Permanência de Paulo de Almeida no cargo depende do Tribunal Supremo

Permanência de Paulo de Almeida no cargo depende do Tribunal Supremo

A permanência do comissário-geral Paulo Gaspar de Almeida no cargo de comandante-geral da Polícia Nacional (PN), no qual tomou posse ontem, dependerá da resposta do Tribunal Supremo ao recurso interposto sobre o alegado esbulho violento de uma quinta de 12 hectares de que ele diz ser proprietário

Texto de: Paulo Sérgio

O advogado Ildefonso Manico revelou ontem, em exclusivo a OPAÍS, em Luanda, que Paulo de Almeida deverá cessar a sua função, ao abrigo do estabelecido no artigo 378º do Código Processo Penal, caso o juiz do Tribunal Supremo (TS) a quem calhou o seu processo emita a pronúncia.

Explicou que na eventualidade de o novo comandante-geral da PN ter praticado uma infracção penal ou criminal, nada impede que as autoridades, ou quem quer que seja, despoletem o processo-crime competente, tal como o fez a Direcção Nacional de Investigação e Acção Penal (DNIAP), de acordo com as informações que circulam pelas redes sociais e confirmadas pelo visado, ontem, à imprensa.

“O facto de ser o comandantegeral da Polícia não impede que possa ser constituído arguido. E, por outro lado, o facto de ser constituído arguido não impede que, no caso concreto, o Presidente da República o nomeie para determinado cargo público”, frisou.

O advogado esclareceu que a legislação angolana só proíbe, de forma indirecta, que tal aconteça na eventualidade de ser pronunciado pelo TS. Embora as informações que circularam pelas redes sociais sejam muito limitadas para o causídico analisar o caso com maior abrangência, explicou que depois de a instrução do processo-crime ter sido concluída, seguidamente, como a DNIAP ter-se-á apercebido que existem indícios suficientes para que fosse acusado pela prática do crime, remeteu ao TS, por ser o órgão competente e por gozar o arguido de fórum especial.

Ildefonso Manico realçou ainda que há entidades que, pelo facto de exercerem determinados cargos públicos ou possuírem uma graduação militar ou para-militar elevada, como os comissários da Polícia, são em primeira instância julgadas por esse tribunal. “As informações que circulam nas redes sociais não indicam que ele já tenha sido acusado. Salvo informação ou entendimento contrário”, frisou.

No seu ponto de vista, mesmo que ele já tenha sido acusado, em homenagem ao princípio da presunção de inocência, nada inibe o Chefe de Estado de lhe confiar a missão de dirigir um órgão de defesa e segurança. Baseando-se nas informações que circulam sobre a suposta fase em que o processo nº 16/17-DNIAP se encontra, disse que o comissário- geral Paulo de Almeida será, se assim entender o Procurador junto do Tribunal Supremo, acusado.

Feita a acusação, o processo será remetido ao Cartório Judicial ou à Câmara Criminal competente. Essa, por sua vez, é quem vai ordenar que se notifique o comandante- geral para, querendo, negar as acusações ou requerer instrução contraditória. Ou ainda fazer outras diligências que se reputarem necessárias em abono da sua defesa.

Depois dessa fase, que é uma espécie de continuação da investigação, se houver instrução contraditória ou se a Procuradoria ou o Ministério Público junto do Tribunal Supremo, de acordo com Ildefonso Manico, concluir que não há indícios, o processo será arquivado.

No entanto, se houver instrução contraditória e, ainda assim, se se verificar que há elementos constitutivos do crime pelo qual é indiciado, passará para à fase seguinte que é o despacho de pronúncia. “A partir do momento em que o actual comandante-geral da Polícia Nacional for notificado da pronúncia, necessariamente, deverá cessar a função pública”. Embora a sua análise seja meramente jurídica, Ildefonso Manico explicou que não deixa de ter alguma conexão política.

“No que diz respeito à política, é mais um aspecto ético, ou seja, será que faz bem, numa fase destas, em que se está a pugnar pela coerência, pela luta contra a impunidade, etc, o Presidente da República vánomear quem está a constas com à justiça”? questiona o causídico.

De acordo com o nosso interlocutor, nada legal impede João Lourenço de o nomear para esse cargo, mas “belisca” um pouco aquilo que se quer mudar. Tal informação é contrariada por uma fonte da Polícia Nacional. De acordo com a nossa fonte, o facto de Paulo de Almeida estar a travar a referida batalha judicial pelo terreno que diz ser sua pertença e do seu irmão, não põe em causa o seu cargo comandante-geral.

“A imunidade dos oficiais superiores são atribuídas pelas patentes, não pela função que exercem. A mesma refere- se a prisão e não a julgamento”, explicou. Além do mais, segundo a fonte, o caso em questão está relacionado a um processo civil não crime, pelo que, o que será julgado é a posse do terreno.

Comandante confirma litígio

Após ser empossado pelo Presidente da República, o novo comissário-geral Paulo de Almeida confirmou, em declarações à imprensa, a existência do litígio com o camponês Armando Manuel, de 71 anos, que, supostamente, ocupa, há cerca 40 anos, o um terreno localizado no Zango Zero, no município de Viana, em Luanda.

Paulo de Almeida confirmou também a existência do processo no Tribunal Supremo e que esse não é o primeiro cidadão que ocupa ilegalmente a sua parcela de terra.

O primeiro, por sua vez, levou o caso a tribunal, para dirimir a disputa, tendo a sentença sido a favor do novo “homem forte” do Comando Geral da Polícia. Disse que depois deste. apareceu outro cidadão com documentos que considera falsos a reclamar a posse do mesmo espaço.

O novo comandante-geral disse que ele e o seu irmão adquiriram a parcela de terra em 1998, por intermédio do Gabinete de Desenvolvimento e Aproveitamento Hidráulico do Kikuxi (GADAK). No momento em que passava a pasta ao seu sucessor, o comandante Panda pediu desculpas à sociedade angolana por “eventuais erros e falhas que tenha cometido fora e no exercício das suas funções, enquanto Comandante Geral, pois que, finalmente, só não erra quem não trabalha”.

Ildefonso Manico considerou a atitude do ex-comandante- geral Alfredo Mingas “Panda”, de colocar o cargo à disposição nas circunstâncias em que o fez, de Ildefonso Manico, jurista “inédita e exemplar”.