Política a 360º graus

Política a 360º graus

Nos últimos dias o Presidente João Lourenço surpreendeu a sociedade angolana, na companhia da Primeira Dama Ana Dias Lourenço, sendo ambos vacinados contra a COVID-19, contrariando boatos que davam como certa a informação posta a circular nas redes sociais que havia sido vacinado, aquando da sua viagem privada aos Emirados Árabes Unidos (DUBAI), o que gerou uma onda de comentários, uns ao seu favor e outros contra. No meu entendimento esteve bem ao fazê-lo agora, tal como seria normal se o fizesse anteriormente, ou seja, no momento de início do processo de vacinação em Angola, pois a julgar pela onda de contestação social que vive, por tudo ou por nada, se o tivesse feito logo inicialmente também choveriam críticas a respeito, alegando que não dá o exemplo e que os políticos, os gestores públicos são sempre priorizados em tudo. Infelizmente, há os que nunca se contentam com nada, vendo o errado em tudo.

Outro assunto da actualidade, é a deslocação do Chefe de Estado a Paris, para participar na Cimeira sobre a economia africana, cuja iniciativa coube a França, com os Estados Africanos representados ao mais alto nível com o objectivo para dialogarem em relação a assuntos de extrema importância para o continente, entre os quais, à divida externa dos países africanos, o investimento privado, a construção de infraestruturas e as reformas económicas a serem implementadas ou que estão em curso nas nações africanas. À margem do evento, o Presidente João Lourenço reúne com o Presidente francês Emanuel Macrón, com o Presidente da África do Sul Cyril Ramaphosa, com o Primeiro-Ministro de Portugal António Costa e com potenciais investidores. Não é novidade iniciativas do género pelos franceses, porém, os resultados anteriores nunca foram muito animadores na perspectiva dos africanos que normalmente têm saído em desvantagem no que diz respeito às relações bilaterais com aquele país europeu, que tem funcionado mais numa lógica de “neocolonialismo” do que outra coisa.

Neste momento, interessa a todos os envolvidos um desfecho positivo, atendendo a crise que o mundo enfrenta em consequência da pandemia. Todavia, este certame reveste-se de um interesse particular para os angolanos, embora as expectativas sejam moderadas, na medida em que as dificuldades são enormes e urge a atracção de investimento externo, desde que em condições favoráveis para ambos os lados, ou seja, dentro de um quadro de verdadeira reciprocidade, com vantagens mútuas, através da assinatura de acordos que na prática sejam promotores do nosso desenvolvimento. Não podemos andar constantemente a reboque dos outros e apesar da necessidade de atrair investimento é fundamental que saibamos negociar bem e que privilegiemos aquilo que realmente importa para o nosso crescimento, ou de facto impactante na vida das nossas populações.

Noutro domínio, tem sido alvo de enorme destaque na imprensa brasileira nos últimos dias, o caso IURD, em que um grupo de pastores da igreja recebeu ordem de expulsão do território angolano, alegadamente em consequência das práticas contrárias ao objecto social da igreja e violações à normas constitucionais e a outros dispositivos legais. Nesta matéria, apesar do imbróglio criado a respeito, penso que o Estado Angolano por um lado fez aquilo que se impunha diante dos factos que foram tornados públicos e alvo de inquérito pelas autoridades. No entanto, mais uma vez “deixamos os créditos em mãos alheias”, na medida em que não soubemos lidar com a situação do ponto de vista da comunicação, porque a sociedade angolana e considerando o que alega a outra parte envolvida, não teve conhecimento do resultado do tal inquérito ou do andamento do processo.

