A máscara e o amor

A máscara e o amor

Há dias li algures um texto sobre empresas que se preparam para lançar máscaras fashion, achei curioso, mas ocorreume logo que se tivesse capital investiria de imediato na criação de um tecido completamente transparente, tipo vidro. Salvaria a indústria do baton, por exemplo. Dias depois passei por um supermercado e… bem, nada mais lindo do que o corpo de uma mulher bem definido, pernas tipo made in Lobito e encimadas por um tchuna baby displicentemente rasgado. Mas ela usava uma máscara, penso que só a reconheceria se a voltasse a encontrar no mesmo local e com a mesma roupa. Isto das máscaras vai tornar as coisas muito complicadas. Os homens, na sua missão conquistadora neste mundo, já passaram por muita coisa, já houve tempo do casamento por encomenda e sem conhecer a dama, alguns devem ter tido grandes surpresas; já houve o namoro distanciado, sem toques (afinal o distanciamento físico actual tem parente antigo) e chegou-se depois ao grande triunfo do toque na mão. Um marco que permitiu tudo o resto que se seguiu, até mesmo contactos em que no dia seguinte já não se reconhecia o rosto da outra parte. Mas agora… Bem, há que reaprender, a galantear, a conversar, a avançar passo a passo, devagar, com cuidado (o vírus espreita e é perigoso). O tempo voltou para trás, rigorosamente, a confiança volta a ser um requisito. E então, antes que chegue a vacina, o homem estará num supermercado, como eu, olhará para aquele corpo que acaba com tudo o que vira antes, “scaneará” cada milímetro do ventre liso, das pernas eternas, das pontas das mamas mal cobertas por uma blusa provocadora de alças e estreitas como fio de linha, mas o momento do triunfo, o clímax, será quando ele puder dizer, alto para fora ou para o coração: “consegui que ela tirasse a máscara e sorrisse”. Imagino o meu avô Filipe a tocar a mão da minha avó Ermelinda pela primeira vez… a grande emoção… e o amor voltará a ter valor… mas eu, bem, olhei, não lhe falei e o supermercado não é o nosso ponto de encontros ocasionais.