Yuri Quixina: “O empresário é o oxigénio da economia e deve ser mimado, através da redução dos custos fixos e variáveis

Yuri Quixina: “O empresário é o oxigénio da economia e deve ser mimado, através da redução dos custos fixos e variáveis

O Economia Real desta edição aborda as negociações entre Angola e o FMI, o encontro do BNA com a Reserva Federal dos EUA e de outros temas que marcaram a semana económica. Acompanhe a análise do Professor de Macro-economia, Yuri Quixina.

POR: Mariano Quissola / Rádio Mais

O que espera das negociações iniciadas entre Angola e a missão do FMI, no âmbito do Programa de Financiamento Ampliado?

Serão negociações muito intensas, porque o FMI está habituado a fazer os seus planos de ajustamento económico e a equipa económica acredita que o FMI vai utilizar os planos em curso, como o Plano Intercalar e Programa de Estabilização Macro- económica do Governo. Teremos, certamente, um novo plano de ajustamento, porque o FMI nunca se submete a um plano de reforma que os países apresentam, quando são solicitados e é nessa perspectiva que estarão a decorrer as negociações. Lembro que Portugal já tinha o PEC IV, mas com a troika adoptaram um novo plano. A Zâmbia e o Gana também tiveram os seus planos, mas prevaleceu o do FMI. Vamos esperar que o plano de ajustamento do FMI não mate o ‘doente’.

O poder de compra dos consumidores continua a baixar. O que vai alterar com a vinda do FMI, já que profetizas dias piores?

Se alguém pensa que sou o profeta da desgraça, devo dizer que só vejo aquilo que muitos não conseguem ver. A fase mais dolorosa de um país em crise é quando se tomam medidas para tirá-lo de lá. E essas medidas vão entrar dentro do nosso espírito e das nossas casas. Por isso, digo que a crise vem com FMI. Num primeiro momento de reformas, a economia será puxada para baixo, para organizar a bagunça que está na economia e o esforço é grande. As senhoras dominam bem essa matéria, quando estão a arrumar a casa. Umas demoram mais que as outras Mas o segundo momento será para libertar o espírito de criatividade e inovação dentro das pessoas. Repara, todos temos um gigante adormecido em nós e não nascemos para depender do Estado. Angola já não tem tempo para brincar de reforma, já brincamos este ano de 2018, não fizemos quase nada, porque nos focamos na política e na justiça, comunicação social e liberdade. Não fizemos nada de economia.

E o Presidente da República determinou o resgate a favor do Estado de seis concessões de projectos de desenvolvimento agro-pecuários, alegando interesse público. Que avaliação faz da medida?

Eu já disse que a economia não faz com o Estado fazendeiro. Porquê que o Estado tem fazendas? É importante, primeiro, mencionar que essas fazendas que agora vai voltar para o Estado já eram do Estado e havia feito concessões a privados, mas esses não conseguiram desenvolver a agricultura porque os meios de produção não são sustentáveis. O Estado entendeu confiscar esses projectos e fazer deles um instrumento de privatização, que acho bem.

O estado não pode ter empresa, não foi concebido para isso. Qual é o Fundo Soberano que tem fazenda?

Está previsto um concurso público para privatiza-las. Acho interessante, mas é preciso descobrir quais foram as razões que fizeram com que esses empresários não levassem avante esses projectos. Não é só privatizar, quem vai comprar não pode comprar gato por lebre. Quais são os constrangimentos que impediram esses empresários de alavancar as fazendas.

O BNA e a Reserva Federal dos Estados Unidos reuniram-se para resgatar a confiança dos bancos americanos correspondentes de Angola. Acredita na normalização das relações?

É uma tentativa do BNA em recuperar a confiança dos bancos correspondentes norte-americanos, porque alega-se publicamente que foi através de supostas cédulas concedidas a Angola terem sido encontradas em posse de grupos terroristas e a ligação entre o sistema financeiro e os políticos. Mas isso não é de todo verdade. O problema está no crescimento económico. Se a economia angolana estivesse a crescer a dois dígitos, duvido que os americanos não entrariam em Angola e prestar serviço de taxa de câmbio e serviços internacionais de compra e venda de bens e serviço. O lucro da arbitragem de taxa de câmbio seria elevado, o comércio externo de Angola reduziu. Prestar serviço de correspondente para Angola hoje não é lucrativo e o americano foi rentabilizar num outro país. O outro problema é o facto de Angola estar muito ligada à China e a moeda chinesa começar a ganhar força nas transações internacionais. Os americanos fazem ciúme disso.

Empresariado nacional, durante a cerimónia do “Roadshow” sobre o Fórum de Investimento Africano. Os empresários devem ter gostado de ouvir isso…

Já disse aqui também que o discurso e a prática não estão alinhados, porque por um lado diz-se que vão apoiar os empresários, mas na prática estão a taxá-los cada vez mais, a AGT está atrás dos empresários e não se consegue reduzir o custo de produção. Até hoje não se consegue dar a devida valorização aos empresários. Se valorizarmos os empresários os estudantes já não vão querer trabalhar no Estado, porque o Estado absorve todos os quadros bons que podiam criar empresas. O empresário é o oxigénio da economia, ele é raro e deve ser mimado, através da redução dos custos fixos e variáveis, é fundamental porque a economia só vai sair da crise se as empresas tiverem oportunidade de crescimento. E o Governo pensa que o financiamento é tudo. Não. Financiamento com custos elevados é o mesmo que meter o dinheiro no fogo.