“Não basta apenas reduzir institutos, é preciso reformar os serviços públicos”, alertam especialistas

“Não basta apenas reduzir institutos, é preciso reformar os serviços públicos”, alertam especialistas

A boa nova do Executivo, tornada pública ontem, que tem a ver com a redução do número de institutos públicos que, doravante, passam de 144 para 102 unidades, mereceu as palmas de vários segmentos da sociedade civil, que encaram na medida uma postura acertada do Estado, sobretudo no actual contexto de dificuldades económicas.

Se, por um lado, aplaudem a iniciativa, por outro, defendem que ela deve ser acompanhada de uma acentuada reforma dos serviços públicos prestados aos cidadãos.

Para o director do Observatório Eleitoral Angolano, Luís Jimbo, é preciso entender que não será só pela diminuição de institutos que se vai melhorar a eficiência e a eficácia dos serviços prestados pela administração pública.

É necessário, no seu entender, que esta diminuição, que vai evitar o gasto de acima dos 4 mil milhões de Kwanzas, seja acompanhada também de uma reforma para simplificação e modernização dos procedimentos da administração pública, contextualizada na realidade social.

Para o especialista, a reforma deve conter medidas concretas que visem a moralização dos agentes e servidores públicos e incentivação na participação directa dos cidadãos na gestão da coisa publica, principalmente ao nível das aldeias, comunas e municípios.

“Por exemplo, o comportamento social e moral dos servidores públicos deve estar alinhado na expectativa de promover mais confiança e aproximação com os governados”, defendeu.

De acordo com Luís Jimbo, actualmente, os serviços públicos prestados pelos diferentes institutos públicos ainda são bastante ineficientes, criando embaraços aos cidadãos, pelo que aponta a necessidade de mudanças com a diminuição do número de institutos públicos.

Em muitas situações, frisou, os cidadãos são colocados em posição de pedintes perante os servidores públicos para que se resolvam questões ligadas ao acesso aos seus direitos e liberdades fundamentais e suas necessidades humanas primárias.

“Esperamos que a Reforma do Estado na administração pública venha a atingir essa mudança de paradigma com maior impacto nos agentes e servidores dos sectores essências como nos hospitais, nas escolas, das águas, da energia e dos serviços de justiça e da ordem pública”, referiu.

Redução não pressupõe alcance automático na vida dos cidadãos

Por seu lado, Carlos Cambuta, director- geral da Acção para o Desenvolvimento Rural e Ambiente (ADRA), disse que a redução de institutos públicos de 144 para 102 não pressupõe automaticamente o alcance de benefícios na vida dos cidadãos e no exercício do poder executivo/governativo. Para ele, a redução pressupõe desafio aos institutos de adoptarem as boas práticas de gestão pública, visando a satisfação dos direitos dos cidadãos.

De acordo com Carlos Cambuta, para a prossecução dos objectivos que justificam a existência de cada um dos actuais 102 institutos, as equipas terão de ser mais disciplinadas no cumprimento das suas responsabilidades, incluindo até a pontualidade e assiduidade no local de trabalho. Outrossim, explicou, as equipas terão de ser mais profissionalizantes, com cada quadro a fazer aquilo que sabe fazer, e com isso tornar-se mais profissional.

Ainda segundo o activista, a maior preocupação para com a diminuição de sectores ou institutos públicos não deveria focar-se no ganho financeiro, mas na eficiência e eficácia do funcionamento destes, sempre na lógica da satisfação dos direitos dos cidadãos.

“A crise económica e social imposta pela pandemia da Covid-19 está a despertar o Executivo Angolano na tomada de medidas de gestão pública que concorrem sobretudo para a racionalização de recursos. Este é o “lado positivo da crise”, embora entenda ser possível tomar medida como esta num ambiente económico e social de normalidade”, frisou.

Medida acertada

Já o coordenador do Observatório Político Social de Angola (OPSA), Sérgio Calundungo, disse ser sempre bem-vindo todo o esforço no sentido de reduzir o peso da máquina administrativa do Estado, uma vez que não se justifica a existência de um número tão elevado de institutos públicos e instituições em geral.

“Estou de acordo que se faça esta e outras reduções sempre que com estas medidas se garanta maior eficácia , melhor eficiência, e uma redução assinalável dos gastos públicos”, disse.

O especialista acrescentou ainda: “considero ser importante, para além de informar o número e o tipo de instituições que foram extintas, fundidas e outras, quanto dinheiro conseguiu-se poupar e onde tais verbas serão aplicadas”.

Por outro lado, Sérgio Calundungo defende que o Executivo terá de dar provas de que reduziu significativamente os custos com este tipo de medida, “já que como sabemos, uma parte importante dos custos prende-se com o peso salarial desses funcionários, e como não foram anunciados despedimentos, estou em crer que estas pessoas vão permanecer no quadro de pessoal e desta forma pode ser que não ocorram grandes reduções em termos de encargos para o Estado como pode aparentar”.

De acordo com o coordenador do OPSA, é importante evitar-se o lançamento de mensagens contraditórias, já que, frisou, se por um lado aparecem medidas como estas que são muito bem vindas e aplaudidas , mas por outro lado , faram-se opções tais como, criar um gabinete de acção psicológica ou instituir um posto de secretário de estado para tratar de questões que seriam muito bem entregues a um director nacional de facto.