António Luís de Sousa: “O ministro Manuel Augusto precisa ouvir mais os diplomatas mais velhos”

António Luís de Sousa: “O ministro Manuel Augusto precisa ouvir mais os diplomatas mais velhos”

POR: Dani Costa
fotos de Lito Cahongolo

Quem é o António Lima Viegas?

Eu sou o António Luís de Sousa Lima Viegas. Sou embaixador de carreira. Estou há 41 anos no Ministério das Relações Exteriores. Fiz três cursos de diplomacia. Fui para o Ministério das Relações Exteriores vindo do Ministério das Finanças com a missão de reorganizar a sua área administrativa e financeira.

Quais eram os problemas que encontrou naquela altura?

A nível da gestão financeira era necessário arranjarmos modelos próprios para que a gestão fosse feita em função da movimentação de dólares e outras moedas. Isto foi tudo um trabalho que eu e outros colegas fizemos. Por fim, acabei por ficar no Ministério das Relações Exteriores.

O que o levou a permanecer?

Eu entendi que para uma pessoa fazer um trabalho profícuo em termos financeiros, tinha que saber exactamente o que era a diplomacia. E é assim que peço a minha transferência para o quadro do Ministério das Relações Exteriores. Sou colocado em Roma, na Itália, em 1981.

Quatro décadas depois podemos concluir que já entende perfeitamente o que é a diplomacia?

Entendo perfeitamente e é necessário para que haja formação de diplomatas, para as pessoas representarem condignamente o país. Tomou posse a 12 deste mês para mais um mandato à frente da Associação dos Diplomatas de Angola (ADA), num processo um pouco conturbado com recurso aos tribunais. Quais são os desafios da associação para o presente mandato? Para este mandato, queremos evoluir e ter uma ADA muito activa. Uma parceira privilegiada da direcção do Ministério das Relações Exteriores.

Não tem sido uma parceira do Ministério das Relações Exteriores?

A ADA, de facto, tem encontrado alguns entraves nas direcções anteriores, porque nós pugnamos pela defesa dos interesses dos trabalhadores. Talvez se confunda um bocado a nossa posição com a de um sindicato, mas não somos um sindicato. Somos acima de tudo uma associação que pretende que se respeite o trabalhador em toda a sua amplitude. É isso que pedimos à nova direcção da ADA. Em princípio, queríamos que fosse uma lista única, eu estaria numa outra posição, como presidente da mesa da assembleia-geral, e a nossa candidata era precisamente a que se tornou posteriormente minha oponente.

O que se passou para que ela não aceitasse liderar a lista única da Associação dos Diplomatas Angolanos?

Não se sabe porquê. Ela disse que já não queria mais e criou uma outra lista. Não sabemos exactamente porque quis fazer isso, mas, em princípio, achamos que é muito chegada à direcção do Ministério das Relações Exteriores. Quando se refere à direcção do Ministério das Relações Exteriores está a dizer concretamente ao ministro Manuel Augusto? Ao ministro (Manuel Augusto) e ao seu próprio director de gabinete, que foi a sua testemunha a nível do tribunal.

A defesa que pretendem fazer é apenas para os diplomatas?

Defendemos, de uma forma geral, os diplomatas e todos os trabalhadores do Ministério das Relações Exteriores. Pretendemos a unidade de todos os trabalhadores e acima de tudo que se crie um conselho de direcção ou um conselho de diplomatas – onde possamos discutir todos os problemas com a direcção do ministério, desde concursos públicos, as promoções dos trabalhadores, os direitos e deveres destes.

A direcção da ADA toma posse numa altura em que foi lançado um concurso público no Ministério das Relações Exteriores?

Sobre esta matéria, a ADA já manifestou junto do senhor ministro por escrito a sua posição em relação ao concurso público.

Qual é a posição que defendem?

