguerem os postes eléctricos e ligarem os cabos de um a outro esteio. De acordo com os expectantes beneficiários, tudo ficou por aí, submetendo-os a contemplar os fios que, ainda, não saíram dos postes para as suas residências, conforme fizeram questão de realçar. Por essa razão, o bairro se apresenta escuro durante o período nocturno, valendo o facto de não serem propícia a delinquência na zona, excepto quando tais acções são perpetradas por forasteiros oportunos.

“Bendita escola das madres”

A única escola primária de seis salas instalada nessa comunidade pertence às madres da congregação Filhas da Caridade de Maria Imaculada. Há mais de quatro anos que o estabelecimento de ensino referenciado veio devolver a esperança de muitas famílias carentes, no que à preocupação de garantir o primeiro nível de escolaridade aos seus filhos diz respeito. Neste ano lectivo de 2018, a instituição escolar, baptizada com a designação João Paulo II, alberga 206 alunos, distribuídos da iniciação à 6ª Classe, um número que a Irmã Bernarda Kalei, responsável pela educação das Filhas da Caridade de Maria Imaculada, garantiu que vai subir. “Porque nós estamos abertos às preocupações das famílias da vila e arredores, atendendo à inserção das crianças que estavam a passar as férias fora da Cabala.

Bernarda Kalei referiu-se da dificuldades dos meninos da vizinha localidade de Massesso, que ainda passam por alguns sacrifícios para chegarem à escola, violando, no início do ano lectivo, as normas da instituição, que contempla a entrada para as sete horas, já que meia hora depois devem cumprir com a saudação colectiva e a entoação do Hino Nacional. “As aulas começam às 08h:05, estando o término das sessões lectivas marcadas para as 12h:05. De tarde só temos a turma da 6ª Classe em funcionamento e constituem o grupo menos numeroso”, explicou a missionária, adiantando que a direcção da escola impõe aos encarregados uma contribuição financeira mensal de 700 Kwanzas, a fim de garantir o ordenado dos professores-voluntários. São assim considerados por não auferirem um salário compatível ao esforço diário.