Actualmente, a palavra de ordem para os Estados Africanos, em particular da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral, é “desenvolvimento”, enquanto motor para a prosperidade desta Região a África, nos termos do estabelecido no artigo 5.º Tratado da SADC. Os discursos das autoridades governativas, da Sociedade Civil, e de individualidades independentes, assim como de académicos direccionam o linguajar para a construção de Estados sólidos, a partir do respeito da dignidade da pessoa humana. Parece anedótico, mas vemos uma comunidade aquém do desiderato do Desenvolvimento propriamente dito.
Fátima Roque (2018) sublinha que a pobreza extrema estrutural, a desigualdade social crescente, a corrupção generalizada, a instabilidade política e económica, a má distribuição dos recursos, a deficiente governação etc. continuam a ser os principais factores geradores de situações de paz instável em África. E com efeito, contrário ao desiderato do Desenvolvimento. O desenvolvimento compreende um processo multidimensional de transformação estrutural que incorpora elementos políticos, económico-financeiros, sociais, tecnológicos e jurídicos. Para a implementação é necessário a criação de instituições fortes, capazes de responderem a demanda e aos desafios que surgem durante o processo.
O político enquanto gestor, no processo desenvolvimento tem um papel crucial através da criação e implementação de políticas públicas adequadas aos interesses dos cidadãos, das comunidades e das famílias. As políticas pública devem responder aos mais altos anseios da nação, e nunca de um grupo, ou de uma elite, seja qual for o seu interesse. O económico no desenvolvimento seria a alma para a (re)distribuição equitativa do rendimento do Estado a todos os sectores, no estrito respeito da igualdade e não descriminação entre os cidadãos, os povos e as comunidades. Portanto, não se pode pensar em desenvolvimento sem políticas económicas que promovam a igualdade e sustentabilidade de todos membros da sociedade.
Amartya Sen (1999) com clarividência define o “desenvolvimento como liberdade”, justificando que sem expansão (garantia) dos direitos e liberdades fundamentais não há desenvolvimento e como consequência, não é possível elevar-se o nível, a qualidade de vida e o bem-estar das populações (urbanas, suburbanas e rurais). Jeff rey Sachs (2012) sustenta que o crescimento económico socialmente inclusivo e ambientalmente sustentável são factores decisivos para o desenvolvimento.
Concomitantemente, a geração de oportunidades aos cidadãos no processo de desenvolvimento significa investir na autorrealização dos cidadãos, e ao mesmo tempo na capacidade contributiva do cidadão, que reverterá em benefícios para o próprio Estado, na prossecução do interesse público, no caso concreto, a melhoria do sistema de educação, saúde, alimentação, segurança social, habitação, rede viários (estradas) entre outros. Outrossim, a tecnologia é um dos pilares quando se fala em desenvolvimento.
O progresso tecnológico permite a um determinado Estado integra-se ao pé de igualdade com os demais Estados no Mundo Global. A busca e transferência tecnológica deve ser um vector fundamental quando se pensa em desenvolvimento pleno. A tecnologia é uma alavanca de transformação social, económico e humano no interior da sociedade e das comunidades. Tal é caso, das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), adoptação de tecnologia menos poluentes, que reduza os impactos ambientais e ecológico, bem como a diversificação da matriz energética. Igualmente, não se pode pensar em desenvolvimento sem o jurídico. Este é a balança entre o político e o económico-financeiro, entre o social e o económico, bem como o legislativo e executivo.
Por esta razão, o jurídico no processo de desenvolvimento é pedra angular para corrigir os efeitos nocivos e violentos, tal é o caso da “privação de liberdade, corrupção, a falta de transparência e má gestão do erário público gerador de pobreza extrema e desigualdade social” (Alves da Rocha, 2010 e 2018). O desenvolvimento não é um jogo de futebol, nem de basquetebol, seja qual for a metáfora que se pretenda utilizar, o desenvolvimento tem impacto directo nos direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos. E, nos dias de hoje, é um Direito Fundamental reconhecida internacionalmente pela Declaração das Nações Unidas sobre o Direito ao Desenvolvimento de 1986 e Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos de 1981, a Declaração do Rio de 1992 e Joanesburgo de 2012 até a Agenda 2030 sobre os Objectivos do Desenvolvimento Sustentável e a Agenda 2063 da União Africana.