Pretendemos primeiramente que se organize o Ministério das Relações Exteriores. Todo funcionário quando entra para a função pública deve ser através de um concurso público e nos deparamos com uma situação em que os trabalhadores que entraram desde 2010 não fi zeram o concurso público. Entraram directamente em categorias superiores. Constatamos pessoas que entraram directamente como embaixadores, ministro- conselheiros, conselheiros e primeiros-secretários. Interrogamos a direcção: estes indivíduos podem ou não concorrer no referido concurso público e como é que isso deve ser feito?

Qual é a resposta que tiveram?

Até agora não tivemos nenhuma resposta.

No ponto de vista da ADA, podem ou não concorrer?

Não podem concorrer. E mais: a ADA toma esta posição em função de uma orientação de sua excelência Presidente da República, João Manuel Gonçalves Lourenço, que, por altura da reunião dos embaixadores fez o discurso de abertura. Ele deixou orientações expressas que o senhor ministro tinha a grande oportunidade de poder reajustar todos os funcionários do Ministério. Esta foi uma das bandeiras que tivemos durante a campanha nas eleições da ADA. Foi bem acolhida por todos os trabalhadores e é o que nós queremos. Há pessoas que entraram em 2002, hoje são primeiros-secretários. Há indivíduos que entraram em 2004 ou 2005, hoje já são embaixadores. Não pode.

Face ao que nos está a narrar: qual é o perfil do diplomata angolano?

O perfil do diplomata angolano está no decreto presidencial que estabelece o Estatuto do Diplomata. Trata-se do decreto 209/11 de 3 de Agosto. Lá está bem expresso qual é o perfil. A carreira diplomática é especial. Nós, que exercemos a carreira diplomática dentro e fora do país temos que dignificar Angola acima de tudo. A ADA tem constatado, com muita apreensão, que uma grande parte dos nossos diplomatas no exterior não tem sabido representar condignamente o país.

Trata-se de uma minoria ou maioria?

No volume de trabalhadores que o Ministério tem, que são mil e tal, eles devem andar a volta dos 200 ou 300 trabalhadores. É uma minoria grande que entrou logo para exercer funções diplomáticas. Nós, na ADA, entendemos que este estatuto do diplomata deve ser alterado, porque pensamos que eles devem ter uma melhor especialização. Não devem ser diplomatas generalistas como hoje. Pensamos que se deveria dividir em duas, carreira diplomática e carreira consular, por forma a especializarmos melhor os nossos diplomatas. Defendemos também que se estruture melhor a carreira diplomática e que se enquadre no âmbito de todos os países da CPLP.

Um técnico que é admitido hoje no Ministério das Relações Exteriores pode almejar chegar ao topo da carreira diplomática por mérito próprio ou há outros factores que têm facilitado esta ascensão?

Por isso defendemos a divisão da carreira diplomática. É para dar a possibilidade a estes colegas que estão nas carreiras auxiliares, técnicas superiores poderem concorrer para esta carreira especial. Queremos dar a possibilidade a toda a gente para poderem trilhar dentro do Ministério das Relações Exteriores. Hoje não se verifica isso. Qualquer pessoa que seja escriturário, técnico médio ou superior exerce no exterior funções consulares. Não pode ser assim. A carreira consular é de muita responsabilidade, porque é a continuação de todo o serviço administrativo que está dentro do país. E pretendemos que todos os nossos funcionários estejam bem formados. Neste sentido, nós pretendemos que se aproveite melhor o Instituto Superior de Relações Internacionais por forma a se preparar condignamente estes quadros e nós, diplomatas mais velhos, podemos inclusive leccionar nesta instituição, passando a nossa experiência. Muitos de nós estão na reforma e a experiência que colhemos no exterior e interior do país é importante transmiti-los à nova geração.

Quem são os indivíduos que ocupam os cargos de conselheiros, ministros conselheiros e secretários? concurso de outras instituições?

O Ministério das Relações Exteriores tem uma carreira em que a pessoa entra como adido por seis meses e depois é nomeado terceiro secretário. Fica quatro anos e depois é nomeado segundo secretário com concurso público sempre. E por aí adiante. Passam para primeiro, conselheiro e ministro-conselheiro, mas sempre com concurso público. É esta progressão que todo o diplomata deve fazer, só que hoje não se verifica isso. Até a nível do Ministério das Relações Exteriores nomeiam-se pessoas directamente como ministro- conselheiro e não conhecem nada de diplomacia, não fizeram nenhum curso nem trajectória. Isto não pode ser. Há outros organismos que concorrem também para a diplomacia.

