Zenu diz que só pretendiam trazer divisas ao país

Zenu diz que só pretendiam trazer divisas ao país

O antigo presidente do Conselho de Administração do Fundo Soberano, José Filomeno de Sousa dos Santos “Zenu”, declarou, ontem, em tribunal, que a transferência dos 500 milhões de dólares do Banco Nacional de Angola (BNA) para a conta bancaria da empresa Perfectbi, sediada na Suíça, visava unicamente trazer divisas e financiamento ao país.

O arguido e mais três cidadãos nacionais, entre os quais o antigo governador do BNA, Valter Filipe, estão a ser julgados pelo Tribunal Supremo por, alegadamente, terem cometido os crimes de burla por defraudação, branqueamento de capitais e peculato, entre outros.

Zenu disse que a operação foi feita com base nos contratos assumidos pelo banco central angolano com a empresa Mais Financial Service, S.A, propriedade do arguido Jorge Gaudens Pontes Sebastião, e a Resource Project Partnership. Porém, o projecto que possibilitaria a criação de uma linha de financiamento na ordem dos 30 mil milhões de euros não teve êxito por ter sido cancelado pelo Governo angolano. A Perfectbi é que estava encarregada de angariar os fundos.

O juiz assessor João Pedro Fuantonio questionou-o, se os 500 milhões de dólares foram enviados ao exterior do país, por que razão considerava que a operação não teve êxito? Zenu manteve a posição de que a operação fracassou porque o Governo decidiu abortá-la. De realçar que ele começou a responder ao interrogatório afirmando que tomou conhecimento desse projecto de financiamento verbalmente, há cerca de dois anos e seis meses, por intermédio do seu amigo de longa data Jorge Gaudens.

Olhando para a forma pouco segura como o arguido respondia às questões, o juiz questionou-o se estava em condições psicológicas de prosseguir no interrogatório, ao que respondeu positivamente. “Estou à disposição de vocês, se quiserem que me sente, sentarei, se quiserem que eu fale, falarei”, frisou. Não estando convencido, o juiz-presidente da causa, João da Cruz Pitra, perguntou ao advogado António Gentil Figueiredo (o defensor oficioso indicado pelo tri-bunal) se o seu constituinte estava em condições de prosseguir no interrogatório.

O causídico respondeu que, até onde era do seu conhecimento, não havia nada de anormal com ele, embora o conheça há pouco tempo. João da Cruz Pitra recorreu a Jorge Gaudens, tendo sido informado que ambos não falam desde que foram privados da liberdade.

Não obstante, Jorge Gaudens disse não ter conhecimento de que o seu amigo de infância tenha algum problema que o impossibilitasse de prestar declarações. Neste contexto, o juiz da causa decidiu retomar o interrogatório ao arguido. Zenu esclareceu que no momento em que foi informado da possibilidade de se conseguir tal financiamento para o país, informou ao presidente do Conselho de Administração da Mais Financial Service, S.A de que o projecto deveria ser apresentado ao Executivo, no caso ao então Titular do Poder Executivo, José Eduardo dos Santos, uma vez que o Fundo Soberano de Angola não tinha qualquer competência para o efeito.

Contou que lhe foi apresentada uma carta do banco BNP Paribas, que indicava Jorge Gaudens e Hugo Onderwater como seus representantes na intermediação desse investimento, direccionada ao antigo Presidente da República, José Eduardo dos Santos. Declarou que, em posse desse documento, solicitou, na qualidade de presidente do Fundo Soberano, uma audiência ao antigo mais alto mandatário da nação para lha fazer chegar. Isso pelo facto de que o pedido de audiências com o antigo Chefe de Estado não era um processo fácil.

Encontro de lisboa Dias depois, segundo conta, foi informado pelo então ministro das Finanças, Archer Mangueira, via telefónica, de que o Titular do Poder Executivo orientara que ambos, em companhia de Valter Filipe, fossem a Lisboa (Portugal) reunir-se com os promotores dessa iniciativa, para se inteirarem sobre o seu funcionamento. Foi nesse encontro, o primeiro de cerca de dez reuniões em que foi abordado o financiamento, que Zenu diz ter participado, integrando a equipa do Governo, em que alega ter conhecido o empresário português Hugo Onderwater .

Apesar de que o Fundo Soberano não estava envolvido nessa operação, o seu PCA alega que participava simplesmente com o propósito de auxiliar os membros da delegação angolana devido à experiência que tem em gestão de fundos. Uma vez que a instituição que dirigia geria os fundos internos, embora não tratasse de atracção de activos ou financiamentos.

A sua presença serviria para, em caso de alguma dúvida, esclarecer os representantes do Estado nessa negociação. Para fazer prova de que era convidado, o arguido retirou da pasta um convite que lhe havia sido formulado, por escrito, pelo Gabinete Presidencial para participar num encontro que decorreu na cidade alta.

Declarou que esse encontrou foi dirigido pelo Presidente José Eduardo dos Santos e que, além da delegação estrangeira que estaria envolvida no financiamento, da parte angolana estiveram também presentes Manuel Nunes Júnior (actual ministro de Estado para a Coordenação Económica), Archer Mangeuriga (então ministro das Finanças) e o assessor presidencial para a área económica. Um dos juizes assessores declarou achar bastante estranho o então Presidente da República não ter constituído uma comissão para tratar das negociações com as partes estrangeiras. O advogado António Gentil protestou descrevendo a intervenção como sendo tendenciosa e capciosa.

Um gesto que repetiu em diversas ocasiões, sempre que achou necessário. Zenu, por sua vez, respondeu que a questão deveria ser colocada ao antigo Presidente da República. “Eu fui convocado e apenas apareci. Não tenho que questionar o Titular do Poder Executivo a respeito”, frisou, sublinhando que não tinha como esclarecer as causas que o levaram a não criar tal comissão. Só José Eduardo dos Santos pode responder.