Elisa Gaspar: ‘Estamos a lutar para que o médico seja visto de forma diferente’

Elisa Gaspar:  ‘Estamos a lutar para que o médico seja visto de forma diferente’

Faltam alguns dias para completar um ano à frente da Ordem dos Médicos de Angola. Já se pode começar a fazer um balanço?

Com certeza. Não quero dizer que estou aqui como a melhor, não. Apenas estou a cumprir com a agenda da minha campanha eleitoral. Um dos pontos era ter um representante em cada província, ou seja, dar posse aos presidentes dos conselhos provinciais, fazer as assembleias dos colégios de especialidades, para a eleição dos presidentes, ninguém foi indicado. Já demos posse a todos os colégios que realizaram as eleições. Alguns colégios ainda não as fizeram.

Quantos colégios existem?

Neste momento, temos 38 colégios já formados. Faltam-nos alguns. Compramos um software que está a fazer a nova base de dados, com o registo de todos os médicos. Tivemos a possibilidade de dar posse aos conselhos provinciais das 18 províncias e os presidentes dos conselhos provinciais com as suas equipas estão a trabalhar no registo de todos os médicos. Em princípio conhecem cada um dos médicos que trabalha na sua respectiva província. Portanto, são estes médicos que vão entrar na nova base de dados. Encontramos processos de indivíduos que não são médicos, mas trabalham como tal. São os que nós estamos a chamar de falsos médicos. Muitos destes, temos estado a pedir às entidades competentes para tomarem medidas.

Existem muitos casos de falsos médicos?

Sim. Estamos a trabalhar com as entidades competentes para que todo indivíduo que não é médico seja desvinculado e retirado da base de dados do Ministério da Saúde. Não vão ser responsabilizados? Só as entidades competentes devem fazê-lo. Cada presidente do colégio de especialidade já apresentou o programa curricular do curso para a formação de pós-graduação, e já foi entregue ao Ministério da Saúde, para uniformizar a formação ao nível nacional e também é uma das nossas prioridades.

Também estamos a fazer o registo dos médicos estrangeiros que trabalham em diferentes unidades hospitalares em Angola. Começamos por chamar as missões representantes destes médicos, a Antex-Angola, que representa os médicos cubanos, a ZDAVEXPORT representa os médicos russos, a missão coreana e vietnamita. A representação cubana está a trabalhar bem connosco.

A Rússia também. Agora, os vietnamitas e coreanos não sabemos se eles entenderão o objectivo da reunião, mas são médicos com contratos que já existiam antes do nosso mandato. Também encontramos alguns médicos cubanos, aqueles que são considerados os desertores, terminaram a missão e ficaram em Angola, uns casaram-se com angolanas e permaneceram em Angola, alguns não tinham os vistos de trabalho regularizados, por isso estamos a trabalhar com a entidade que regula os vistos.

Há muitos médicos cubanos que desertaram do grupo da Antex, à semelhança do que ocorreu no Brasil?

Não. No Brasil foi muita gente. Aqui são poucos. Também temos estado a trabalhar com as outras instituições por causa dos justificativos e atestados médicos falsos. São muitos atestados médicos falsos, inclusive para carta de condução. Temos a ajuda das instituições que pedem à Ordem dos Médicos de Angola a autenticidade dos atestados e justificativos médicos, as receitas médicas passadas por indivíduos não qualificados. Ex: Há dias fui a uma farmácia com uma receita médica passada pelo meu médico e a técnica que me atendeu disse: se não tiver o número da Ordem dos Médicos não vamos atender esta receita. Eu disselhe que tinha o número do médico que passou. Estes documentos falsos têm o nome e o número do médico, mas não foi passado e assinado pelo médico, outras vezes é o nome do médico, mas com um número inventado. Naturalmente, é pouco tempo, não podemos fazer tudo em 1 ano, mas estamos a trabalhar.

Está consciente de que tem um mandato de três anos?

Estou consciente de que o meu mandato é de três anos, e já se passou um. Nos dois anos restantes não vou poder implementar todos os pontos da agenda da minha campanha eleitoral, mas farei o que puder. Quando terminarmos o mandato teremos a satisfação de dizer o que fizemos.

Está há cerca de um ano à frente da Ordem dos Médicos. Tem uma percepção de como é que se olha para o médico em Angola?

