Morreu o saxofonista camaronês Manu Dibango

Morreu o saxofonista camaronês Manu Dibango

O saxofonista camaronês Manu Dibango, estrela do afro jazz e inspiração de várias gerações de músicos, morreu esta Terça-feira, aos 86 anos, de Covid-19. O músico, conhecido como “Papy Groove”, que estava internado já desde a semana passada, é a primeira vítima mortal do Coronavírus no universo da música, assinalou a imprensa francófona na manhã desta Terça-feira. “Caros familiares, caros amigos, caros fãs, uma voz eleva-se ao longe…

É com profunda tristeza que vos anunciamos o desaparecimento de Manu Dibango, o nosso Papy Groove, vitimado a 24 de Março aos 86 anos, na sequência da Covid-19”, escrevem os seus familiares num post na página de Facebook do músico. O seu manager, Thierry Durepaire, disse à agência de notícias AFP que Dibango morreu num hospital na região de Paris. Mesmo os mais desconhecedores da carreira de Dibango, que explodiu internacionalmente em 1972 com o êxito do single do álbum homónimo Soul Makossa (a makossa é um género musical camaronês e a palavra significa “dança”) e se afirmou incontornavelmente em 1973 com o álbum Fricadelic, já o ouviram – quanto mais não seja no sample que Michael Jackson usou em Wanna be startin’ something (em 2009 Dibango chegou a processar o rei da pop, que admitiu ter usado o excerto nessa faixa do álbum Thriller, e chegou a acordo com o camaronês). Também inspirou Jungle boogie, o hino dos Kool and the Gang, mas era um artista em nome próprio, que criou o seu próprio estilo musical e tocou o reggae, o jazz, o afro-beat, o funk e até o psicadelismo.

Foi condecorado pelo Estado francês em 2010 com o título de Cavaleiro da Legião de Honra. Dibango nasceu na cidade portuária de Duala em 1933. O pai era funcionário público, a mãe era designer de moda e ocasionalmente também professora. Na sua autobiografia, Trois kilos de café (1989), conta que era no gramofone dos pais que ouvia a música que viria a influenciá-lo. Música camaronesa, francesa, mas também norte-americana.

O seu primeiro álbum foi o homónimo Manu Dibango, lançado em 1968, seguido por uma profusão de trabalhos como Saxy Party (1969), o importante Soul Makossa e uma sequência quase anual de nova música gravada em disco ao longo de seis décadas. Em 2013 assinou o seu último álbum, Balade en Saxo. Gravou com Eliades Ochoa, com Youssou N’Dour, Peter Gabriel, Ladysmith Black Mambazo ou Sinéad O’Connor.

Ao longo da sua carreira, Manu Dibango passou várias vezes pelos palcos portugueses angolanos . Da Festa do Avante! (1988) ao Tom de Festa, em Tondela (2002), passando pelo Lisboa Mistura (2014). Foi nessa última ocasião que disse ao PÚBLICO: “Não sou representativo de África, sou representativo de Manu.” Nessa entrevista explicou também que se interessou pela música na infância. “Comecei pelo piano, como toda a gente.” A sua primeira vez com um saxofone, instrumento de que se tornaria inseparável, foi aos 12 anos. Aos 15, foi “estudar música para Paris”.

Considerava se um produto da História, entre os seus Camarões ex-colónia francesa e os seus estudos e influências musicais colhidos em França e arredores. “Lido com a cultura ocidental e a africana desde sempre. Como colonizado, sempre tive acesso à cultura ocidental. Mas nunca deixei de tocar a música com que nasci. Só que toquei diferente, toquei o que quis.” E acrescentava, nessa conversa de há seis anos: “Não encontrei a minha personalidade imediatamente. Fui-a construindo, com a sorte de ter encontrado as pessoas certas. Primeiro aprendi música, depois pus-me a tocar todos os dias, a seguir fiz bailes com os amigos, depois chamaram-me para tocar em cabarés, e, reunida toda essa experiência, e tendo vontade de compor, compus.”

Público