Quais são estas instituições que também concorrem para a diplomacia?

O Ministério da Comunicação Social com os adidos de imprensa e o Ministério da Cultura com os adidos culturais. E temos outras instituições afins, com os seus quadros, alguns dos quais são enquadrados como primeiro ou segundo secretários.

Fala-se que são lugares reservados sobretudo para o pessoal dos Serviços de Inteligência Externa. É verdade?

Eles fazem parte da carreira diplomática no desempenho das suas funções. É uma carreira muito especial. Já fui abordado por alguns colegas desta área que gostariam que houvesse uma integração. Eu não discordo porque até poderíamos prestar um melhor serviço e acho que é muito importante para o desenvolvimento da actividade diplomática.

O Presidente da República dirige a política externa do país. A vontade deste tem às vezes suplantado as apostas do Ministério das Relações Exteriores para determinados países?

Não vejo isso sobre este prisma.

Como entender que muitas das vezes a aposta passe por pessoas que foram afastadas a nível interno, em cargos de governadores, da Polícia ou até mesmo das Forças Armadas, e são enquadradas nas missões diplomáticas?

Nós, como ADA, já manifestamos a nossa posição. Entendemos que no global das chefias diplomáticas e consulares, que são cerca de 90, dez por cento devem ser para embaixadores políticos. E estes que são nomeados directamente pelo Presidente da República como embaixadores extraordinários e plenipotenciários são, na verdade, embaixadores políticos. Isso existe em qualquer parte do mundo. Agora, é preciso dar oportunidade aos embaixadores de carreira poderem fazer a sua progressão e também serem chefe de missão. Penso que neste momento, a nova direcção do país está a pugnar por isso. Já há muitos embaixadores de carreira em postos de embaixadores extraordinários e plenipotenciários.

Então já não se pode ver o Ministério das Relações Exteriores como o ‘vale dos caídos’?

Acho que, com a nova direcção do país não podemos ver a coisa nesse prisma. Penso que estão a ser colocadas pessoas em países estratégicos, onde há uma maior actividade política e que requer exactamente a colocação de embaixadores de carácter político.

A reforma dos embaixadores a que assistimos recentemente teve como base a idade ou fundamentos políticos, uma vez que ainda observamos alguns embaixadores já na casa dos 80 anos de idade?

Os primeiros embaixadores a irem para a reforma foram os de carreira do próprio ministério. Fomos cerca de 70. Penso que agora chegou o momento de os embaixadores políticos também poderem ir para a reforma. Deve acontecer, se calhar, alguns já foram para a reforma. Foi por idade avançada, porque a lei diz que são 60 anos, mas na diplomacia, segundo prevê o Estatuto do Diplomata, os embaixadores podem ser jubilados. Neste momento, o Ministério das Relações Exteriores não tem cumprido isso. Quando fui para a reforma lutamos para que isso acontecesse, porque o embaixador jubilado é aquele que reúne determinadas características: tem que ser licenciado, ter uma carreira limpa feita no ministério sem quaisquer problemas, e continuaria a dar o seu contributo mesmo jubilado. Poderia inclusivamente cumprir missões no exterior do país por orientação do Presidente da República ou do ministro das Relações Exteriores. No fundo, queremos que os embaixadores de carreira tenha a possibilidade de fazer carreira e de chegarem ao topo. O indivíduo que começa a carreira diplomática deve chegar ao topo e para isso é necessário que haja concurso público.

Actualmente, ainda é possível ver alguns embaixadores do exercício das suas funções que já são quase octagenários. Há os casos de Hendrik Vaal Neto, Jaime Vilinga, Tony da Costa Fernandes, António Tavares e outros. Por outro lado, alguns mais novos já estão na reforma. Isso demonstra que este processo não tem sido pacífico?

