Yuri Quixina: “A implementação do IVA vai criar mais instabilidade na economia”

Yuri Quixina: “A implementação do IVA vai criar mais instabilidade na economia”

A implementação do Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) este ano é ou não um assunto que deveria estar na agenda do Executivo?

Se dependesse de mim, o IVA não seria implementado agora, nem mesmo em 2030. O IVA é um imposto indirecto. E quanto mais um país implementar impostos assim, num período de crise, é como afundar ainda mais o buraco. O IVA tem impacto no Estado, nas famílias, nas empresas produtoras e não só. Nas famílias, este imposto vai reduzir o rendimento, concretamente os salários. Elas vão pagar mais pelos mesmos bens e serviços. O preço do pão vai subir. Se uma família comprava cinco pães com 100 Kwanzas, por exemplo, com o IVA vai comprar menos. O IVA não coloca mais pão na mesa, prejudica o povo que terá menos possibilidade para comprar bata para os filhos, lápis e outros meios. Vamos ter também um aumento do desemprego, uma vez que o lucro das empresas já não será o mesmo. Vai reduzir.

Acha que muitas empresas poderão encerrar depois de o IVA ser implementado?

Advinham-se falências. Há o risco de muitas empresas encerrarem. Muitos negócios ficarão inviáveis. O IVA é um imposto regressivo, é desigual. Quem paga mais é quem está constantemente no mercado. E mais: o IVA vai corroer o rendimento das famílias.

Mas é apresentado como o imposto justo…

Porque dizem que elimina o efeito cascata do imposto de consumo. E isso é que é justiça?

África do Sul e o Essuatine (Swazilândia) têm imposto de consumo e IVA. Estes são injustos?

A justiça de um imposto está relacionada com os rendimentos. O IVA não pode ser uma das principais fontes para arrecadação de receitas no segundo semestre. Devia ser, sim, um elemento extraordinário.

Vão ser privatizadas empresas e espera-se uma arrecadação de USD 110 milhões. É uma medida que peca por tardia?

Sim. Desde 2002 que o Estado devia deixar de criar empresas. Se deixasse de utilizar a economia como manutenção do poder, seria muito interessante, e não teríamos os problemas que temos. O que pretendemos é que o Estado deixe a economia o mais rápido possível, no sentido de dar maior oportunidade criativa aos jovens recém-formados. Não se pode brincar com a economia.

Quadros seniores da Reserva Federal Americana visitaram Angola na última semana. É um bom sinal no esforço para o retorno dos dólares?

Primeiro, é importante lembrar que o nosso sistema financeiro não é uma ilha em si mesma, precisa relacionar- se com outros sistemas. E neste caso estamos a falar particularmente da Reserva Federal Americana, um dos maiores bancos centrais do Mundo, cujas políticas que adopta têm impacto na economia mundial. A Reserva Federal veio certificar se Angola conseguiu corrigir ou não as falhas que tinha no seu sistema financeiro, razão que levou à suspensão do serviço por parte dos correspondentes americanos aos bancos angolanos. Portanto, acho que esta visita é crucial e pode fazer com que Angola seja tida em conta no mercado internacional. Por outro lado, com o Fundo Monetário no país, dá outra força em termos de credibilidade. No meu entender, os americanos não retiraram os dólares de Angola apenas por causa do terrorismo, mas também porque a nossa economia não é muito lucrativa.

Pelo que acabou de dizer, está crente no regresso para breve das divisas ao país ou não?

Depende de alguns factores. Se não crescermos o suficiente, podemos não ter o retorno dos dólares tão cedo assim. É importante também dizer que as divisas na economia nacional dependem muito das exportações. Se exportarmos muito, teremos Euros e Dólares no mercado, o que vai facilitar a relação com o exterior em termos de compra de matéria-prima e de bens e serviços.

As reformas económicas podem ou não proporcionar um crescimento económico e, consequentemente, o retorno das divisas?

Nesta legislatura o crescimento previsto não está acima de 3%. Angola é prisoneira da armadilha do crescimento baixo. Portanto, é fundamental acelerarmos as reformas. Estamos ainda com reformas mínimas. Do ponto de vista económico ainda estamos com aquilo que sempre considerei crucial para estimularmos o espírito produtivo das pessoas: são as pessoas que vão tirar o país da crise, e não o Governo.

Apesar de ser uma recomendação do FMI, a retirada dos subsídios aos combustíveis, segundo o ministro das Finanças, terá que ser bem avaliada, em termos de momento para fazê-lo. O que lhe parece este posicionamento do governante?

O aumento dos preços dos combustíveis precisa de ser dirigido com muita cautela, uma vez que tem impacto político e social muito grande. Sabemos que é uma das recomendações do Fundo Monetário Internacional, no entanto, sabemos também que o FMI gosta de fazer ajustamentos horizontais. Sempre defendi que no início os ajustamentos deviam ser verticais e não na horizontal. Devíamos primeiro eliminar aquelas despesas que afectam apenas um grupo no orçamento, e depois eliminar as que afectam toda a economia.

No seu entender, este é um assunto que está a ser gerido com cautelas. Todavia, logo após a sua tomada de posse, o PCA da Sonangol anunciou que os combustíveis vão subir, há descoordenação?

Não vejo descoordenação. Vejo sim uma visão política do ministro, e outra visão técnica, a do PCA da Sonangol. Quer queiramos quer não, o PCA da Sonangol tem razão. É necessário ajustar, pois não temos refinarias no país. Os ajustamentos de preços são fundamentais na economia. A economia real está a dizer uma coisa e politicamente diz-se outra.

Caso haja uma retirada dos subsídios dos combustíveis, que impacto terá na vida dos cidadãos?

Tudo é combustível. Portanto, teremos impacto na sociedade, na economia e na política.