Vulnerabilidade das famílias pode travar acções da Polícia para fazer cumprir o isolamento social

Vulnerabilidade das famílias pode travar acções da Polícia para fazer cumprir o isolamento social

Para tornar possíveis as novas medidas ditadas pelo estado de emergência, o comissário-geral Paulo de Almeida orientou a corporação a actuar em bloco de quatro a seis agentes da Polícia que “energicamente” vão expulsar, recolher e deter por desobediência qualquer cidadão que circular na rua sem justificação. No documento a que OPAÍS teve acesso, o comissário-geral orienta para que as cidades se mantenham mortas a partir das 18 horas e que se garanta a observância do silêncio total nas vias públicas e em toda a sua extensão.

Esta medida da Polícia Nacional surge em resposta a afluência de cidadãos na via pública, particularmente nesate terceiro pe
ríodo do estado de emergência, em que se decretou um abrandamento nas medidas restritivas. A corporação vai encerrar todos os mercados que por negligência não observam as medidas de biossegurança e de distanciamento social, bem como prevê dispersar e deter os cidadãos que se encontrarem no seu interior sem o uso de máscara protectora e mostrarem resistência. O documento orienta os agentes a deterem também todos quantos estiverem dentro de viaturas sem o uso das máscaras.

As viaturas cujos proprietários circulem sem declarações passadas pelas entidades empregadoras, no período compreendido entrem as 5h e as 16h, serão também alvos de apreensão. Por outro lado, orienta que a Polícia advirta que não vai tolerar o desacato às ordens de regresso ao domicílio, assim como não deve permitir, de igual modo, o excesso de lotação nas viaturas. Paulo de Almeida determina que deve haver recolhimento compulsivo de cidadãos, nomeadamente os vadios, mendigos e os que praticarem a venda ambulante desordenada em passeios e pedonais.

“É falsa a ideia de que pouca gente vive na vulnerabilidade”

Para o sociólogo Carlos Conceição, as medidas poderão não resultar da forma que se pretende, pelo facto de a necessidade de sobrevivência falar mais alto do que o alerta das autoridades para o confinamento social. Carlos Conceição lembra que a maioria da população do país, em particular de Luanda, vive na informalidade e depende de pequenas actividades comerciais diárias para continuar a sua sobrevivência.

O sociólogo diz que nas duas primeiras fases do estado de emergência, o Executivo mostrou que não tem capacidade de criar medidas de providência para atribuir cestas básicas regularmente a todas as famílias vulneráveis. Defende que os vulneráveis constituem cerca de 80% da população angolana e que é falsa a ideia de que este número é menor. Por esta razão, tendo em conta o agudizar da situação por causa da Covid-19, Carlos Conceição entende que a decisão da Polícia poderá não lograr êxitos.

“Penso que as populações vão preferir ser detidas pelas autoridades a ficarem confinadas em casa e morrer de fome”, frisou. Acrescentou de seguida que “é preciso perceber que temos famílias com um número extenso no agregado e que se o pai ou mãe não sairem de casa todos os dias não comem”. Sustentou que as medidas punitivas não serão suficientes para manter as pessoas em casa, pelo facto destas não terem capacidade de fazer reservas de alimentos para se sustentarem vários dias.