Tribunal Militar adia leitura da sentença de Zé Maria

Tribunal Militar adia leitura da  sentença de Zé Maria

O Supremo Tribunal  Militar adiou para esta Sexta-feira (22) a leitura da sentença do antigo director do Serviço de Inteligência e Segurança Militar (SISM), general José Maria.

  acusado e pronunciado pelos crimes de insubordinação, extravio de documentos e de aparelhos ou objectos com informações de carácter militar

O juiz da causa não explicou as razões do adiamento da sentença, cuja sessão estava  inicialmente marcada para hoje,  Quinta-feira, (21). Os advogados do acusado, que prestaram esta informação, a  OPAÍS online,  afirmaram que apenas foram informados do adiamento ontem à noite.

Antes de anunciar o veredicto, o tribunal deverá responder  aos 36 quesitos (perguntas a que os juízes são obrigados a responder para fundamentar a decisão) aprovados na sessão de Terça-feira.  O tribunal deverá aferir se ficou ou não provado que o antigo Presidente da República, José Eduardo dos Santos, alguma vez orientou, durante uma reunião com alguns dos seus colaboradores directos, a criação de uma comissão para o registo da história da Batalha do Cuito Cuanavale.

O Tribunal esclarecerá também se, em função das provas produzidas, o general já estava na reforma quando foi informado pelo Chefe do Serviço de Informação e Segurança do Estado (SINSE), Fernando Garcia Miala, de que o Presidente da República, João Lourenço, lhe ordenara a devolver os documentos sobre a referida batalha que havia retirado do SISM.

De realçar que o representante do Ministério Público, tenente-general Filomeno Octávio, pediu, nas alegações finais, que o arguido seja condenado com base na moldura penal estabelecida para os tipos de crimes pelos quais está a ser julgado.

Justificou o seu pedido alegando ter ficado provado que o antigo patrão da secreta militar cometeu os dois crimes pelos quais está a ser julgado. Uma vez que, em seu entender, depois de lhe ter sido comunicado pelo general Fernando Garcia Miala que deveria proceder no prazo de 48 horas à devolução dos documentos sobre a batalha do Cuito Cuanavale, que havia retirado do SISM, não o fez.

Para afastar as declarações segundo as quais o general Zé Maria está a ser alvo de um processo político ou de revanchismo, Filomeno Octávio declarou que ele está a ser julgado não pelas suas realizações enquanto militar ou chefe do SISM, mas por ter retirado documentos dessa instituição sem autorização e por não os ter devolvido, desobedecendo a uma ordem do Comandante-em-Chefe das Forças Armadas Angolanas (FAA).

Esclareceu que ao retirar os documentos do SISM para a Fundação Eduardo dos Santos (FESA), sem autorização superior, Zé Maria violou as normas castrenses, criando uma situação em que tais informações seriam do domínio dos funcionários civis dessa organização que manuseariam os mesmos. Enfatizou que no SISM esses documentos eram manuseados por uma quantidade muito reduzida de pessoas.

Quanto ao crime de insubordinação, para o procurador militar ficou provado em tribunal que o cometeu, sublinhando que apesar de já se encontrar na reforma, o arguido apareceu na primeira e na segunda audiências de julgamento com traje militar. Declarou ainda que os generais na reforma gozam de certas regalias e privilégios inerentes à sua função antiga, entre os quais está o direito de ter assistência médica e de ser julgado num fórum privilegiado.

Porém, nessas circunstâncias, se for a julgamento, o mesmo deverá ser tratado por um tribunal da primeira instância, no entanto, ao despoletar o processo há necessidade de se comunicar ao Presidente da República, nas vestes de Comandante-em-Chefe. Sobre a insubordinação, esclareceu que as instituições militares se regem por princípios próprios, como os da hierarquia e da subordinação que têm como vértice o poder de mando.

“É sobre o princípio da hierarquia e disciplina que reside a organização das FAA”, frisou. O tenente-general Filomeno Octávio disse que a ausência de assinatura do arguido e do seu mandatário judicial (Sérgio Raimundo) no auto de apreensão, bem como a relação nominal dos bens apreendidos em casa deste constituem ilegalidades, no entanto, que podem ser sanadas.

Preparados para recorrer

Os advogados de Zé Maria estão preparados para recorrer da decisão caso seja desfavorável para o seu constituinte.

Durante as sessões de julgamento interpuseram vários recursos sobre situações que consideravam constituírem violações a lei, mas, na sua maioria, foram indeferidos. Aquando das alegações finais, Sérgio Raimundo, líder da equipa de defesa, declarou que o juiz do Supremo Tribunal Militar que exarou a pronúncia deste processo violou os princípios da imparcialidade e do contraditório, ao fazê-lo sem ouvir o acusado.

“O tribunal é imparcial, logo, não pode receber a acusação e torná-la sua em despacho de pronúncia”. Declarou que, antes de confirmar que aceita a acusação por existirem indícios bastantes de que o indiciado cometeu tais crimes, o tribunal devia convocá-lo para que se pudesse pronunciar a respeito em obediência ao princípio do contraditório.

A prova que sustenta a acusação

Sérgio Raimundo alertou ao tribunal que a única prova que sustenta a acusação de que foram apreendidos documentos contendo informações de carácter militar é falsa.

A pessoa que dirigiu a operação de busca e apreensão dos documentos que Zé Maria levou a FESA e às suas duas casas, uma na Praia do Bispo e outra no Nova Vida, com o propósito de terminar de escrever cinco livros sobre a Célebre Batalha do Cuito Cuanavale, não se fez acompanhar de tal auto de apreensão. De acordo com o causídico, a lei militar é bastante clara, que o general na reforma deixa de estar vinculado às FAA, razão pela qual alguns migram para a política e a governação.

A título de exemplo, citou o caso de militares reformados que estão a trabalhar como deputados na Assembleia Nacional, tanto do MPLA como da UNITA e da CASA-CE, bem como de outros que são membros do Executivo (governadores e ministros).

Neste caso, em seu entender, não devem obediência aos órgãos castrenses, mas sim aos responsáveis dos órgãos de soberania a que estão vinculados. Já o advogado José Carlos, também integrante da defesa, declarou, na Terça-feira, que estão bastante optimistas no “bom” desfecho desse processo.

“A decisão não pode cair do céu. Tecnicamente, em princípio, ela deve ser fundamentada com os quesitos e as suas respostas. E, por conseguinte, há quesitos que são mesmo fundamentais”, frisou. Acrescentou de seguida que “há quesitos que são mesmo fundamentais.

Felizmente foram apresentados e discutidos”. No seu ponto de vista, o quesito relacionado com a condição do seu constituinte na data dos factos é um dos imprescindíveis, pois, urge a necessidade de se esclarecer se já tinha ou não passado à reforma. “As datas não mentem”, enfatizou. A defesa está convicta de que a estratégia que adoptou terá surtido o efeito necessário, uma vez que a mesma teve como mote a apresentação de documentos alegadamente probatórios.

“Vocês acomprocesso panharam as audiências e viram que nós não falamos no vazio. Tudo quanto nós usamos como estratégia de defesa foi justificado com factos e sustentado pela própria legislação. Agora vamos esperar que quem tem a necessidade de decidir o faça com serenidade e justiça”, declarou. O    julgamento iniciou no dia 12 de Setembro.