Entendo que deveria ter sido assumida esta posição, que reitero, parece-me bem tomada em virtude dos contornos do caso mas era necessário, que não se desse margem de manobra para que o Estado angolano seja visado numa perspectiva das normas do Direito Internacional, acusado a título de exemplo de violação de direitos humanos e da própria Constituição Angolana. Era fundamental que o processo tivesse sido gerido com a máxima lisura, sendo a outra parte comunicada dentro dos prazos legais do procedimento a que seriam sujeitos e lhes fosse concedido o tempo necessário para que pudessem despedir-se das suas famílias, devidamente monitorados e acompanhados dentro do quadro legal. Apesar dos pesares, não acredito que este caso origine um corte de relações entre os dois países, apesar da chantagem e a pressão mediática que tem sido feita neste sentido, porquanto, em sentido contrário em várias ocasiões, embora não com esta dimensão, cidadãos angolanos também têm sido deportados do Brasil para Angola em condições similares, pelo cometimento de infracções diversas.

Há quem defenda que os visados devessem ser julgados e a partir daí condenados ou absolvidos, o que seria aceitável ou o recomendável, mas por outro lado, não interessa ter os nossos estabelecimentos penitenciários superlotados principalmente com estrangeiros o que acarretaria altos custos para o Estado. O interesse nacional neste caso falou mais alto e era necessária a tomada de uma decisão política e assim sucedeu. Noutro domínio, enalteço a transferência de 157 famílias que residiam na zona da Boavista, num cenário de risco, tendo sido conduzidas para o projeto Maye-Maye em Cacuaco e realojadas em habitações condignas. Apesar da necessidade urgente da construção de infraestruturas de apoio naquela localidade, foi certamente motivo de regozijo para aquelas famílias que viviam em condições desumanas. Espero que a partir deste momento continuem a ser acompanhadas pelas estruturas de apoio do Estado atribuindo-lhes o acompanhamento social adequado.

Ainda do ponto de vista social, encaro com muita preocupação a subida de números de mortos devido a COVID-19 que atingiu o número recorde de 18 óbitos num só dia pela primeira vez. Na arena internacional, destaco o banho de multidão que recebeu Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente de Portugal à chegada a Guiné Bissau. Marcelo “Tio Celito” como é carinhosamente chamado por cá. Um homem verdadeiramente carismático e sem sombra de dúvidas uma figura consensual, dado os posicionamentos assumidos e a disponibilidade que demonstra em colaborar para a integração dos emigrantes oriundos de África, das minorias étnicas e dos mais desfavorecidos em Portugal e da vontade inegável de congregar os povos de língua portuguesa, através de acções e por via de discursos que apelam constantemente a unidade e a união entre Portugal e os PALOP.

Lamento o reacendimento do conflito entre Israel e o Hammas na Palestina e uma mais vez o silêncio ensurdecedor da comunidade internacional, que assiste impavidamente a mais uma onda criminosa de ataques dos israelitas, em relação ao povo sofredor da palestina, que há mais de sete décadas sofre a invasão cruel e desproporcional e vai assistindo ao crescimento ilegal do território de Israel que ocupou desde o momento da sua implantação naquele território uma área várias vezes superior, a do território a si originalmente destinado, em manifesto desrespeito às normas de Direito Internacional. Foi bastante confrangedor assistir ao cenário inacreditável de violência e destruição causado pelos ataques, adentrando em nossas casas por via da televisão, onde assistimos em directo o poder da destruição, por via de um bombardeamento israelita, que teve como alvo a agência internacional de notícias Al Jazeera situada em Gaza, tendo destruído a sua sede.

Por último, deixo uma reflexão do Arcebispo de Saurimo, Dom José Imbamba, que atesta a sua visão crítica em relação a nossa sociedade, que apesar de ter sido escrita há quase duas décadas permanece actual e urge o encontro de soluções para os males que nos afligem enquanto sociedade. “Para a doença grave, como a que nos aflige, impõe-se uma terapia de choque, uma cura forte: urge uma moral forte e não uma moral permissiva; é necessária a moral da virtude e não a imoralidade do vício. Só uma moral forte torna forte a cultura do homem. O impulso ético que conduz o homem, como alma e como espírito, é necessariamente um impulso árduo e empenhativo. Sem sacrifício nunca seremos homens autênticos, homens virtuosos, e sem virtude nunca seremos cidadãos honestos, não poderá existir convivência social pacífica nem se há de conseguir edificar aquela sociedade perfeita que deve ser o Estado”.

POR: Omar Ndavoka Abel