Percebo que os médicos que têm estado a trabalhar connosco e votaram em nós, estão a sentir-se mais valorizados. Por exemplo, os colegas hoje dizem que não vinham à Ordem porque não tinham nada para fazer aqui. Hoje vêm porque querem fazer reuniões, palestras, discussões de casos clínicos, conferências e etc.. A dinâmica hoje é diferente, dizem: queremos estar por dentro dos assuntos para poderemos unidos participar, sinto que tenho o apoio dos colegas.

De um modo geral, como é que se vê o médico em Angola?

De uma forma geral, estamos a lutar para que o médico seja visto de uma forma diferente. Com tantos acontecimentos, de indivíduos que não são médicos, que foram mutilando e fazendo procedimentos médicos sem estarem habilitados para tal, naturalmente que os médicos estavam a ser vistos como tudo menos médicos, quando se diz “erro ao acto médico”, nem sempre é o médico que o pratica. Hoje começa a existir um pouco mais de respeito pelos médicos. Devo dizer-lhe que estamos mais atentos e vigilantes ao nível das nossas unidades hospitalares.

Quando nós estamos a pedir para que os médicos estejam bem uniformizados e identificados é para que os pacientes tenham a facilidade de perceber dentro da unidade hospitalar quem é o médico, o enfermeiro e o técnico de diagnóstico, o estafeta, o maqueiro, o recepcionista ou outros profissionais da saúde. As famílias chegam aflitas, vêm alguém de bata branca e dirigese, mas não sabe se é o médico, recepcionista ou o maqueiro. Então, é uma grande preocupação da Ordem dos Médicos de Angola.

Tem sempre aqueles oportunistas que nem sequer são profissionais da saúde mas têm luvas no bolso, um termómetro e um estetoscópio pendurado. Então, é preciso identificar quem é quem nas nossas unidades hospitalares para o paciente não sofrer. Afinal, pacientes somos todos nós. Eu tenho familiares e podem cair também numa destas burlas.

É preciso estar bem identificado para se perceber quem é quem nas unidades hospitalares. Luanda é a província do país com mais médicos. Mas no pleito em que foi eleita bastonária notouse que nem a senhora nem os seus dois adversários conseguiram muitos votos aqui.

Já compreendeu o que se passou na capital do país?

Em Luanda houve um grande número de abstenções. Primeiro, porque dado a letargia que havia
na Ordem, a maioria dos colegas diziam não vou votar porque vai ser a mesma coisa. Então houve esse descalabro aqui em Luanda, mas posso dizer que o facto de ter vencido em 15 províncias deu para entender que os colegas queriama mudança na Ordem dos Médicos de Angola.

Olha-se da mesma maneira para um médico em Luanda e outro que esteja numa outra província?

Não é bem assim. Vale lembrar que Luanda também é uma província de Angola. Embora Angola tenha 18 províncias, mas, normalmente, quando falamos em províncias não pensamos em Luanda. Devo, contudo, dizer que há bons médicos na província de Luanda como há nas outras províncias. Há médicos medíocres em Luanda, como há nas outras províncias. Temos é que procurar fazer formação contínua em todas as províncias de Angola, para que estes médicos menos experientes ganhem experiência para servir melhor a nossa população. Como é que estamos em termos de rácio população-médico? Não temos em nenhuma província um rácio médico-pacientes.

Diz, por exemplo, que em Benguela exista um médico para 10 mil habitantes. Há quem diga que existam províncias com um médico para menos habitantes?

Como disse, não temos em nenhuma província um rácio médico-paciente, por isso os colégios de especialidade da Ordem dos Médicos está a trabalhar com o Ministério da Saúde para fazer formação nas diferentes províncias com hospitais com idoneidade formativa. Alguns colegas ficam seis, sete, oito ou mais anos a fazer uma especialidade.

Se o médico está no hospital a X anos, é chefe de serviço ou da equipa do banco de urgência, que resolve todos os problemas durante as 24 horas, como é que chega a um exame e é reprovado?

Não é possível. Ou o professor não quer que o médico passe ou não querem que haja mais especialistas em Angola. Vamos acabar com esta situação para que haja programa de formação médica ou de especialidade igual em todas as províncias.

Falou de um registo em curso na Ordem dos Médicos. Quantos médicos existem neste momento no país?

Neste momento, estamos (12.531 mil) com doze mil quinhentos e trinta e um médicos.

Já se retirou os falsos médicos?

