Quando o sexo invade a escola

Por volta das 17h50, depois das aulas, Patrícia (nome fictício), aparentemente com 22 anos de idade, estudante de um dos institutos médios de Viana, acompanhada por três amigas, dirigia-se ao estabelecimento de lazer que fica ao pé da escola onde estuda. Naquele espaço, com as amigas, retiram as batas e, sem mais delongas, pedem bebidas alcoólicas e ocupam os primeiros assentos ao pé da piscina.

Durante a conversa, Patrícia, de estrutura magra, alta e pele clara, conta às amigas sobre as horas bem passadas no dia anterior com um indivíduo à quem trata por “broto”. Fala do saldo que recebeu, da pequena surpresa no dia de aniversário e das boas notas que teve durante o primeiro trimestre na disciplina de Física.

Apesar de segredar o nome do indivíduo com todas as chaves, num descuido, já depois de ter consumido alguns copos, Patrícia acaba por revelar que o indivíduo em causa, a quem ela trata de “broto”, é o seu professor de Física.

A estudante, que está no terceiro ano do curso de Ciências Físicas e Biológicas, não esconde a satisfação de estar a namorar com o professor. O namoro segue o seu segundo ano. E durante esse tempo a estudante disse já ter beneficiado de muitas coisas. Entre elas o facto de ter passado de classe com boas notas no ano lectivo 2018/2019.

Questionada por uma das amigas se já foi à casa do namorado, Patrícia é categórica em responder que o professor é apenas um amante para questões escolares, já que ele tem mulher, e ela… está noiva de um outro rapaz.

“Ele já me disse que quando está em casa não posso ligar por causa da esposa. E ele também sabe que durante o fim-de-semana estou com meu namorado. Curtimos aqui mesmo só na escola. É um namoro de se ajudar”, desabafou a jovem estudante.

Enquanto a conversa seguia animada, entre gargalhadas e álcool, outra amiga de Patrícia, cujo nome não foi revelado, começou também por dizer da experiência que teve com um outro professor na 10ª Classe. Com saudades, a jovem falava dos dias em que o docente deixava de dar aulas para ficar com elas em sítios privados.

Já o tempo corria para as 19 horas. No entanto, o diálogo entre “kambas” percorria solto até que as meninas descobrem a nossa equipa de reportagem no local. Irritadas, com medo de virem a ser expostas, as jovens estudantes retiraram-se do espaço e ameaçaram processar a nossa equipa caso a conversa que estavam a manter em privado viesse a ser publicada.

Já o gerente do espaço, em conversa com a nossa equipa, disse que o caso de Patrícia e as suas amigas é apenas mais um dos tantos que todos os dias passam pelo seu estabelecimento, muito frequentado por alunos e professores.

Segundo explicou, o local tem sido ponto de encontro e de refúgio de alunos e professores que namoram em segredo.

“Eu também tenho filha e dóime ver meninas que muito ainda têm para dar a perderem-se com professores. São namoros casuais apenas em busca de benefícios. Elas dão o sexo em troca de boas notas. E eles buscam apenas a satisfação sexual, triste”, lamentou.

A abordagem de professores que namoram com alunas não é nova. É uma realidade que cada vez mais vem ganhando espaço no ciclo académico e contribuindo negativamente para o processo de aprendizagem e ensino. São, na maior parte das vezes, professores com idades e tempos de experiências já avançados que detonam toda a sua competência, transformando assim a sala de aulas num autêntico campo de conquistas e de realizações dos seus intentos sexuais.

Tal como apuramos, junto da comunidade académica, normalmente o namoro entre professores e alunas é eventual, nada de compromisso sério. Longe de um sentimento real, elas entregam- se aos docentes em busca de realizações materiais e para assegurarem boas notas nas provas e garantirem a passagem de ano, mesmo que não tenham adquirido o de conhecimento científico que as habilite a transitar de classe.

Regra geral, apesar da liberdade na sala, já que podem faltar quantas vezes quiserem às aulas, por terem a vida académica facilitada, as alunas que namoram com os professores têm a vida controlada por estes, que tudo fazem para não serem descobertos e acabarem responsabilizados.

A relação secreta é guardada com todas as chaves longe do conhecimento da família, da comunidade académica e dos amigos. Mas, em muitos casos, essa promiscuidade resulta em transmissão de doenças ou de gravidez, que acabam por ser o factor de descoberta da secreta relação. É o caso do professor do segundo ciclo do Instituto Politécnico de Cacuaco, Custódio Lopes Cassule, que foi demitido do Ministério da Educação (MED) por assédio e abuso sexual que resultou em gravidez de uma aluna de 16 anos.

