A soberania no âmbito da cesta básica (2)

Como ponto prévio, considero estrategicamente urgente que se difundam mais dados sobre as propriedades nutricionais, e até terapêuticas, de cada item alimentar da famigerada “cesta básica” e outros produtos que havemos de adicionar nela, como exercício da nossa soberania.

Tais dados propiciarão que cada chefe de família aprimore a sua educação alimentar, por um lado. Por outro, facilitará a compreensão de algumas opiniões que defendem, e até orientam, um consumo maior de produtos nacionais; Mais ervas, tubérculos, grãos, horto- frutículas; e menos congelados, menos pão, menos bebidas alcoólicas, etc.

É oportuno recordar que do mesmo modo que é dever do Governo criar empregos, ou facilitar que tal se realize, e é da responsabilidade de cada cidadão procurar trabalho, também é competência do Governo regular e facilitar o acesso às terras e às águas, ficando com cada um de nós a tarefa de semear e pescar.

E se concordarmos que melhor do que ser empregado de alguém é sermos donos do próprio negócio, aceitaremos que cultivar ou vender tomates, batatas ou peixes seja o nosso “ganha-pão”; e seremos mais livres para definir a qualidade e as quantidades da nossa cesta básica.

A interpretação lexical da palavra soberania levou-me a mergulhar em reflexões em torno das actuais limitações para o sustento alimentar das nossas famílias, pois, está enfraquecido o poder de aquisição de bens vitais.

E é nos lares, como núcleos da sociedade, onde se avalia a saúde do país. Embora pese um pendor político sobre o significado do vocábulo soberania, é nas nossas casas onde melhor se compreende o estado da nação; é lá que deve espelhar-se a verdadeira autonomia do povo. Há muitas verdades a considerar em torno disso.

A guisa de exemplo, penso: se o básico (comida) já não está tão acessível; se já não é o que nós produzimos nos nossos próprios campos; se a produção do essencial depende menos de nós e mais de terceiros; Se a maior parte das grandes produções locais estão em mãos de pessoas mais capazes, porém, estrangeiras; não será pacífico, então, questionar a soberania nacional? Não precisamos exagerar. Mas estejamos em alerta.

Para mim, é grave sermos dependentes até para alimentar os nossos animais, se concordamos que também eles sejam dependentes de importações.

Este pensamento invadiu- me a alma quando ouvi que as folhas de mandioqueira, afinal, tratadas para o efeito, serve para alimentar tilápias – dado avançado pelo titular das pescas, durante uma entrevista recente a um órgão público. Então, também já precisamos aumentar os estudos e investimentos na produção de ração, para atender à necessidade dos criadores de peixes, e doutros tantos que reclamam da falta dela.

O melhor da soberania é que cada um de nós possa produzir um pouco do que nos é vital ou prioritário. E se conseguirmos que cada família gere um pouco do essencial, como era no “tempo das trochas gordas”, muitos haveres teremos por permuta, e não só por compra, já que não cultivaremos todos as mesmas coisas.

Acredito num futuro próximo onde a monodocência tenha, como inovação, uma alta carga de informações sobre o valor nutricional dos chamados “quitutes da terra” e veementes alertas de que produtos naturais são-nos mais convenientes do que os hamburgueres.

Só assim poderei aludir mais vezes à longevidade dos nossos avôs e referenciar, com mais detalhes, o papel estratégico da nutrição para uma velhice saudável. Creio num momento da pátria onde será mais fácil ter um espaço para cultivar, ou meios para pescar – já que caçar parece mais problemático.

Aqui, apelaria ao Governo, de quem depende legislar sobre o assunto de formas que facilite e não complique. Porém, quero que haja menos vergonha de dizer “sou camponês”; que mais chefes de família, mormente os jovens, tenham orgulho em dizer “crio galinhas” ou “sou pescador”.