Yuri Quixina: “Não temos filosofia para implementar a agenda de reforma”

Yuri Quixina: “Não temos filosofia para implementar a agenda de reforma”

A Sonangol completou 44 anos de existência, com destaque para o processo de regeneração em curso, que visa focarse no seu core business. Qual é a sua expectativa?

Primeiro é importante dizer que isso consta do programa de privatizações do Governo, cujo desafio é privatizar até 2022, 195 empresas. Dessas, a Sonangol detém 54 activos, dos quais 11 começam a ser privatizados em Abril. Mas o processo está atrasado, porque a empresa precisa de ser relançada. E o desafio é grande, porque não tem grande experiência para viver sozinha. Já não é concessionária. E a compra de novas participações reflecte atabalhoamento no processo. Por outro lado, seria bom que essa administração tivesse tempo para trabalhar, porque já renovaram várias vezes a administração da Sonangol. Isso tem implicações no processo.

Como compreender o argumento do PCA da Sonangol sobre a aquisição de novas participações, alegando que “o momento obrigava a isso”, sendo que o processo de regeneração pressupõe desfazer-se dos negócios não nucleares?

Parece que os pressupostos da reforma para liberalizar o mercado não estão muito bem definidos. Isso atrasa o processo de reforma. Sempre defendi no programa Economia Real, que o país só tinha dois anos para fazer reforma de forma agressiva e alterar comportamentos: 2018 e 2019. Não consigo ver nos próximos dois anos o povo a aceitar medidas muito duras, do ponto de vista de reforma para alterar a cara da economia.

Continua a ideia da subida dos preços dos combustíveis, com o fim dos subsídios. A Sonangol e as Finanças ultimam detalhes. Que consequências isso poder gerar sobre a economia?

Na minha perspectiva os detalhes finais seriam persuadir o povo. O povo tem que entender as razões da retirada das subvenções e para onde vai o dinheiro. O melhor elemento para mudar a cara da economia é conversar com o povo. Não temos filosofia para implementar a agenda de reforma. O problema é que depois do último ajustamento o sistema voltou a ficar rígido. Nesse processo deve-se evitar o populismo, sob o risco de descambar.

Não tendo o mesmo poder que detinha, que exercício a Sonangol deve fazer para ganhar músculos e concorrer com as outras operadoras do mercado?

É reinventar-se e relançar-se à actividade. O maior poder de uma empresa não é controlar um nicho e ganhar dinheiro por concurso. É mexer na massa, é produzir, é alterar a filosofia do capital humano, mexer com os hábitos, cultura, princípios e amor à produtividade do objecto social do negócio. A Total, por exemplo, tem a força que tem porque tem estratégia e vive no amanhã.

E os bancos terão uma lei de garantia de crédito. O Conselho de Ministros aprovou o projecto de Lei sobre o Regime Jurídico de Garantias Mobiliárias e Registo de Garantias. Qual é sua opinião?

Um país que tem 25 bancos, não tem legislação sobre garantia na concessão de crédito…

A ausência dessa lei tem implicações no alto índice de crédito malparado?

Por um lado sim. E o banco público é líder no malparado e hoje não está a receber nenhum imóvel ou outro bem, por exemplo, que serviria de hipoteca de clientes que não pudessem pagar o crédito. São aspectos fundamentais que os investidores estrangeiros levam muito em consideração. Por isso é que estamos atrás, no Doing Business e os outros à frente.

A agenda política do MPLA para 2020 define a ‘intensificação das reformas políticas e económicas’ e a ‘mobilização do partido para os próximos desafios eleitorais como prioridades. Que avaliação faz?

Primeiro está a concretizarse aquilo que previa, de que 2020/2021 seriam anos pré-eleitorais. O período económico já acabou, porque 2018/2019 era o único período capaz de plantarmos as sementes e 2020/2021 seria a colheita. Daqui para ferente teremos o período pré-eleitoral mais longo da história da democrática de Angola. E não é só o MPLA. Estão todos a piscar o olho ao eleitor. Há um outro partido que lançou bolsas de estudo, por exemplo.

A vice-presidente do MPLA, Luísa Damião, apelou, no Namibe, para o apoio à classe empresarial. O que lhe pareceu?

A classe empresarial foi a chave para o MPLA ganhar as eleições. O MPLA é tão inteligente e sabe que não pode abrir mão à classe empresarial, porque a nossa economia é composta por empresas de militantes dos partidos, quer dum lado quer do outro. Está relançado claramente o jogo político.