“O novo código do IRT é uma certidão de óbito para a economia”

“O novo código do IRT é uma certidão de óbito para a economia”

O Governo aguarda pela terceira avaliação do FMI, à luz do Programa de Financiamento Ampliado. Qual é a sua expectativa?

O programa Economia Real acertou mais uma vez. Em Março dissemos que os programas públicos estavam desactualizados e teriam de ser ajustados, em função da Covid-19. O programa do FMI em Angola também desactualizou e as partes sentaram-se para reajustar as linhas orientadoras. Com isso, o empréstimo pode sair de 3,7 mil milhões para 4,4 mil milhões de dólares. Angola concluiu algumas medidas e ficaram outras por concluir. Relativamente à dívida, sempre defendi que Angola é viciada no crack ou na marijuana da dívida e vai precisar aumentar o endividamento.

Adiciona-se a adesão de Angola à iniciativa do G-20…

É a estratégia. Penso que cometemos muitos erros nos últimos dois anos. Ao invés de investirmos na poupança, porque o preço do petróleo sempre ficou acima de USD 55, de modo que a poupança servisse de sustentabilidade das finanças públicas, acostumamo-nos a viver sempre no limite, no limiar do precipício. Nenhum país do mundo cresce sem contas públicas organizadas, estruturadas, sustentáveis e poupança.

Dados do INE indicam que o custo de vida aumentou no primeiro semestre à volta de 1,98% por mês. Como inverter o quadro?

O país tem problemas estruturais enormes. Para uma economia com uma estrutura-base de exportações não diversificada e o seu consumo dependente da importação, é normal os preços subirem e nos próximos tempos não se vislumbram tendências de queda por três razões: o país vive uma desvalorização enorme, sendo que desde Janeiro a Junho a taxa de desvalorização do Kwanza fixou-se em 15%; aumento da circulação monetária em 2%, no mesmo período e a expectativa do aumento dos preços com a entrada em circulação das novas notas do Kwanza.

O INE lança expectativa sobre a reacção do mercado em relação à entrada em circulação das novas cédulas do Kwanza…

Sim, até o próprio INE analisa as contas financeiras. Acredita que o comportamento das contas financeiras têm impacto nas contas não financeiras. Acrescenta que a influência da emissão da nova moeda promova procura dos bens e serviços para utilizar as novas cédulas.

O novo Código do Imposto sobre o Rendimento de Trabalho começa a ser operacionalizado brevemente com a sua publicação em Diário da República. Quem ganha mais tributa mais. Que consequências? Se o Governo vai tirar mais das pessoas, terão menos rendimento e pode reduzir o apetite da compra de bens e serviços das famílias. O novo código do IRT é uma certidão de óbito para a economia, através do sofrimento das famílias.

Como justifica?

Essa certidão de óbito para a economia diz que o dinheiro tem que passar mais no Governo do que nas famílias. Ou seja, o Governo gasta mais do que arrecada. Agora quer arrecadar mais do que gasta, não através da redução das despesas, mas tirando mais do bolso das famílias. O novo código de IRT é injusto, na medida em que o país é subdesenvolvido. O país é pobre. Castiga os mais eficientes que querem alargar as oportunidades na sociedade, porque esse imposto é progressivo. Angola é um país pobre que aposta no imposto progressivo como chave para sair da pobreza. Seria o inverso. Imposto proporcional. O IRT progressivo reduz categoricamente o empreendedorismo das famílias com capitais próprios, na medida em que as famílias não terão poupanças. E isso pode aumentar o desemprego, porque impede a criação de novos pequenos negócios. As classes mais pobres poderão sofrer, porque trabalham nas casas das pessoas com rendimento alto.

A Comissão Económica do Conselho de Ministros aprovou a estratégia da reconversão da economia informal para o período até 2022. É o caminho?

Não tive contacto com a estratégia, mas sempre defendi que as causas da informalidade da economia angolana e africana, no geral, é a falta de formação e emprego. Quanto maior for o desemprego a informalidade aumenta. A liberdade, a formação e informação, devem ser levadas em consideração.

Há uma corrente que caracteriza economia informal como ‘tudo que é produzido pelo sector primário, secundário ou terciário sem conhecimento do governo e que não se consegue arrecadar impostos’. Concorda? Essa definição é de um pensamento económico do intervencionismo. A economia surgiu primeiro que o governo.

Mas toda a actividade económica deve ser tributada!?

A economia só é formal, quando organizada, sistematizada e estruturada, não é porque o Estado tirou imposto é que a torna formal. Se sairmos a cobrar impostos nos mercados do Asa Branca, Kantinton, não vai transformá-los em formal.