Na verdade não tem sido pacífico, até na própria direcção do ministério. Gostaríamos que as funções de secretário-geral e inspector-geral do ministério fossem ocupadas por diplomatas de carreira já com uma determinada idade que pudessem conduzir melhor os destinos do Ministério das Relações Exteriores.

O embaixador já foi inspector-geral do ministério?

Fui inspector, sim senhor. Penso que cumpri muito bem o meu papel. Talvez por ser um indivíduo muito rigoroso, porque sou jurista e defendo o cumprimento da lei, não tivesse sido bem entendido.

O subsídio de reforma dos embaixadores não permite que vivam com alguma dignidade?

Acho que a reforma permite que vivam com dignidade. Mas o problema não é esse. Penso que a nova direcção do país vai tomar algumas definições em relação. Vamos aguardar.

Quando recebe um embaixador reformado?

A volta de 500 mil Kwanzas.

Havia informações de que alguns embaixadores tentaram apropriar-se de alguns bens do Estado angolano nos países em que trabalhavam. É verdade?

Não se trata de apropriação dos bens. O Ministério das Relações Exteriores é que deve definir bem o que é que um funcionário diplomático ou chefe de missão pode levar. Isso deve ser definido no Estatuto do Diplomata para que não haja problemas maiores.

‘Temos que reduzir o pessoal das missões diplomáticas’

A crise financeira que se vive justifica o encerramento de muitas das embaixadas, como por exemplo no Canáda, mas mantemos uma em Kinshasa, na República Democrática do Congo, e do outro lado do rio, em Brazaville, uma outra representação diplomática. As escolhas foram bem feitas?

Esse é um problema que deveríamos ter discutido melhor. A direcção do Ministério entendeu que a redução ou o encerramento de muitas missões seria o melhor, mas a ADA pensa que o que deveríamos e temos que fazer é a redução dos quadros previstos para as missões diplomáticas. Em muitas missões diplomáticas com oito ou 10 funcionários poderíamos ter quatro ou seis. Depois há ainda os problemas dos imóveis, porque se for fechado vai-se deteriorando. Portanto, se a direcção do país entendeu que a melhor maneira era encerrar, nós cumprimos.

A nível pessoal, foi uma medida acertada?

Do meu ponto de vista temos que reduzir o pessoal das missões diplomáticas, por forma a reduzirmos as despesas.

Gasta-se muito dinheiro nas missões diplomáticas?

Sim, gasta-se muito dinheiro. O funcionário quer casa, carro, paga- se água e luz. Entendemos que se deve discutir isso com a direcção do ministério. Somos de opinião que seja estipulado um salário e que ele encarrega-se das suas despesas.

Não é assim que acontece?

Não. Neste momento o ministério paga o salário, um percentual, a renda de casa, a água e a luz. Gostaríamos de inverter esta realidade.

Como é que estipula esse percentual pago?

Nas missões diplomáticas, de acordo com a região onde se encontram, é atribuído um percentual de 500, 800 ou mil por cento. Quem fixa é o Ministério das Finanças e é enquadrado dentro do orçamento de cada missão diplomática.

Normalmente, os embaixadores e responsáveis de outras missões diplomáticas enquadram parentes seus, como esposas, filhos, sobrinhos e até outros parentes. Tem conhecimento disso?

Existe um decreto lei que estipula o pessoal que deve estar afectos aos gabinetes dos membros do Governo. É o pessoal de confiança e de uma forma geral colocam aí pessoas de família. Uma das coisas que reparamos é que isso tornou-se extensivo às missõ

es diplomáticas e missões consulares. O decreto não diz isso. É preciso que o Ministério das Relações Exteriores estanque esta posição. É mau para a imagem do país.

Ainda se assiste a isso hoje?

É muito visível. Acho que a ADA, neste conselho de quadros que pretendemos participar ou nos conselhos de direcção onde se discute os direitos e deveres dos diplomatas, possamos dar a nossa opinião.

Esta promiscuidade, se assim podemos considerar, é apenas nas missões diplomáticas ou até mesmo no próprio Ministério das Relações Exteriores?

