“Dói muito essa cabala”

“Dói muito essa cabala”

Francisca de Brito declarou que já havia, vários dias antes de ter sido contactada via telefónica por Norberto Garcia, “disseminado informações sobre operações de branqueamento de capitais” à Procuradoria- Geral da República (PGR) e ao Serviço de Investigação Criminal (SICI), em relação ao alegado investimento que os tailandeses da Centennial Energy (Th ailand), Company diziam pretender fazer no país.

No entanto, em resposta ao pedido do então director da extinta UTIP, órgão afecto à Presidência da República, a directora da UIF retorquiu, via sms, que “a resposta vinda da nossa congénere das Filipinas sobre o assunto por nós tratado [o fundo de 50 mil milhões de dólares] nada consta, continuámos à espera de outras respostas”. Isto ocorreu um dia depois de os tailandeses terem sido detidos pelo SIC no Hotel Epic Sana, em função da sua denúncia.

Norberto Garcia disse que foi se baseando nesta informação e nas garantias semelhantes que recebera do Banco Nacional de Angola (BNA) e do Banco de Negócios Internacional (BNI) que enviou ao Titular do Poder Executivo, João Lourenço, um ofício “dando conta da possibilidade de tal investimento vir a se realizar”. “Eu não iria mentir a sua excelência o Presidente da República. Apenas informei aquilo que me havia sido informado”, voltou a desabafar.

De realçar que o ofício enviado ao Chefe de Estado serviu de fundamento para que ele fosse acusado de “cúmplice no crime de burla por defraudação na forma frustrada”, entre outros três crimes. Razão pela qual, está a ser julgado com outros três cidadãos nacionais, quatro tailandeses, um etíope e um canadense.

A UTIP endereçou uma carta à Unidade de Informação Financeira, datada de 23 de Janeiro de 2018, solicitando a emissão de um parecer sobre o alegado fundo fi nanceiro que a empresa Centennial Energy, propriedade do alegado bilionário tailandês Raveeroj Rithchoteanan, dizia ter disponível. Em resposta, a UIF solicitara à UTIP, na ocasião, que lhe prestasse informações complementares, de acordo com Francisca de Brito.

A directora da UIF foi confrontada com dois documentos que enviou à PGR e ao SIC, datadas de 9 e de 21 de Fevereiro d 2018, dando a conhecer as suas suspeitas, em função da informação que recebera da sua congénere das Filipinas, em função das diligências que realizou.

Questionada por Evaristo Maneco, advogado de Norberto Garcia, se em função da carta que a UTIP havia enviado à UIF, na qual fazia referência ao cheque de USD 50 mil milhões e aos documentos que a suportar a sua instituição não tinha a obrigação de informá- la sobre o que havia descoberto, Francisca de Brito respondeu negativamente, alegando que a instituição que dirige não é fi nanceira e tem o dever de colaborar apenas com os órgãos de participação no âmbito da lei, nomeadamente a PGR e o SIC.

“Só pediram parecer”

O advogado Sérgio Raimundo, defensor dos arguidos André Louis Roy e José Arsénio Manuel, perguntou a Francisca de Brito o que entendeu que a UTIP pretendia com o pedido de parecer, no ofício acima mencionado, ao que respondeu negativamente, dizendo que não tinha entendido qual tipo de parecer lhe tinha sido pedido. “Então, por que razão na carta que enviou à UTIP pedindo documentos complementares, em relação ao pedido de 23 de Janeiro de 2018, não pediu para Norberto Garcia a esclarecer sobre o parecer que lhe tinha pedido?” Questionou o causídico.

A resposta de Francisca de Brito foi surpreendente, uma esquiva ao cerne da questão, “Até aqui nada de específi co porque só pediam parecer”, respondeu a alta funcionária do Estado . Insatisfeito com a resposta, Sérgio Raimundo refez a questão. “UIF respondeu ao pedido de parecer da UTIP?” Depois de algumas explicações, Francisca de Brito declarou que “até aí não porque não tinha a informação”.

Declarou que a instituição que dirige mantém uma relação privilegiada com a PGR e o SIC, diferente das demais instituições do Estado. Esclareceu que a UIF tem a missão de receber, analisar e disseminar informações sobre operações suspeitas de branqueamento de capitais e de financiamento ao terrorismo.

Face a isso, o advogado perguntou- lhe se, em função de tais atribuições, a UIF não tem também a obrigação de cooperar com as demais instituições do Estado, como a UTIP, e Francisca de Brito respondeu que tem também o dever de cooperar com as demais instituições não só públicas como privadas para prevenir situações do género.

Neste contexto, tendo em conta as informações que prestara à PGR, ao SIC e ao então secretário do Presidente da República, Ricardo D´Abreu, dando conta de que o cheque dos tailandeses não tinha cobertura, Sérgio Raimundo questionou-a sobre a razão por que não comunicou isso à UTIP, ao que Francisca de Brito respondeu “não prestei tal informação porque a UTIP não pediu”, contrariando a informação relacionada com os três pedidos de parecer feitos pela instituição liderada, à data dos factos por Norberto Garcia.