Governo e Atlantic Ventures em “guerra de comunicados” sobre decisão tomada em Paris

Governo e Atlantic Ventures em “guerra de comunicados” sobre decisão tomada em Paris

Em resposta a um comunicado divulgado na manhã de ontem, Segunda-feira (13), pelo Ministério dos Transportes (MINTRANS) de Angola, dirigido por Viegas de Abreu, a empresa Atlantic Ventures, na tarde do mesmo dia, emitiu um outro comunicado a refutar a informação contida no primeiro. 

Segundo o Governo angolano, “o Tribunal Arbitral de Paris negou, Sexta-feira, 9, provimento à acção intentada contra o Estado angolano pela Atlantic Ventures, que contestava a revogação de um Decreto Presidencial a autorizar a concessão do Porto do Dande empresa ligada à empresária Isabel dos Santos”. 

Acrescentando que “o tribunal condenou, ainda, a empresa Atlantic Ventures a pagar ao Estado angolano 132 milhões 890 mil e 290 kwanzas pelos custos da arbitragem”. 

A empresa, entretanto, diz que “o Tribunal Arbitral de Paris não deu razão ao Estado angolano”, mas “decidiu que carece de competência para julgar o assunto”. 

“Na verdade, este Tribunal Arbitral apenas decidiu que não tem competência para apreciar substantivamente o assunto e, por isso, não tomou posição acerca dos pedidos apresentados pela empresa Atlantic Ventures”, diz a nota enviada a OPAÍS na tarde de ontem. 

E a empresa não fica por aí no seu comunicado, apresentando o que diz ser a transcrição, na íntegra, do teor da decisão parisiense: 

“1. «O Tribunal Arbitral carece de competência para decidir sobre o mérito da demanda apresentada pela Demandante (Atlantic Ventures)”. 

“2. A Demandante é condenada a pagar aos Demandados o montante de AOA 132.890.295,10 (cento e trinta e dois milhões, oitocentos e noventa mil, duzentos e noventa e cinco Kwanzas e dez cêntimos) em compensação dos custos causados pela presente arbitragem”. 

Mais adiante, a empresa diz que o tribunal decidiu que “quaisquer outros pedidos ou reclamações são rejeitados”. Rejeitando, desta forma, que tivesse sofrido uma derrota judicial. “O Tribunal Arbitral de Paris não veio dar razão ao Estado angolano”, finaliza. 

Entretanto, no comunicado do Governo lê-se que a decisão foi tomada por unanimidade por três árbitros, que não admite recurso, “o que significa que a Atlantic Ventures está efectivamente afastada do usufruto de uma extensão de terra idealizada para a construção do Porto do Dande e a constituição de uma zona franca”. 

Em causa está um negócio atribuído por Decreto Presidencial assinado pelo então Chefe de Estado angolano, José Eduardo dos Santos, a 20 de Setembro de 2017, antes da tomada de posse do Presidente João Lourenço, que, entretanto, no final de Junho de 2018, revogou a decisão. 

A concessão, noticiou ontem a ANGOP, por sua vez, era por 30 anos e a obra avaliada em 1,5 mil milhões de dólares, envolvendo a emissão de uma garantia soberana do Estado, no mesmo valor, a favor da empresa Atlantic Ventures. 

Ainda segundo a ANGOP, o MINTRANS reafirma o propósito de continuar a agir para a prossecução e salvaguarda do interesse público e assegurar a implementação de um Terminal de Desenvolvimento Integrado da Barra do Dande, através do recurso a investidores estrangeiros qualificados e com capacidade técnica e financeira que garantam a criação de reservas estratégicas nacionais nos domínios alimentar, combustíveis e energia, visando o desenvolvimento económico. 

O processo intentado pela em presa Atlantic Ventures resultou da revogação do Decreto Presidencial nº 207/17, de 20 de Setembro, que autorizava a concessão do Porto do Dande, bem como a constituição de uma zona franca, num perímetro desde a foz do rio Dande até às proximidades da zona do Capolo. 

Em reacção à revogação da concessão, a Atlantic Ventures intentou dois processos de arbitragem, um sob a égide da Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, em Paris, e outro de Arbitragem Ad Hoc. 

Na acção, escreve a ANGOP, a Atlantic Ventures pedia ao Tribunal Arbitral que declarasse, dentre outros, a nulidade do Decreto Presidencial através do qual o novo Presidente da República revogava o diploma que oficializava o acto de favorecimento e, também, o pagamento pelo Estado angolano de uma indemnização no valor de 850 milhões de dólares americanos. 

Tribunal Arbitral ditou, porém, reporta ainda a agência de notícias, que não ficou provada a existência dos referidos contratos e entendeu que a alegação posterior que os referidos contratos existiriam e seriam válidos não pode ser admitida. 

As cláusulas compromissórias contidas nas minutas de Contratos de Concessão e do Contrato de Direito de Superfície nunca chegaram a ser acordadas, com a finalidade de se aplicarem em momento anterior e de maneira independente à formalização desses contratos. 

O Tribunal rejeitou também, continua a agência, o argumento de que teria competência para dirimir o litígio com base nos artigos 58.o das Bases Gerais das Concessões Portuárias e 33.o das Bases Gerais da Concessão Dominial. 

Entretanto, escreve ainda que o tribunal entendeu também concordar com o Estado angolano, pois carece de fundamento o argumento da Atlantic Ventures, na medida em que, em ambos os casos, as disposições respeitantes à resolução de litígios por via arbitral são meramente aplicáveis dentro do âmbito das respectivas definições de Concessão, ou seja, quando é concluído um contrato administrativo. 

Pelo que, da análise dos vários argumentos apresentados pela Atlantic Ventures e considerando, também, os vários outros argumentos invocados pelas Partes, não há nenhuma base, contratual legal ou outra, para afirmar a sua competência, concluiu o Tribunal Arbitral.