É visível no Ministério e nas missões diplomáticas.Há alguns meses apresentou uma queixa à Procuradoria-Geral da República relacionada com coisas que acontecem no Ministério das Relações Exteriores. Como está o processo?

São coisas que tinham a ver com a minha actividade como inspector, mas isso está entregue às autoridades competentes e aguardamos que elas dêem o despacho final.

O que pensa do ministro Manuel Augusto e da sua gestão à frente do Ministério das Relações Exteriores?

Eu penso que o ministro Manuel Augusto é, na verdade, um bom diplomata. Mas, em minha opinião, ele deveria ouvir mais os diplomatas mais velhos e aqueles que fizeram carreira dentro do ministério. O que a ADA pensa é que o ministro Manuel Augusto e as pessoas que o rodeiam, principalmente as duas mais afectas, não são as mais indicadas.

Refere-se concretamente a que entidades dentro do ministério?

Refiro-me concretamente ao secretário- geral e ao director do seu gabinete. São pessoas muito jovens, não conhecem a realidade das missões diplomáticas. Muitas vezes chamamos atenção por alguma coisa que tenham feito, eles não acatam isso de bom grado. Dou-lhe um exemplo concreto: foram nomeados cônsules gerais interinos. Não podem ser nomeados. Isso é uma violação da Convenção de Viena sobre relações consulares. Não pode haver cônsul interino.

A situação era diferente na época do ministro George Chikoty?

Acho que a situação agora é pior.

Surgiram no passado informações de que o então ministro George Chikoty havi supostamente colocado muitos parentes no Ministério das Relações Exteriores. É verdade e hoje se vive o contrário? É uma questão latente, por isso é que nós, a ADA, estamos a levantar questões em relação ao concurso público. Este concurso, para ser realizado tem que se clarificar tudo, porque os familiares destes ministros entraram como primeiros-secretários, ministros-conselheiros.

Que tipo de familiares são?

Irmãos, filhos, primos e outra linha de familiares.

Não há dúvidas de que o Presidente José Eduardo dos Santos jogou um papel importante na diplomacia angolana

Os angolanos no exterior queixam- se quase sempre do tratamento que lhes é dado nas missões diplomáticas angolanas. O que se tem passado?

É o problema da formação dos nossos diplomatas. Muitas das pessoas que estão a exercer funções no exterior não são diplomatas de carreira. Por isso, é que exigimos que haja concurso público, formação e que seja contínua. Para que os nossos diplomatas no exterior saibam desempenhar todas as suas actividades. Falo isso por experiência própria, porque enquanto diplomata no exterior eu ia às cadeias e noutros sítios. Aprendemos isso quando estamos na formação para diplomatas e é isso que falta. O diplomata não tem hora de trabalho e deve ir onde for necessário, mas para isso temos que lhes dar as ferramentas. Elas são dadas na formação. Quando entram para o ministério tem um curso de preparação durante seis meses, a estudar as convenções e todas as outras matérias do direito internacional público e privado, para que ele possa condignamente desempenhar as suas funções. É isso que a ADA exigiu e vamos continuar junto da direcção do ministério para que isso seja uma realidade.

Como é que os angolanos o viam quando esteve a exercer funções em Roma?

Eu não gosto muito de falar de mim, mas penso que os outros poderão fazê-lo. Estive na Itália e em Moçambique, posso dizer que vivia o problema de todos os angolanos com muito fervor.

Qual é a imagem que os angolanos têm da nossa diplomacia?

Pelo que tenho observado, há muita inquietação da comunidade angolana no exterior. É preciso reconhecer o papel dos angolanos no exterior. É preciso acompanhá-los, apoiá-los e ajudá- los em todos os domínios. Isto é fundamental para que possamos levar a bom porto a nossa diplomacia.

Portugal, Estados Unidos, Rússia e Cuba continuam a ser as prioridades da nossa diplomacia?

Eu penso que sim. São países muito especiais e com muitas particularidades. Acho que a nossa diplomacia está atenta a isso e mantém esta posição.

