Angola continua imprópria para pessoas com deficiência

Angola continua imprópria para pessoas com deficiência

Barreiras arquitectónicas, comunicacionais e de sensibilidade são os principais entraves que as pessoas portadoras de deficiência enfrentam diariamente para circularem por diversas artérias do país, revelou ontem, a este jornal, o coordenador da Comissão de Gestão da Federação Angolana das Associações de Pessoas com Deficiência (FAPED), Venceslau Mujinga

O líder associativo, que é portador de deficiência visual, declarou que terminada, no dia 01 do corrente mês, a moratória de cinco anos que a Lei das Acessibilidades, Lei n.º 10/16, de 27 de Julho, estabelece para que as instituições públicas e privadas eliminassem as barreiras acima mencionadas quase tudo permanece na mesma.

Contou que a esperança de que as limitações que impedem as pessoas nessa condição de se locomoverem, sem dependerem de terceiros, pelas cidades do país que se apossou deles aquando da aprovação da Lei pelos deputados à Assembleia Nacional, a 07 de Junho de 2016, acabou sendo defraudada. “Posso dizer que não se fez nada. Basta circularmos pela cidade de Luanda, a capital do país, para vermos que os edifícios continuam com as mesmas barreiras”, frisou.

Para ser mais preciso, Venceslau Mujinga disse que, por força da lei, os gestores dos edifícios quer sejam públicos quer sejam privados deviam criar mecanismos para facilitar a circulação dos deficientes, como rampa de acesso, sistema de som de leitura de andares nos elevadores, a enumeração em braile, entre outros mecanismos apropriados para o efeito.

Segundo o interlocutor, depois de ultrapassar tais barreiras de acesso, há outras no interior dos edifícios que se deve ter em conta, como a falta de lavabos e urinóis adequados.

No seu ponto de vista, apesar dos avanços que se registam em alguns dos novos edifícios, muitos dos quais, senão todos, erguidos antes da entrada em vigor da referida lei, nota-se que há algumas adaptações neste sentido, mas ainda estão muito aquém do desejado. “Em alguns dos novos edifícios há instruções em braile nos elevadores, mas não há instrução em áudio nem gestual”, frisou.

Venceslau Mujinga ressaltou que outro grande empecilho que os seus associados enfrentam está relacionado com as dificuldades de locomoção nos transportes públicos, quer seja aéreo, terrestre ou marítimo.

Segundo o coordenador da Comissão de Gestão da FAPED, os autocarros públicos não foram adaptados para transportarem as pessoas nessa condição, uma vez que não têm rampas muito menos um sistema sonoro que orienta as paragens. Apontou a ainda a inexistência de ecrãs com profissionais a informar os passageiros através de linguagem gestual.

“As pessoas que sobem nestes transportes sem saberem ao certo aonde estão a ser levadas por não existirem instruções”, sublinhou. Esclareceu que essa dificuldade é sentida também por aquelas pessoas que se deslocam ao exterior do país abordo dos aviões da companhia aérea nacional, TAAG. O contrário acontece com companhias como a TAP, cujas aeronaves estão equipadas para apoiar passageiros com algum tipo de deficiência.

Apesar de reconhecer que nunca andou de navio, cogitou que existirem as mesmas barreiras.

Insensibilidade

Por outro lado, o líder da FAPED defende que há ainda a barreira comportamental por vencer. Esta se consubstancia na forma como os deficientes são encarados pela sociedade. “Se olharmos para as barreiras mentais, vamos notar que ainda estamos muito longe”, frisou.

A título de exemplo, contou que quando se encontram em algum país da Europa consegue circular livremente sem necessitar de acompanhante. Tudo porque qualquer cidadão com que se depara na rua demonstra ter consciência de que deve prestar apoio as pessoas na sua condição. “A pessoa questiona sobre o táxi que vai apanhar e é logo orientada. Até o taxista ajuda. Mal te deixa no destino, se lhe disseres que terás de apanhar outro, ele te ajuda”, enfatizou.

Para Venceslau Mujinga, a falta de sensibilidade que existe no nosso país pode ser vista na forma como algumas das empresas que intervêm na via publica o fazem, em flagrante desprezo aos deficientes. “O pessoal da ENDE e da EPAL cavam buracos na via pública e não tapam. Os automobilistas estacionam no passeio, local reservado para os pedestres. Não levam em consideração que agindo assim estão a impossibilitar a circulação de pessoas portadoras de deficiência”, frisou.

Quanto às barreiras comunicacionais, enfatizou que os semáforos espalhados pelo país não dispõem de alarmes para sinalizar quando está verde, vermelho ou laranja de modo a orientar os deficientes visuais. As paragens não têm sinais gestuais e de voz. “A TPA está a dar um bom exemplo com a inserção da linguagem gestual no seu principal serviço informativo, mas precisamos de não ficar por aí. Não temos jornais que publicam informação em braile”, frisou.