Madres clamam por apoio para o lar feminino

Madres clamam por apoio para o lar feminino

Alimentação e materiais escolares constam da lista das necessidades que o centro de acolhimento, tutelado pelas missionárias dessa congregação, precisa com alguma urgência

A responsável do lar de acolhimento feminino, das missionárias da congregação Católica do Santíssimo Salvador, Irmã Domingas, clama por apoios para garantir a manutenção das 20 adolescentes que se encontram a viver sob sua guarda.

“Apelamos às instituições de direito ligadas ao Estado ou ao sector privado, bem como a outras organizações de caris social, para que olhem para nós”, bradou a madre Domingas, que não quer ver as portas do centro de acolhimento encerradas.

Localizado na rua da Samba, município de Luanda, próximo da Morgue Central, do hospital Josina Machel, o internato conta, actualmente, com 20 adolescentes de idades compreendidas entre os 12 e 16 anos.

No passado, a mesma casa já chegou a albergar 30 a 40 infanto- juvenis do sexo feminino, devido aos auxílios que, antes recebiam de algumas instituições públicas e privadas.

“A partir de 2016 fomos reduzindo o número das meninas, até chegarmos a conclusão de que, com 20, já nos poderíamos sacrificar a viver, pois, ainda assim tudo custa para manter essas crianças aqui alimentadas e saudáveis”, contou a irmã, para quem a única coisa que a sua congregação não deixa desaparecer é a alegria e a esperança.

Sem dar muitos rodeios, a freira detalhou que os principais problemas prendem-se mesmo com a garantia das refeições diárias e do material escolar, principalmente, da maior parte das crianças que frequentam a 7ª, 8ª e 9ª classe, numa escola localizada nas redondezas.

A irmã Domingas revelou que, até à data desta reportagem, as suas crianças acumulam uma dívida de propinas mensais numa escola do primeiro ciclo do ensino secundário.

Por causa disso, ela já foi convocada pela direcção da referida instituição escolar para esclarecer as razões da demora, sob pena de ver mais de metade das meninas da casa afastadas das sessões lectivas.

“Tive de pedir para a direcção ser condescendente com as meninas, enquanto procuramos formas de inverter esse quadro”, disse a Irmã Domingas, como é carinhosamente tratada na congregação, tendo acrescentado que o cenário se repete quase todos os anos.

A luta pela aquisição do material didáctico tem sido outro desassossego para as missionárias do Santíssimo Salvador que, muitas vezes, não conseguem salvar as suas agregadas da suspensão das aulas de Língua Portuguesa e Matemática, devido à falta dos respectivos manuais. “Dói-nos ver as crianças a adiarem o seu sonho”

Como a congregação possui um estabelecimento que presta serviços de saúde, próximo do centro paroquial Nossa Senhora do Carmo, onde quase todas as madres da casa colaboram, a maior parte das meninas se afeiçoa pela área de enfermagem ou medicina.

“Mas encontramos problema quando as meninas da casa têm de ingressar aqui próximo na Escola Técnica de Saúde, no antigo Instituto Médio de Saúde de Luanda (IMS). E não é por não conseguirem ter positiva, até porque muitos candidatos que têm tido notas inferiores depois são matriculados”, reclamou a madre, alegando que uma das meninas internas clamou pela intervenção de alguns familiares sem a anuência das freiras e ingressou.

A Irmã Domingas disse que, se a entrada no então IMS fosse viável, elas estariam a promover boas técnicas de saúde, porque o estágio profissional estava garantida no centro médico afecto à congregação.

Essa dificuldade de acesso à Escola Técnica de Saúde já obrigou as missionárias a matricularem uma das meninas no curso de Educador Social, no Instituto de Ciências Religiosas de Angola (ICRA), no 1º de Maio, distrito urbano da Maianga.

“Esta menina preocupou-nos, no princípio, ela ficou mesmo doente, porque andava mais de metade do percurso para a escola a pé. Nós não tínhamos cobertura, agora ainda podemos cobrir metade. Dói-nos ver as crianças a adiarem os seus sonhos”, frisou.

Apesar das vicissitudes por que passam ainda com pouca idade, as raparigas deste lar parecem estar conscientes de que fazem, hoje, um sacrifício que vai valer apenas, no futuro, conforme deixaram patente nos seus discursos, Isabel Nangueve e Emília, de 14 e 15 anos de idade.

Fontes de rendimento limitadas

Questionada sobre que medidas alternativas a sua congregação costuma a encontrar para não passar as dívidas de um ano para outro, ela falou de uma máquina fotocopiadora que tinham conseguido para facilitar os trabalhos escolares das raparigas internas.

“E com este equipamento aproveitávamos atender a solicitação de alguns cidadãos que procuravam ter cópias de seus documentos, a troco de algum dinheiro”, declarou a missionária, tendo revelado que se valiam da sua localização próxima de muitos serviços públicos como bancos, escolas, hospitais e outras instituições cujos expedientes exigem variados documentos.

Para piorar a situação do lar, a máquina está avariada e a sua recuperação está avaliada em custos que exigem esforços teoricamente difíceis, conforme fez constar a responsável do internato.

Embora a meio-gás, a alternativa activa e funcional de que as Irmãs do Santíssimo Salvador se servem, actualmente, resume-se naquilo que consideram como parcos recursos financeiros que duas das nove madres contribuem dos seus salários e pensão de reforma.

“São as únicas madres que trabalham, tiram um pouco daquilo que é seu e dão para minimizar a condição alimentar”, realçou a Irmã Domingas, adiantando que, às vezes, o dinheiro nem para isso chega.

Socorro institucional à mesa do lar

As negações que obtiveram das solicitações que endereçaram em algumas instituições não lhes desencorajou. “Já mandamos muitas cartas que não tiveram respostas, ainda assim estamos em vésperas de enviar outras para instituições como o Ministério da Acção Social, Família e Promoção da Mulher (MASFAMU), Sonangol e o Ministério da Saúde”, revelou a interlocutora deste jornal.

A Irmã Domingas acredita que, apesar da situação da pandemia, existem muitas organizações estatais e privadas viradas para solidariedade que podem ajudar o lar a sair desse quadro.

Do Huambo para Luanda

Isabel e Emília são duas adolescentes que deixaram as suas famílias no município de Cassongue, província do Cuanza-Sul e do Huambo, província onde as duas já residiram por algum tempo sob a égide das Missionárias do Santíssimo Salvador. Enquanto frequentam as aulas no ensino secundário do primeiro ciclo, elas já apontam o seu horizonte profissional nas áreas de Contabilidade e Medicina.

Por causa disso, elas se desdobram a custo para, em avaliações, não terem notas abaixo de 14, em Língua Portuguesa, Matemática e Física, bem como Biologia e Química. “Isso não quer dizer que em outras disciplinas podemos brincar”, disseram, esclarecendo que estudam para terem um aproveitamento melhor.

Isabel Nangueve relatou que veio parar no lar das Irmãs por iniciativa própria, que foi, prontamente, reforçada pelo incentivo das freiras. Agrada-lhe o facto de, no internato, estar a aprender outras valências como fez questão de referir a culinária, pastelaria e corte e costura.

Curiosamente, é o que levou Emília à comunidade dessas missionárias. Lembrou que os seus familiares sempre lhe disseram que na vida contam mais as coisas de uso frequente, razão pela qual os subsídios extra-escolares que as superioras lhes transmitem, como a responsabilidade de garantir condições de higiene, sentido de solidariedade, de convivência na diferença e amor ao próximo são bem acatadas por si.

“Até porque como futura médica, eu vou precisar desses valores para levar avante o trabalho”, observou.