Segundo um despacho assinado pela titular da pasta da Educação, Maria Cândida Teixeira, o professor, de 36 anos, praticou actos de indisciplina grave que mancham a conduta de um agente do sector.

O MED invoca a sua decisão baseando- se no Decreto Presidencial nº 160/18 de 3 de Julho (Estatuto da Carreira dos Agentes da Educação) no número 2 do seu artigo 56º, em que consta que a prática de quaisquer actos que constituam simultaneamente crime punível com pena de prisão maior é punível com as medidas disciplinares de demissão ou rescisão do contrato.

Também o Tribunal Provincial de Luanda condenou a seis meses de prisão, com pena suspensa, um professor, de 45 anos, da Escola 4 de Abril, na Centralidade do Kilamba, por ter convidado uma das suas alunas a fazer uma prova académica de superação de nota numa pensão.

O docente tinha como objectivo conseguir sexo em troca de favores na correcção da prova, tendo sido condenado apenas por falsificação de documento porque a aluna, de 20 anos, é maior de idade. O docente foi ainda condenado a pagar uma taxa de justiça no valor de 50 mil Kwanzas, bem como 40 mil de indemnização a favor da ofendida.

Reza a acusação que o professor, da disciplina de Francês, na escola do Segundo Ciclo do Pré-universitário, 4 de Abril, convidou a aluna Antónia José Manuel, que tinha a referida disciplina por eliminar, dando-lhe a possibilidade de realizar uma segunda prova, porque a primeira, realizada no passado dia 08 de Maio, teria corrido mal.

Envolvidos são punidos

Contactada por OPAÍS, a directora do Gabinete Jurídico do Ministério da Educação (MED), Joana Moura, disse que os professores envolvidos neste tipo de prática têm sido responsabilizados com medidas duras que terminam com a sua expulsão do quadro de efectivos do ministério.

Sem avançar números concretos, Joana Moura fez saber que o MED tem recebido, todos os anos, denúncias de professores que namoram com as alunas e o tratamento tem sido igual, responsabilização com a desvinculação do quadro. Tal como explicou, o professor deve ter um perfil correspondente ao estatuto da carreira dos agentes da educação.

“Agimos em conformidade com a lei. Regra geral, os docentes nesta situação são desvinculados do quadro. Esse comportamento não se adequa ao perfil de um professor”, notou.

Comportamentos desviantes

Por seu lado, o sociólogo Joaquim Dias entende o envolvimento sexual de professores com alunas como sendo um comportamento desviante e que reflecte a falta de compromisso e de ética para com a profissão e para com o ensino. Conforme esclareceu, há um conjunto de normas e procedimentos que regem a actividade docente, enquanto agente de socialização, que devem obedecer o escrupuloso compromisso.

De acordo com o académico, qualquer professor, no exercício das suas funções, deve levar muito à sério os modelos pedagógicos e adoptar uma postura que o impeça de envolver-se em comportamentos fora do padrão profissional.

Com o avolumar de casos, Joaquim Dias defende uma maior actuação dos órgãos de inspecção do Ministério da Educação, do da Família e Promoção da Mulher, bem como o envolvimento da comunidade, de forma a denunciar tais práticas, sobretudo quando se trata de casos de professores que se relaccionam com menores de idade, cuja penalização, como esclareceu, deve ser criminal, como orienta o ordenamento jurídico angolano.

Segundo ainda o docente, as dificuldades económicas de muitas meninas e as questões relacionadas a desestruturação familiar também são factores a ter em conta neste processo. Conforme atestou, em alguns casos são as próprias raparigas que assediam os professores, em busca de realizações materiais. Porém, ainda assim, defende, o próprio docente, tendo em conta a sua condição e posição social, deve sempre ter a capacidade de desviar o foco e manter uma postura responsável e pedagógica.

Já o activista cívico José Caxinda defende maior rigor na escolha dos professores durante os concursos públicos de acesso à actividade de docência. Para além da competência técnica, o também coordenador do programa “SOS Criança” sugere a educação integral como factores que devem estar na base na hora de recrutar um determinado professor.

Para ele, muitos vão parar à carreira docente por falta de outras oportunidades e, por isso, acabam mergulhando em promiscuidades que podem comprometer todo um sistema de ensino. Neste sentido, de forma a evitar mais casos, Jose Caxinda apela ao envolvimento de toda a sociedade no repúdio de actos que possam manchar o espaço académico.

“Mesmo que a aluna tente, o professor é sempre um líder. Está na sala de aulas para formar homens e mulheres para o futuro. Não pode transformar o ambiente escolar num espaço de realizações dos seus prazeres sexuais. Tais práticas devem ser combatidas”, defendeu.