Como lhe disse, com o novo software só entra para a base de dados o médico que apresenta os requisitos exigidos pela Ordem. Há médicos que não têm o diploma no arquivo físico da Ordem. Logo, este não é médico. Vamos dar o benefício da dúvida, pedir ao indivíduo que traga o diploma, mas se não trouxer então não é médico. Esse não entra mesmo para a nova base de dados. Depois o verdadeiro médico vai ter acesso à base de dados onde ele estiver. Neste momento, cancelamos a emissão das cédulas, porque os falsos médicos têm cédulas.

Concorda com as estimativas de que Angola precisa de 30 mil médicos?

Sim, concordamos. Quanto mais médicos tivermos vai ser melhor para a nossa população e distribuirmos conforme as necessidades de cada província.

A quota que recebeu para o presente ano satisfaz a Ordem?

É necessário que todos os anos haja concurso público, porque também não é possível fazer um concurso onde se inclua todos os profissionais.

As quotas para as províncias contaram com o concurso da Ordem?

Não, porque ainda não tínhamos os colégios formados. Só depois de termos concluído as eleições dos presidentes dos colégios de especialidades e o auto de posse dos mesmos, começamos a trabalhar com o Ministério da Saúde.

Concordam com as quotas estabelecidas?

Concordando ou não, são os médicos que temos nesse momento.

Qual é a visão da Ordem dos Médicos sobre as cifras?

Luanda não é igual ao Bengo, Cabinda ou Benguela. São províncias diferentes. Então, é preciso que se racionalize para que todos recebam um número possível de médicos.

Quando se olha para o número de médicos em Luanda pensa-se logo na remuneração, as condições de trabalho e algumas condições que o Estado e privados oferecem. Quais são as condições colocadas à disposição dos médicos que vão trabalhar no interior do país?

A Ordem dos Médicos de Angola está a trabalhar com o Ministério da Saúde para a melhoria das condições de trabalho e outras condições para os profissionais, há questões que depende única e exclusivamente do Executivo e outras do privado, Quero aqui fazer lembrar que a Ordem dos Médicos não paga os salários dos médicos. Somos pagos pelo Executivo Angolano através do Ministério da Saúde; eu fui eleita Bastonária da Ordem dos Médicos de Angola, mas sou funcionária pública do Ministério da Saúde em comissão de serviço na Ordem dos Médicos.

Mas dentro destes interesses, a Ordem dos Médicos pode sugerir ou discordar de algo?

Pode sim. A Ordem dos Médicos de Angola é parceira do Estado, a Ordem dos Médicos de Angola regula o exercício da medicina em Angola, somos uma franja da sociedade muito importante com uma missão humanitária. O médico acompanha o desenvolvimento da ciência médica, tem que estar actualizado permanentemente com vista a servir e cuidar melhor dos pacientes.

O que gostaria que fosse oferecido aos médicos? Subsídios de periferia. Para que ficassem mais cómodos na periferia.

O que isso quer dizer? Se eu aqui no centro da cidade ganho 20 mil Kwanzas, o colega na periferia deve ganhar 30 mil Kwanzas. Tem 10 mil de periferia. Porque ele está na periferia privado do convívio com a sua família, do seu lar, dos amigos e etc..

Quanto é que ganha hoje um médico?

Depende da categoria do médico.

O que aufere hoje um médico de base e um do topo? Se a bastonária for trabalhar, por exemplo, em Londuimbali, o que vai encontrar?

Com certeza que o que aufere hoje um médico não é compatível com o custo de vida. Não sei o que vou encontra em Londuimbali, mas gostaria de encontrar as mínimas condições: uma habitação com água e luz, comércio, Bancos e centros de lazer, cinema etc.. Mas não é só para os médicos, porque as condições têm que ser dadas aos profissionais angolanos de todas as áreas, embora estejamos a falar do médico.

Andou pelo interior nos últimos tempos, quais são as condições que encontrou?

Em algumas províncias nos municípios encontrei casas com as mínimas condições, algumas médicas ainda tinham o carro que o MINSA atribuiu, outras ficaram sem o carro, porque o director da Saúde e seus familiares utilizaram e danificaram os carros em acidentes, algumas condições de trabalho, alguns fármacos e equipamentos. Houve hospitais em que havia equipamentos que os técnicos não sabiam como é o seu funcionamento, encontrei algumas incubadoras, mas as colegas não sabiam como pôr a funcionar e, por esta razão, não utilizavam. Na altura, dei uma aulazinha às colegas. Há pouco tempo teríamos uma greve de médicos convocada pelo sindicato…

A Ordem dos Médicos de Angola rege-se por Princípios Fundamentais e Fins, na defesa dos legítimos interesses dos médicos no exercício de uma medicina Humanizada que respeite o direito à saúde de todos os cidadãos, a Ordem dos Médicos de Angola exerce a sua acção com total independência em relação a formações políticas, confissões religiosas ou outras organizações. O sistema democrático regula e organiza a vida interna da Ordem dos Médicos.

