O potencial da Zona Verde III como modelo das cidades do futuro

Curiosamente, de modo sistemático e recorrente na nossa sociedade, tem-se verificado um fenómeno que deve estudado e banido dos nossos hábitos, sejam eles no âmbito da gestão pública ou privada aos vários níveis, onde se nota uma clara tendência para a desqualificação do trabalho ou das obras iniciadas ou realizadas por quem nos antecede. O Projecto de Reconversão ou requalificação da Zona Verde III, localizado no Distrito Urbano de Cabolombo, Município de Belas, teve inicio no ano de 2003 pelo Governador de Luanda na altura, tendo conhecendo o seu auge na vigência do mandato da Governadora Francisca do Espírito Santo. Infelizmente, volvidos dezoito anos, o projecto ainda não conheceu a sua conclusão e o meu repto vai no sentido de se terminar aquilo que já teve inicio há uma imensidão de tempo. Este projecto merece ser olhado com a objectividade necessária, porquanto, a realidade actual está muito distante da preconizada pelos mentores do projecto.

O cenário actual é de ruas lamacentas, esburacadas nuns casos, completamente inacessíveis noutros, com água parada, excesso de areia ou com falta de nivelamento, limitando claramente a circulação de automóveis e peões e a vida normal da comunidade, num bairro que foi loteado pelo G.P.L. e erguido inteiramente através do esforço dos munícipes, que foram adquirindo os lotes terrenos, para a autoconstrução e investindo cada um, de acordo com o seu gosto e as suas possibilidades financeiras. Seja qual for a amplitude, este desafio significou imenso para qualquer um deles, associado a um enorme investimento, alguns feitos a fundo perdido, porquanto, o descrédito e a desilusão tomou conta de muitos chefes de família que investiram tudo o que tinham, ou as suas melhores economias num bairro cujo potencial continua a ser enorme mas parece andar completamente esquecido por quem de direito, o que levou muitos à desistência ou ao abandono temporário do seu projecto.

O quadro actual é de muito desconforto, pois muitas famílias que se sentem defraudadas e até certo ponto abandonadas, pois almejavam viver num bairro com qualidade de vida dentro dos padrões mínimos aceitáveis, com os quais sempre sonharam enquanto cidadãos, porém, inversamente têm enfrentado diversos problemas, que, pelo longo tempo de espera, supostamente estariam resolvidos, entre os quais: a distribuição de água e energia eléctrica, saneamento básico, elevados índices de delinquência, ausência quase total de iluminação pública, falta de salas de aulas a todos os níveis, hospital público ou centro de saúde e a enorme dificuldade de mobilidade devido à ausência de ruas asfaltadas, que tem sido o maior obstáculo para o desenvolvimento, entre outras peripécias.

As soluções são necessárias e, acima de tudo, urgentes, num bairro com população estimada em mais de quarenta mil habitantes, que suspiram por um conjunto de soluções integradas, que ajudem a levar dignidade e conforto àquelas populações, famílias batalhadoras que, heróica e generosamente, vão resistindo às adversidades e prosseguem dando vida ao Bairro da Zona Verde III, que, pela sua estrutura, composta por ruas cuja largura merece destaque pela positiva, com milhares de imóveis construídos, a maior parte com uma qualidade acima da média, é muito mais do que um bairro, é uma cidade em potencial. Elevar o bem-estar social do povo ou de cada cidadão para que cada um ao seu nível sinta conforto, viva com dignidade, é um desafio imenso que temos pela frente e investir na conclusão destes projectos será, sem sobra de dúvidas, uma janela de oportunidade para lhes devolver a esperança e, consequentemente, fazer milhares de famílias sorrirem.

É necessário que estes problemas sociais sejam resolvidos a partir da base e a Zona Verde III pode ser verdadeiramente um modelo para outros bairros. Os cidadãos já deram passos significativos investindo e construindo com qualidade, agora é necessário que sintam uma resposta ao mais alto nível para que, no final, todos se sintam satisfeitos: eles em primeiro lugar e os servidores públicos logo de seguida alcançando verdadeiramente um sentimento de dever cumprido.

O PIIM trouxe alguma esperança com a construção de uma escola de primeiro ciclo que irá servir a comunidade, obra já em curso, porém, no entender de muitos, poderia ser muito mais ousado e causar uma verdadeira transformação do bairro catapultando-o para o trilho do desenvolvimento, onde a principal prioridade deve ser, sem sombra de dúvidas, o asfaltamento das principais vias, porque está mais que provado e comprovado que as terraplanagens não surtiram nem irão surtir o efeito desejado, pois, logo a primeira chuva, o cenário anterior regressa imediatamente. Recordo que mobilidade gera desenvolvimento e, neste capítulo, destaco às avenidas Uanhenga Xitu e Lúcio Lara, em homenagem a figuras de alto relevo na sociedade angolana, cujas avenidas com o seu nome merecem um tratamento mais consentâneo, ou seja, a altura dos seus feitos, ou ainda a 23 de Março em homenagem a um momento de grande relevo na Historia de Angola e da África Austral “o Dia da Libertação da África Austral” cujo feriado foi ontem celebrado, a “Soba Caetano” que homenageia uma autoridade tradicional, cuja influência na zona merece o destaque e outras tais como: a Avenida que vai dar ao Sossego, a rua que faz a ligação entre a Uanhenga Xitu e a 23 de Março, a famosa rua 18, a outrora muito movimentada rua 24 do Hotel Gelvisol ou a Igreja Petencostal, às casas gémeas e por aí fora, que tem sido muito afectada por ravinas, que por sua vez, vão ganhando cada vez mais espaço, situação que se estende por uma boa parcela do território.

O PIIM talvez pudesse ainda ser bem mais explorado no domínio da extensão da rede de energia eléctrica e iluminação pública, bem como usado para impulsionar o que falta e para conclusão do Centro de Distribuição de Água de Cabolombo, cuja última fase aguarda por financiamento externo, o que seria de facto um grande ganho para a população em termos de saúde pública, pois deixariam de viver exclusivamente do abastecimento feito por camiões cisternas, que, para além da má qualidade da água nuns casos e qualidade duvidosa na maioria dos casos, é um serviço que está cada vez mais caro e insustentável para estas famílias. Outro aspecto fundamental e altamente estratégico seria o surgimento de um hospital público construído de raiz que pode inclusivamente servir às populações de vários bairros limítrofes e não só, ou seja, quase toda a população do município beneficiária. Há, portanto, muito por se fazer, já provamos que somos capazes mas a pirâmide está invertida.

As prioridades actuais já não deviam passar necessariamente pelas construções de novas centralidades. Ao invés, o ideal seria a conclusão destes bons projectos inacabados, que continuam com um potencial enorme e, por outro lado, das centralidades já existentes, dotando-as de todas as infra-estruturas envolventes em falta, potenciando deste modo uma vasta gama de iniciativas privadas, com destaque para espaços de lazer, onde o Estado irá, através da cobrança dos impostos, arrecadar muitas receitas e investir noutras latitudes. Destaco o papel das comissões de moradores, que se encontram umas no seu processo de constituição e outras na renovação de mandatos, que poderão desempenhar um papel fundamental na vida destas comunidades, auxiliando as administrações e posteriormente o poder local no trabalho em prol das populações e no cumprimento das regras de sã convivência social e de respeito pelo ambiente, bem como o das associações locais que desempenharão certamente um papel crucial no desenvolvimento da sua localidade. O projecto Zona Verde III é um projecto de futuro que tem tudo para ser sustentável e merece ser reapreciado e concluído.