Contra-corrente de jogo

Mu kua Malanje kytady yangu (para o malanjino dinheiro é capim) deve ser das coisas mais engraçadas que se escuta sobre todos aqueles que nasceram nas terras da Palanca Negra. E nesta fase de crise deve ser ainda mais doloroso acreditar neste adágio, tendo em conta as dificuldades por que passam os súbditos de Ngola Kiluanje.

Mas, ao longo dos anos, o que tenho procurado perceber são as razões que fizeram com que se olhasse para os malanjinos como indivíduos que já nascem com a 4ª classe. Dizem ser a quarta do tempo colonial, sem nada a ver com a actual, sobretudo depois de uma mal sucedida reforma educativa, cujos contornos deformativos ainda se mantêm à vista. Para quem supostamente já vem com a quarta classe ao mundo, questionar a organização interna e as coisas que o rodeiam deve ser dos aspectos mais básicos. Nem deve contar com o incentivo de terceiros e muito menos hipotéticos fantasmas.

Compartilhar informações, principalmente com aqueles que dirigimos, é das obrigações primordiais de uma gestão participativa para um governante que quer ser encarado com seriedade. Além dos mecanismos tradicionais de prestação de contas, alguns dos quais passam pelo Tribunal de Contas, dar a conhecer o que fazemos permite que os governados tenham noção do exercício do mandato de quem votaram e recebeu a missão de representar o titular do poder Executivo, assim como do próprio partido.

No caso do MPLA, há uma ligação quase que umbilical com Malanje e as suas gentes, por isso não pode atirar para debaixo do tapete alguns sinais que lhe são dado. Porque, sem necessidade de se recordar que alguém um dia teria prometido que os malanjinos fossem empurrar o comboio com os dentes, Malanje tem sido das poucas províncias que nos quatro pleitos eleitorais, isto é 1992, 2008, 2012 e 2017 sempre garantiu o pleno na eleição de cinco deputados.

Mas, com o decorrer do tempo, tem havido uma redução percentual. Se se atingiu o pleno em 1991, assim como nas segundas eleições, em 2008, com cifras que rondavam os 93,12% contra os 2,18 % da UNITA, nos anos seguintes acentua-se uma quebra. Foram 87, 04 % em 2012, contra 5,98% da UNITA e 76,53 % 6,53 % em 2017 contra 10, 78 dos seus principais adversários.

A entrada em cena da CASA-CE, acabou por diluir ainda mais o número de votos na província. Está mais do um deslocamento de votos, principalmente dos mais jovens, por causa das incertezas e das más políticas implementadas a nível local.

É esta mesma juventude que dentro de dois anos, nas eleições legislativas, ou no próximo, caso ocorram as autárquicas, deverá ir, uma vez mais, às urnas para escolher o partido que irá dirigir o país ou os futuros autarcas.

É esta mesma juventude a quem se vai apelar o voto. É a mesma a quem se recusada informações por parte do representante do titular do poder Executivo. Pedir a um governante que preste contas, enquanto servidor público, não deveria nunca ser interpretado como uma heresia. Pelo contrário, deve ser encarado como uma oportunidade soberana para que junto destes se esclareça, não só sobre o que se tem feito, como também aproveitar para ‘vender o peixe’ em relação ao futuro.

As declarações do governador de Malanje, Norberto dos Santos ‘Kwata Kanawa’, que nos últimos dias inundaram as redes sociais e a imprensa, podem ser comparadas a um autogolo marcado na própria baliza por um jogador praticamente contra a corrente de jogo. Recusar-se a prestar informações e ainda sugerir que o solicitante tenha agido a mando de alguém contraria, sobremaneira, com aquelas que são as pressimas deste Executivo, no que concerne à transparência e a boa governação.

Mesmo que seja contra a vontade, até porque se avolumam as contestações internas, incluindo de camaradas do mesmo partido, oportunidades como aquela desperdiçada pelo governador deveriam ser aproveitadas até mesmo para se atenuar os efeitos manifestações contra o próprio governante, que até já chegaram a criar inconvenientes para o vicepresidente da República, Bornito de Sousa, quando se deslocou à província.

E é em tempos difíceis, como estes em que vivemos, que se deve aguçar cada vez mais o engenho de quem tem a missão de velar pela colectividade e não extremar as posições como se fosse imune a críticas, caso haja desacordo em relação ao que tem executado.

O extremar de posições naquela província nem sempre favoreceu quem esteve no poleiro. Quem é vivo ainda se recorda em como Flávio Fernandes, um dos mais poderosos e contestados governadores desta província, foi apeado do cargo num acto público. Nem mesmo o então soberano da época conseguiu segurá-lo.