Exercício de uma medicina Humanizada qua saúde de todos cidadãos…como classifica a relação entre a Ordem e o Sindicato dos Médicos?

É uma relação cordial. Temos contacto permanente com o secretário-geral, o Dr. Pedro da Rosa, sempre que necessário discutimos questões do interesse da nossa classe.

Assistimos uma pequena polémica em relação aos enfermeiros. Mantém a ideia de que eles devem trabalhar com uma bata diferente da dos médicos?

Em qualquer parte do mundo, a identificação por classe ou especialidade difere. Vá à uma das clinicas e verá que as batas são diferentes. Antigamente, nós os médicos angolanos, as nossas batas eram fechadas com botões atrás e um cinto na barriga que amarrávamos atrás e dois bolsos à frente. Os enfermeiros era camisa aberta à frente e calça, as enfermeiras era blusa aberta à frente, saias e mítica figura do peque (o famoso chapéu da enfermeira). Quando chegávamos ao hospital sabíamos quem era o médico e quem eram os outros profissionais da saúde, nós os profissionais da saúde devemos ajudar a população e não confundi-la por interesses pessoais.

Foi mal interpretada?

Naturalmente, que nem todos ficaram satisfeitos com o facto de eu ter ganho as eleições da Ordem declaradas livres e justas pelo presidente da comissão eleitoral da Ordem dos Médicos de Angola. Eu estava numa sala supostamente com médicos, porque era uma actividade médica, eles puseram as suas preocupações e fui fazendo esclarecimentos, recomendações. Agora, as pessoas de má-fé, manipuladoras gravaram, editaram e puseram a circular nas redes sociais. Mas o que eu disse, não havia nada que não fosse verdade: médico é médico e enfermeiro é enfermeiro, como em qualquer parte do mundo.

O médico faz licenciatura em medicina em seis anos e depois não pensa em fazer licenciatura em enfermagem, o contraio sim. Fazemos equipas de trabalho com outros profissionais da saúde, mas o médico é o chefe da equipa, a prescrição é medica, o atestado é medico, boletim de óbito é de responsabilidade médica, o erro é médico mesmo cometido por outros profissionais.

O acto é médico e etc.. O médico estuda a farmacologia como ciência, e é uma das grandes assombrações da Faculdade de Medicina, as propriedades físicas e químicas, os efeitos bioquímicos e fisiológicos, o mecanismo de acção, a absorção e etc.

O facto de Angola ser um país com poucos médicos e os enfermeiros fazerem este papel contribuiu para a celeuma?

Temos que entender que por exemplo: se ontem havia 10 médicos, hoje há 100 médicos. Por isso, fiquei à vontade para falar, porque em quase todos os municípios por onde passei encontrei médicos. Pode ser um ou dois, mas tem médico. Outros profissionais da saúde não estão habilitados para exercer medicina. Eu falei à vontade porque passei por quase todos os municípios na campanha eleitoral, na sua maior tem médicos.

Depois desta polémica, esteve com os responsáveis da Ordem dos Enfermeiros?

Eu estive com o presidente da Ordem dos Enfermeiros no mês de Setembro de 2019, fizemos um mês de programas na Luanda Antena Comercial (LAC). Aproveitei para conhecê-lo.

Tem havido muitos erros médicos?

O que está legislado é o erro médico, a equipa de trabalho é médica ainda que o erro seja de um outro profissional não médico. Quando se diz é sempre erro médico, mas quando se faz a investigação apura-se o culpado e é responsabilizado o culpado.

Não há casos de médicos também?

Desde que estou na presidência da Ordem dos Médicos, os casos que recebi, na sua maioria, depois de serem apurados, eram erros de profissionais da saúde mas não médicos.

No início da conversa falou dos médicos cubanos, coreanos, russos e vietnamitas. Como é que estamos em relação aos médicos supostamente formados na República Democrática do Congo e que já existem num número significativo?
Quanto aos médicos formados na RDC, há uns que realmente têm os documentos verdadeiros, mas uns o nome que consta no diploma não é o mesmo do bilhete de identidade. Outros o país de nascença que está no diploma não é o mesmo do bilhete de identidade. Há uns que o nome da mãe que consta do diploma não é o mesmo do bilhete de identidade.

