Os Estados Vs. COVID 19

Os Estados Vs. COVID 19

Esta semana ocorreu-me reler cinco grandes autores, cada um na sua dimensão e perspectiva de análise dos fenómenos sociais, designadamente Alvin Toffler, Pepetela, Cristina Pecequilo, Gedeon Rachman, e Parag Khanna, mas que acabam, na minha opinião, concordar com Sir Harold Nicholson, que a humanidade só irá progredir sistematicamente tanto quanto progredir psicologicamente.

Essa progressão esbarra perante o fenómeno chamado confinamento social derivado da pandemia da Covid-19 que veio desmistificar o chamado jogo de soma zero, pressupondo que numa contenda deve haver sempre vencedores e perdedores, porquanto o Estado de Natureza se define como cenário de guerra de todos contra todos, onde os homens disputam, visando o seu espaço e interesses gerando uma situação de guerra permanente; e cada Estado, como cada ser humano, visa a sua sobrevivência, autonomia e interesse, em busca do poder, segurança, glória e prestígio.

Prestígio que hoje passa por uma interacção entre vários sujeitos das relações internacionais, assente em padrões de cooperação e na interdependência como oportunidade para aprender com as experiências de cada Estado e região, com vista a mitigar os efeitos devastadores desta pandemia, pondo de parte a conduta condição anárquica da política internacional, pois, o relativo abrandamento da chamada anarquia na relação entre Estados, que se observa no esforço conjugado para fazer frente ao chamado inimigo invisível, não pressupõe necessariamente que o realismo, essencialmente conservador, empírico, prudente, e desconfiado, abdicará facilmente da sua visão de soma zero.

É bem verdade que a Covid-19 está a afectar as economias dos Estados, o que advoga que o mundo continuará a enfrentar as dificuldades previstas por Gedeon Rachman, quanto às fontes do pensamento de soma zero no sistema internacional. Ou seja, os realistas continuarão a conceber o poder como o conceito fundamental em ciências sociais e será mantida a segurança nacional como a mais importante e imediata necessidade do Estado, tal como a necessidade das forças de defesa e segurança e da balança de poderes para apoiar as políticas endógenas e a diplomacia.

Em suma, a Covid-19 terá sido quase um fim do mundo, esteve mesmo muito perto de o ser em absoluto, a extinção total da raça humana, se e é que o fim do mundo quer dizer o aniquilamento absoluto da humanidade – pois, haverá algum exagero na afirmação, segundo Pepetela.

O mundo não terminou, isso sim, e as liberdades e direitos consignados nas constituições dos Estados também prevalecem, mas foram em algum momento “estremecidos” e quase deitando por terra a visão universalista do homem e do género humano, que os homens são pré-existentes aos Estados, que detêm e conservam direitos e prorrogativas, que nenhum poder político instituído, nem mesmo aquele a que estão sujeitos, pode-lhes retirar; mas a covid-19 confirmou que não é bem assim – e o debate continua. Quanto aos beijos e abraços, temos que ter paciência, em tempo oportuno, a natureza ditará novas regras de convivência, porquanto não é a espécie mais forte que sobrevive, mas sim, a mais inteligente, a que gere melhor as mudanças e estiver preparado para lidar com a situação.

Até porque o choque do futuro, na perspectiva de Alvin Toffler não será encontrado no índex medicus, nem em qualquer lista de anomalias psicológicas. A não ser que medidas inteligentes sejam tomadas para combatê-lo, porquanto milhões de seres humanos serão cada vez mais desorientados, progressivamente incapazes de lidar racionalmente com o seu meio ambiente.

Mas, até lá, com certeza que o mundo não será aniquilado, pois segundo nos ensina o nosso grande Pepetela, o fim do mundo não é tema que se trate com ligeireza, apesar de ter entrado em todas as línguas desde aquele primeiro dilúvio que tornou famoso Noé e sua arca.

Vamos sim cuidar da nossa arca, não obstante o mal-estar, a neurose colectiva, a irracionalidade e a violência desenfreada, bem como a descriminação que já se observam no dia a dia, como sinais de alerta do que pode estar a nossa espera num próximo futuro se não os Estados não conjugarem esforços que visam encontrar antídotos para combater a Covid-19.

Alberto Kizua