Transição de 2019 para o passado?

Transição de 2019 para o passado?

A última vez em que os serviços de inteligência angolanos surgiram citados um caso judicial (tirando o específico do general Zé Maria) foi no caso Cassule e Kamulingue. Sabemos todos no que deu. Perdão, houve outro, no dos 15 + 2, sobre quem filmou a dita reunião de leitura para o “golpe de Estado”, mas aí conseguiu-se, mais ou menos, “sair de fininho”.

Agora ressurgem, os serviços, citados numa sentença cautelar do tribunal Provincial de Luanda. Num caso de contenda económico-comercial. Ficamos a saber que estes serviços vigiam cidadãos, que se metem nas contas bancárias, etc. (a mando de quem?). Não se trata de crime, de atentado contra a segurança do Estado, nem de terrorismo, mas de “acertos de contas”. Voltámos ao passado “sombrio” dos serviços de segurança do Estado, da devassa, acusações por eles fundadas, etc..

Os angolanos passem a ter medo, os estrangeiros duvido que cá ponham dinheiro. Talvez por isso se explique que a sentença não tenha observado a premissa dos “amplos direitos” constitucionalmente consagrados.

O código diz que se pode arrestar sem se ouvir a parte visada? Ok, mas a Constituição consagra direitos ao bom nome, à defesa, ao património, etc.. Questiona-se o facto de a sentença não dizer quem foram as testemunhas que tiveram o direito de ser ouvidas (e não os visados) e nem o que disseram ou provaram; o cálculo do total em dívida reclamado não está demonstrado na sentença; a soma dos valores citados dos empréstimos menor que o somatório do arresto, havendo não proporcionalidade.

As pessoas contratantes dos créditos, empresas, foram esquecidas e a medida recaiu sobre os visados, que não assinaram em nome pessoal os contratos. Que se poderia até fazer esta ponte, mas o tribunal, se a fez, não a fundamenta na sentença.

A obrigatoriedade de fundamentação é uma conquista e uma marca da civilização. Há dias ri-me como folha ao vento ao saber de um julgamento no Cuanza-Sul por dedução de que alguém poderia estar a pensar em desviar dinheiros públicos, julguei que me estavam a contar uma anedota, mas parece que em Angola isto, afinal, é assunto sério.

Perguntar-me-ão sobre com quem falei, como me fundamento, etc., não é preocupação, se este acórdão fizer jurisprudência.