Então, para nós, que somos leigos, não pode ser a mesma pessoa. Até provarem o contrário são falsos. Portanto, não somos nós que dá creditação aos diplomas. Temos entidades que o fazem. Por outro lado, muitos destes diplomas têm rasuras.

Estamos em 2020. Já passamos os dois primeiros meses, mas ainda assim não estaríamos errados se lhe disséssemos que teve um bom ano de 2019?

Sim é verdade tive muitas coisas em 2019.

Venceu na Ordem dos Médicos?

Sim venci e agradeço a confiança dos colegas que votaram em mim.

Finalmente, conseguiu abrir o Banco de Leite Humano. Era um sonho antigo?

Sim, outra vitoria bem merecida para todos os angolaninhos (bebés) … um sonho de 27 anos.

Angola já começa a reconhecer o serviço que tem prestado? Não sei. Reconhecer em que sentido?

O Brasil reconheceu o trabalho que fez sobre a malária congénita. E sabe-se que esperava que no nosso país de origem também tivesse o mesmo reconhecimento ou não?

Sim, é sempre uma grande honra receber o reconhecimento no nosso pais. Tudo que faço é pensando em Angola, no bem-estar do meus irmãos angolanos, cada um de nós deve fazer alguma coisa de relevante na sua área profissional para que daqui por alguns anos Angola esteja melhor.

Continua a aguardar por este reconhecimento?

Sim, com certeza.

A esperança é sempre a última a morrer… O que representou a abertura do Banco de Leite Humano? Risos… Há coisas que sentimos, mas não conseguimos explicar. Foi uma vitória tão grande, que não é somente minha. É de todos aqueles que contribuíram para a abertura do Banco de Leite Humano.

Quando olha para a estrutura já acredita que está mesmo aberto o Banco de Leite Humano?
Abriu! Abriu! Abriu mesmo! Já estamos a pasteurizar Leite Humano e a oferecer ao público-alvo. Ainda temos poucas dadoras de Leite Humano, mas estamos a trabalhar, é um processo. O Banco de Leite é composto por material doado, desde o leite, o frasco, a máquina que pasteuriza, a máquina para o controlo de qualidade, a caixa térmica a arcas e etc.. Doações de pessoas que acreditaram e queriam que este Banco de Leite Humano abrisse, porque tiveram logo de início consciência de que esse banco era necessário para Angola.

É uma satisfação muito grande, para mim como mentora e coordenadora do projecto. Está aberto e é uma grande realização para nós angolanos.

Quais são os passos que se seguem?

Em relação ao Banco de Leite Humano pretendemos conseguir mais dadoras e implementar os postos de colheita de leite humano no Hospital Ngangula, Hospital Geral de Luanda, Kilamba Kiaxi e no Hospital Geral dos Cajueiros. São hospitais que têm maternidades. Nós formamos técnicas destas unidades e elas farão o trabalho da recolha de leite. Como pessoa, quero ter saúde, estar bem para continuar a trabalhar para a rede de Bancos de Leite Humano em Angola.

Pretendemos expandir o banco para todas as províncias, conseguir montar a rede de bancos de leite humano de Angola, porque nós estamos inseridos na rede global dos bancos de leite humano, estamos na rede da CPLP, então é necessário criarmos também a rede angolana.

A médica que foi presa em Benguela por quebra do sigilo profissional…

A Ordem dos Médicos de Angola tão logo tomou conhecimento do ocorrido fez todas a diligências a favor da referida médica, orientamos o presidente do conselho provincial da Ordem dos Médicos em Benguela a interagir com outros parceiros e apurarem os factos a fim de se poder entender o que realmente aconteceu. O código de Deontologia e Ética Médica é um instrumento jurídico-legal que estabelece princípios e regras a serem observados por todos os médicos no exercício da sua profissão.

A responsabilização dos médicos por infracção à Deontologia e Ética Médica é da competência exclusiva da Ordem dos Médicos de Angola. Quando a violação se verifica em relação a médicos que exerçam a profissão vinculados a entidades privadas ou cooperativas, devem estas entidades limitar-se a comunicar as presumíveis infracções à Ordem dos Médicos de Angola. Caso estas infracções estejam incluídas na competência legal destas entidades, as referidas competências devem ser exercidas separadamente.