Portanto, o novo paradigma do Desenvolvimento incorpora a sustentabilidade e os direitos fundamentais das gerações presentes e futuras. A materialização do desenvolvimento pode gera conflitos nas comunidades, a exploração económica transporta em si a negação e a violação de direitos fundamentais dos cidadãos. As empresas e grupos empresariais, assim como os investidores sacrificam as comunidades em nome do lucro, dos ganhos financeiros. Prova disto é o caso Economic Rights Action Centre (SERAC) e Center for Economic and Social Rights c. Nigeria, a favor o Povo Ogoni; o Caso African Commission on Human and People’s Rights c. Quenia (TADHP) sobre do Povo Ogiek, Facto notório, a exploração desenfreada dos recursos naturais, madeira, petróleo, gás, diamantes, ferro, coltã, etc, põe em risco os direitos fundamentais das comunidades como do próprio meio ambiente (a terra, o ar, a água, a fauna, a flora e os ecossistemas).
E mais, não respeitam o direito de propriedade nem a posse de boafé ou legítima violando assim, os direitos humanos das minorias que dela dependam inteiramente. Variadas vezes ocorrem situações no processo de desenvolvimento no interior do Estado, que não se respeita o princípio da participação, igualdade e não descriminação, o direito de acesso à informação, à indemnização (compensação) em caso de expropriação das terras pelo governo em apoios as actividades empresárias e interesse político [ComADHP, Resolução 224(LI) 2012].
O caso paradigmático, na região Austral, Mike Campbell e Outros contra República de Zimbabwe, de 28 de Dezembro de 2008, tendo culminado com a suspensão do Tribunal da SADC, como fundamento e alternativa ao não cumprimento da decisão. Vale dizer que o aspecto jurídico no desenvolvimento irá abarcar o acesso à justiça, a tutela jurídica efectiva dos bens e direitos fundamentais, o recurso aos tribunais para sindicar os direitos e liberdades fundamentais dos cidadãos, desrespeitados ou violados no âmbito do desenvolvimento. Neste sentido, é necessário uma independência e imparcialidade do judiciário (institucional, orgânica, administrativa e financeira), para corrigir, garantir e proteger os direitos e liberdades fundamentais no quadro do desenvolvimento.
Caso contrário, ter-se-á um judiciário ao serviço do económico e financeiro, que é claramente insustentável para os Direitos Fundamentais. A este respeito, escrevia, Mbuy Kabunda (2000), as constituições africanas são meramente decorativas. Nelas, os direitos são mais formais do que reais e sistematicamente ignorados nos seus pontos essenciais, em particular os que se referem aos direitos humanos, frente ao Desenvolvimento [político, económico e financeiro].
Por último, porém, não menos importante, os Tribunais são o último reduto na defesa dos direitos, liberdades e interesses legalmente protegidos dos cidadãos; na repressão da violência e violações da legalidade democrática; e na resolução dos conflitos de interesses públicos e privados. Em fi m, o baluarte por antonomásia dos Direitos Humanos Fundamentais, pelo que o seu enfraquecimento com golpes políticos e económicos é adiar a construção de um verdadeiro Estado de Direito e Democrático.
POR: João Francisco
1 Comentário
Franjoan Qua, 14 Abr 2021 às 10:47
Interessante reflexão e profunda.
o autor soube transmitir a idea da vinculação entre os Direitos Fundamentais e sustentabilidade, no quadro do constitucionalismo. Pelo que a conciliação entre Desenvolvimento e Direitos Fundamentais deve ser um imperativo para os Países Africanos.