Sociedade civil manifesta-se com elevado grau de civismo no largo da Independência

Sociedade civil manifesta-se com elevado grau de civismo no largo da Independência

Foi um acto singelo, mas marcado por um elevado grau de civismo patenteado pelos participantes, liderados por Paula Macedo

POR: Ireneu Mujoco

Mais de 200 cidadãos, da Sociedade Civil, reuniram- se ontem, em Luanda, no Largo da Independência, para exigir ao Governo que o dinheiro domiciliado no estrangeiro ao ser repatriado para o país, se reverta a favor do Estado. Empunhando cartazes com os dizeres “ Repatriamento sim, Lavagem não”, “ Devolvam o nosso Dinheiro”, “Não Queremos que Angola se transforme em Lavandaria de Dinheiro”, os participantes protestavam contra os dois Projectos de Lei apresentados pelo Governo e pela UNITA no Parlamento. Aprovados recentemente pela Assembleia Nacional, os dois documentos sugerem que o capital a ser repatriado continue com o seu titular, ou parte deste, cujas propostas estão a ser encaradas pela Sociedade Civil como sendo uma protecção aos detentores deste dinheiro.

É nesta senda que este grupo de cidadãos saiu à rua, neste Sábado, 17, para contestar esta decisão aprovada recentemente na generalidade pelos deputados, segundo Paula Macedo, coordenadora desta agremiação da Sociedade Civil. “Estamos reunidos aqui no Largo da Independência para reivindicarmos que as nossas vozes sejam ouvidas pelos nossos representantes no Parlamento”, declarou aos jornalistas. Falando em nome do grupo, Paula Macedo alertou que nas democracias os deputados preocupam- se em atender as opiniões, os interesses e os direitos dos cidadãos, sob pena de perderem votos, “ mas em Angola quem detém a maioria no Parlamento parece dispensar os votos”, desabafou.

Disse também que a oportunidade foi aproveitada para fazer ecoar a voz da Sociedade Civil, para deplorar o estado em que se encontram os hospitais e escolas públicas, saneamento do meio e baixos salários. Acrescentou ainda que a marcha serviu também para protestar junto do Governo contra o roubo do dinheiro do Estado por gestores públicos, “ que eternizam a sua impunidade por vias de sucessivas amnistias e agora pretendem juntar o perdão fiscal”. Paula Macedo, depois de destacar a situação lastimável em que se encontram alguns hospitais e escolas públicas, apontou que parte do dinheiro saído do país de forma ilícita está depositado em bancos comerciais em Portugal, Dubai, Suíça, Bélgica, Inglaterra e em paraísos fiscais.

Fraca participação não ofuscou a manifestação

Esta afirmação é do cartunista Sérgio Piçarra, um dos participantes a esta manifestação que foi marcada por um elevado grau de civismo, segundo constatação da reportagem deste jornal. Em breves declarações a O PAÍS, Piçarra informou que o propósito foi alcançado, na medida em que a mesma decorreu como se previa, apesar de a Polícia Nacional ter alterado o local do encontro. “Queríamos nos manifestar junto ao busto do Presidente Agostinho Neto, mas a Polícia entendeu que aquele não era o sítio ideal, e fizemos num outro, mas no mesmo perímetro adjacente ao largo”. Para ele, o mais importante foi cumprido, e espera que as reivindicações se traduzam na revisão dos dois projectos, disse Sérgio Piçarra, um dos mais categorizados artistas angolanos.

Por sua vez, o professor universitário Fernando Macedo, disse esperar que se faça uma lei justa sobre o repatriamento de capitais, tendo deplorado a forma ilícita como o dinheiro saiu de Angola para o exterior. Na sua opinião, esta saída ilegal de capitais afectou “directa ou indirectamente” todos os angolanos, sobretudo os mais desfavorecidos, daí a necessidade de o mesmo ser repatriado a favor do Estado. Macedo defende que os prevaricadores devem ser levados à justiça para deporem sobre crimes de peculato e corrupção, se forem culpados, as molduras penais devem ser aplicadas à dimensão de cada acto.