E como vê a viragem à China?

A China é, na verdade, o novo gigante. É um país com o qual Angola mantém uma relação muito privilegiada e os nossos diplomatas devem ter muita acuidade em toda a sua actividade na República Popular da China.

O que pensou do encerramento de uma representação comercial na China?

Sim, em Hong Kong. É uma praça financeira forte. Foi uma representação onde tínhamos muitos diplomatas sem necessidade. Por isso, digo que temos que rever o quadro de todas as missões diplomáticas. Na diplomacia gasta-se muito dinheiro. É preciso reduzir os gastos.

Vai ser possível vender bem a imagem de Angola quando se reduz os adidos, de imprensa e cultural?

O que está previsto neste momento é a cobertura regional. Não quer dizer que ao tirarmos um adido cultural de uma zona e coloca-lo noutra não vai haver cobertura. O adido que estiver num país próximo vai cobrir a outra área. O que é necessário é que os diversos adidos de imprensa ou cultural possam fazer estas coberturas regionais.

A ADA tem noção de quantos diplomatas já regressaram ao país no âmbito do encerramento de algumas missões diplomáticas?

Neste momento não temos o número exacto de funcionários que regressaram. Sabemos que regressaram muitos, outros hão-de regressar e alguns que não terminaram serão transferidos para outras missões diplomáticas.

Há outros que foram nomeados há mais de um ano e não seguiram. O que se passa?

Penso que o problema é financeiro. Está-se à espera que se liberte a quota financeira para poderem avançar. Penso que dentro de poucos dias as direcções dos vários ministérios vão resolver a situação.

Qual foi o período mais áureo da nossa diplomacia?

O período áureo da nossa diplomacia foi, precisamente, nos anos 90-2000, em que se intensificou a actividade diplomática no sentido de se acabar com a guerra. Foi muito importante o papel desempenhado pela diplomacia. E é bom ressaltar aqui que o diplomata bem preparado pode acabar com uma guerra.

Mas as ‘guerras’ no Ministério das Relações Exteriores não têm sido fáceis de se solucionar?

Uma das funções do diplomata é a negociação. E penso que esta direcção do Ministério vai ter que se sentar e negociar com a ADA. Nós somos o parceiro privilegiado do Ministério das Relações Exteriores. Não deve guardar nenhum rancor em relação ao presidente da ADA e dos seus responsáveis. Há algum rancor? Eu sinto que sim, porque o verdadeiro problema nestas eleições é precisamente a minha vitória. Porque os trabalhadores do ministério querem que eu seja o presidente da ADA. Se hoje fizéssemos uma eleição de todos os funcionários, eu ganharia por mais de 90 por cento. Mas, a direcção do Ministério, talvez por eu ser uma pessoa aberta, que faz críticas positiva, não seja bem vista. Pensa desistir da queixa que apresentou à Procuradoria- Geral da República? (Risos). São questões de um outro carácter. Só a Procuradoria- Geral da República é que deve decidir. Estou disposto a ser ouvido, acho que tive que tomar uma posição porque senti um determinado período na minha vida. Achei que deveria tomar a posição que tomei. Mas isso é passado, agora devemos nos ater aos problemas da organização interna do ministério e defendermos os reais interesses dos diplomatas.

Qual foi o papel de José Eduardo dos Santos para termos a diplomacia que temos hoje?

Não há dúvidas de que o Presidente José Eduardo dos Santos jogou um papel importante na diplomacia angolana. Fui do tempo em que ele era o Presidente da República, interagi muito com ele porque fui encarregado de negócios em Roma. Acho que o papel dele foi determinante para terminarmos a guerra.

E o que se reserva a João Lourenço para o país do futuro?

Nós os diplomatas devemos ajudar o Presidente da República, João Lourenço, e o ministro das Relações Exteriores, Manuel Augusto, no sentido de desempenharem toda uma actividade diplomática condigna. E acho que estamos na linha correcta. O Presidente também está na linha correcta. O que é preciso agora é prepararmos os novos diplomatas para estabilizarmos a nossa diplomacia.