Kitabanga pede que se denuncie ‘mercado negro’ de carne de tartaruga

Kitabanga pede que se denuncie ‘mercado negro’ de carne de tartaruga

Apesar de a Lei Ambiental em Angola colocar a tartaruga marinha na lista dos animais que carecem de protecção, por estar em vias de extinção, a caça e comercialização da carne de tartaruga, bem como o consumo do ovo ainda são uma realidade no nosso país. 

Sabe-se que Angola aderiu à Convenção sobre o Comércio Internacional de Espécies da Fauna e Flora Selvagem (CITES) ameaçadas de extinção, que impõe a proibição do abate de espécies em extinção em território nacional. Entretanto, em algumas regiões do país ainda há registo da caça de tartaruga, apesar dos apelos. 

Em entrevista ao jornal OPAÍS, Michel Morais, o fundador e coordenador do Projecto Kitabanga, um projecto que há 17 anos protege as tartarugas ao longo de toda a costa do país, disse que nas praias menos controladas ainda há mortalidade de tartarugas, sendo que as redes de pesca continuam a ser o grande problema. 

“Nas zonas de desembarque ainda acontece o desembarque destes animais, tanto é que a Polícia também tem estado no encalço disto. Como disse, é um “mercado negro” e se houverem pontos de venda deste tipo de carne, é importante que sejam denunciados para os desmanchar”, defende. 

Acredita que existem rumores de venda de tartaruga, de cidadãos chineses que compram, que, de certa forma, são verdade, mas é de opinião que haja denúncia e que as autoridades têm que autuar imediatamente e com alguma regularidade.  

O entrevistado recordou que a Praia das Palmeirinhas é um local em que na década de 1990, todos os anos, na altura da desova, havia grupos grandes a capturar toneladas de tartarugas e a carne era vendida no extinto mercado do Roque Santeiro. Hoje, nas Palmeirinhas isso não acontece, segundo Michel. 

“Não pode ser só o Projecto Kitabanga a olhar para isto”, disse, a costa é grande e a sociedade civil tem também um papel importante na protecção das tartarugas. “Se houver uma denúncia, obviamente que o Kitabanga toma as providências, e o Ministério do Ambiente e a Polícia vão autuar, porque é crime”, sublinhou.  

Questões culturais para justificar o consumo “não colhem” 

Quanto ao facto de algumas pessoas colocarem em frente as questões culturais para justificar o abate, venda e consumo de carne de tartaruga, Michel Morais diz que a grande pressão que temos ao longo da costa é, historicamente, de população que nunca viveu no litoral, que nos últimos 30 anos migrou para esta zona, por causa da guerra e tudo mais. 

A população que culturalmente tinha ligação com o mar não fazia tanta pressão sobre as tartarugas. Não era uma pressão que pudesse ser significativa. Então, “eu não posso colaborar com a ideia de que o consumo é por questões culturais ou porque sempre fizeram. Está-se a fazer desde há 20 ou 30 anos, em Angola. Agora, a nível do mundo, há pontos que não é só para o consumo, mas também por venerarem as tartarugas como animais afrodisíacos, etc.”, disse. 

Michel acrescentou ainda que temos de saber como gerir o nosso património, pois, se temos um património ameaçado, como é o caso das tartarugas, cabe-nos protegê-lo. Não devemos permitir o consumo, sob pena de vir a ser extinto, por ser um recurso frágil. Da mesma forma que não podemos comer a Palanca Negra Gigante, por ser património nacional, devemos proteger as outras espécies em via de extinção. 

“E mais: dentro daquelas que são as aldeias que encontramos ao longo da costa, não é toda a aldeia que tem pressão sobre as tartarugas, são três ou quatro indivíduos que assim procedem e que estão devidamente identificados. Nós temos indivíduos nas comunidades que têm as tartarugas como uma fonte de negócio”, reforçou.