Durante algum tempo falou-se muito na humanização da saúde. Tem sido possível? Eu costumo dizer que a humanização não é somente para os profissionais da saúde, a humanização é para todo o mundo. Se o cidadão não estiver humanizado terá atitudes e comportamentos não bons. Se o médico está exausto por ter atendido 50 pacientes e não pode atender mais, o paciente diz logo que o médico não está humanizado.

Tem a consciência de que o médico é visto como a parte principal?
Sempre. Quando se fala em humanização olha-se sempre para o médico. Diz-se que não é humanizado, porque não atendeu bem. Na verdade, não é possível um médico por dia ver mais de 50 pacientes. O médico é um ser humano e também fica cansado, fica doente tem fome e sede, tem necessidades fisiológicas.

Há algum tempo que o Ministério da Saúde exarou um despacho que obriga que as clínicas prestem os primeiros socorros a todos os pacientes, independentemente de terem ou não condição financeira. Os médicos estão sensibilizados para esta situação?

Como humana que sou, penso que qualquer um de nós, estando numa clínica, num hospital público, a primeira coisa é pensar no ser humano e o amor ao próximo. Devemos prestar os primeiros socorros a quem quer que seja.

Quanto é que uma clínica perde ao prestar os primeiros socorros a um paciente?

A vida não tem preço. Por amor ao próximo sempre que chega ao banco de urgência, um paciente, seja por que razão, devemos atendê-lo, estabilizá-lo e, depois, se não tiver condição financeira enviá-lo para um hospital público.

‘Cada um de nós tem a responsabilidade de informar aos menos esclarecidos sobre o COVId-19’

Como é que está a acompanhar a progressão do coronavírus?

É uma doença altamente contagiosa e semelhante à gripe vulgar, manifesta-se com febres altas, tosse, dificuldade respiratória. A transmissão pode acontecer por contacto próximo
‘Cada um de nós tem a responsabilidade de informar aos menos esclarecidos sobre o COVId-19’
com pessoas infectadas e por via de contágio através do espiro, tosse e contacto com as mãos de pessoas contaminadas e utensílios ou superfícies contaminadas.

O que é que se recomenda para uma situação como a que vivemos?

O Ministério da Saúde recomenda contactar o nº 111, em caso de suspeita, lavar as mãos com água e sabão ou desinfectar com álcool gel, cobrir a boca e o nariz ao tossir e ou espirar com o braço dobrado ou um lenço descartável, evitar aglomerações e ambientes fechados, não partilhar os objectos de uso pessoal,como toalhas, pratos, copos, ou garrafas. Se apresentar manifestações, procurar o serviço de saúde mais próximo e evitar o contacto com animais domésticos e selvagens.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) orienta a manutenção da amamentação por falta de elementos que comprovem que o leite materno possa disseminar o coronavírus, até ao momento desta publicação. A amamentação seja mantida em caso de infecção pelo COVID-19, desde que a mãe deseje amamentar e esteja em condições clínicas adequadas para fazê-lo; a mãe infectada seja orientada para observar as medidas apresentadas a seguir, com o propósito de reduzir o risco de transmissão do vírus através de gotículas respiratórias durante o contacto com a criança, incluindo a amamentação.

Quais são os passos para uma mãe que esteja com coronavírus?

Lavar as mãos por pelo menos 20 segundos antes de tocar o bebé ou antes de retirar o leite materno (extracção manual ou na bomba extractora), usar máscara facial (cobrindo completamente nariz e boca) durante as mamadas e evitar falar ou tossir durante a amamentação, a máscara deve ser imediatamente trocada em caso de tosse ou espirro ou a cada nova mamada.

Em caso de opção pela extracção do leite, devem ser observadas as orientações disponíveis nas cartilhas do Ministério da Saúde: seguir rigorosamente as recomendações para limpeza das bombas de extracção do leite após cada uso; deve-se considerar a possibilidade de solicitar a ajuda de alguém que esteja saudável para oferecer o leite materno em copinho, xícara ou colher ao bebé. É necessário que a pessoa que vá oferecer ao bebé aprenda a fazer isso com a ajuda de um profissional da saúde.

Como está a Ordem perante esta realidade que é o coronavírus?

A Ordem dos Médicos através dos seus colégios de especialidade e outros profissionais da saúde em Angola tudo fazem para que se cumpram com as medidas de prevenção e biossegurança contra a Pandemia do Covid-19, começamos logo a fazer formação aos profissionais, palestras em várias instituições públicas e privadas, nas escolas, colégios, creches na comunidade até a suspensão das aulas. Penso que cada um de nós tem essa responsabilidade de informar os menos esclarecidos sobre a Covid-19.