Agora “eu são chefe!”

Agora “eu são chefe!”

Na verdade, eu queria escrever sobre “a coutada do outro”, mas pensei bem e vi que iria inverter as coisas entre animais e donos, quem é quem… então deixemos animais e coutadas e donos de lado olhemos para o estado de emergência na Huíla. Há muitos anos, no Cuito, Bié, a cidade tinha quatro pontos de encontro e era onde a “alta sociedade” se distinguia: Uma piscina no rio Cuito chamada Badobá, o cineteatro, o pavilhão gimnodesportivo e o campo pelado de futebol do Vitória. A discoteca era coisa para “bandidos” e os bares Faria ou do Hotel Girão eram para forasteiros e para gente sem vergonha. Mulher lá era mal vista. Havia códigos próprios de uma sociedade que se mantinha organizada, culta e com a cidade limpa, algo avessa a “estrangeiros”. Apesar de o melhor bolo do mundo e com nome estrangeiro ser de lá, o bolo inglês. Um soldado ido de um sítio qualquer desta Angola, levado pela guerra, tentou duas ou três vezes, a civil, nas suas folgas, entrar no pavilhão, não tinha dinheiro, nem havia lugares, meninas bonitas jogavam basquetebol, meninas de toda a Angola. Mas ele via alguns a entrar, passando por todos, os “não-me-toques”. Passavam porque eram tratados por chefe, tinham algum poder. Até calçavam sapatilhas Adidas. Um dia o soldado foi escalado para a portaria do pavilhão, ao lado de polícias, que eram pouco respeitados e dos funcionários do local que ninguém respeitava. E o soldado, mal viu chegar alguns “não-me-toques”, sentenciou alto e a bom som, com a arma do poder na mão: “se tem briete passa, se num tê, nô entra, aqui hoje eu são chefe!” Na Huíla há alguém que também “são chefe” hoje. Inventou o seu estado de sítio particular, gasta dinheiro a imprimir credenciais e passes, impede médicos advogados, bancários, jornalistas de irem fazer o seu trabalho. Doente não pode ir à consulta, mulher com um “barrigão” não passa, tem de ter credencial do Governo. Ontem foi um chorrilho de reclamações e queixas. Ena, se calhar não faz mal nenhum pensar em coutada… já agora…