Florestas virgens estão a recuar no mundo e podem desaparecer em Angola até 2040

Florestas virgens estão a recuar no mundo e podem desaparecer em Angola até 2040

As florestas virgens perderam, entre 2014 e 2016, em cada ano uma superfície de 90 mil quilómetros quadrados, equivalente à da Áustria, e o ritmo de destruição está a acelerar desde o início do século, foi hoje revelado. Angola e República Centro-Africana, onde está um contingente militar português integrado numa operação de manutenção de paz da ONU, são alguns dos países onde as perdas podem ser totais até 2040.

Apesar de esforços para lutar contra a desflorestação, cerca de 10% das florestas virgens do planeta foram retalhados, degradados ou simplesmente cortados desde 2000, segundo a análise das imagens satélite apresentadas durante uma conferência sobre “as florestas intactas” em Oxford.

Estes números representam uma perda superior a 200 quilómetros quadrados por dia desde há 17 anos.

“A degradação das florestas intactas é uma tragédia mundial porque destruímos de maneira sistemática um elemento chave da estabilidade do sistema”, comentou Frances Seymour, perita do World Resources Institute, que participou na investigação.

“As florestas são a única infraestrutura segura, natural, provada e acessível financeiramente para capturar e armazenar o carbono”, acrescentou.

As florestas originais desempenham um papel crucial para a biodiversidade e a qualidade do ar e da água. E cerca de 500 milhões de pessoas dependem delas para viver.

A “paisagem florestal intacta”, que inclui as zonas húmidas e as pradarias, é definida pela ausência, apurada com base em imagens de satélite, de atividade humana relevante numa superfície de pelo menos 500 quilómetros quadrados. O que quer dizer nem estrada, nem agricultura intensiva, nem minas, nem caminhos-de-ferro,…

Em janeiro de 2017, cerca de 11,6 milhões de quilómetros quadrados de florestas respondiam a este critério.

Mas “numerosos países arriscam perder todas as suas terras florestais selvagens dentro de 15 a 20 anos”, alertou Peter Potapov, da Universidade do Maryland, que dirige as investigações.

Ao ritmo atual, as florestas primárias terão desaparecido até 2030 no Paraguai, Laos e Guiné Equatorial e até 2040 na República Centro-Africana, Nicarágua, Birmânia, Camboja e Angola.

“Em determinada altura, pode não haver no mundo uma zona que se possa qualificar de intacta”, acrescentou Tom Evans, da organização de defesa ambiental Wildlife Conservation Society. “É muito inquietante”, salientou.

Os principais responsáveis por esta desflorestação variam: agricultura e exploração florestal nos países tropicais, incêndios no Canadá e nos EUA, incêndios, minas e perfurações na Federação Russa e Austrália.

Comparado com o período 2000-2013, a Federação Russa perdeu em média mais 90% por ano no triénio 2014-2016. Esta percentagem é de 62% para a Indonésia e 16% para o Brasil.

Os números resultam da comparação de imagens de satélite relativas a estudos comparáveis feitos em 2008 e 2013.

Os dados em alta resolução “permitem detectar as alterações causadas pelo homem e a fragmentação das florestas virgens”, disse à AFP Peter Potapov.

Os resultados de investigação vão agora ser submetidos à análise dos pares antes de serem publicados.

Por outro lado, este cientista questionou a eficácia do sistema de certificação de desenvolvimento durável da indústria florestal (FSC, na sigla em inglês).

Criada em 1994, com o apoio de organização não-governamentais (ONG) como a World Wildlife Fund (WWF), este sistema prometia uma “gestão florestal socialmente benéfica”, a preservação dos recursos florestais e permitir “às empresas e aos consumidores a realização de escolhas esclarecidas”.

Porém, cerca de metade das paisagens florestais intactas nas concessões certificadas FSC desapareceram entre 200 e 2016 no Gabão e na República do Congo, situação que foi mais grave nos Camarões onde o desaparecimento foi quase total, atingindo os 90%.

A FSC “não é um instrumento para a protecção das florestas”, concluiu Potapov.

Ao contrário, hoje, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e várias ONG, reunidas no seio de uma iniciativa batizada Nature4Climate (Natureza pelo Clima), apelaram a mais investimento na floresta na utilização das terras, “sector esquecido da luta” contra as alterações climáticas.

Limitação da conversão em terras agrícolas, reflorestação e gestão melhorada das florestas, restauração de ecossistemas… As sugestões, “baseadas na natureza”, para a redução do efeito de estufa são várias, privilegiando no caso o reforço da capacidade dos solos em absorver e armazenar o carbono.