Feitiçaria e conflito de terras preenchem trabalhos no Tribunal Consuetudinário do Zaire

Feitiçaria e conflito de terras preenchem trabalhos no Tribunal Consuetudinário do Zaire

O Tribunal Consuetudinário do Zaire, também conhecido como Tribunal Tradicional, tem preenchido os seus trabalhos maioritariamente com casos que envolvem acusações de feitiçaria e conflito de terras. Semanalmente, segundo o representante da corte do antigo Reino do Congo, recebem quatro casos para tratamento

Localizada na região Norte de Angola, a província do Zaire tem 40.130 Km₂ e regista diariamente muitos casos de conflito de terras, que vão para além da intervenção dos órgãos de justiça e as soluções passam pelo Tribunal Consuetudinário. Não obstante, a acusação de feitiçaria também tem ocupado espaço nestas paragens. No Lumbo – antigo Reino do Congo, que agora foi considerado pela UNESCO como Património Mundial, funciona o Tribunal Consuetudinário, que julga, entre os vários assuntos, principalmente questões relacionadas com acusações de feitiçaria e conflito de terras.

Segundo Afonso Mendes, representante da corte do antigo Reino do Congo, que conversou com o jornal OPAÍS, o tribunal por si dirigido, tem recebido muitos casos do género, nas Quartas e Sextas, dias reservados para o tratamento destas questões. Semanalmente recebem uma média de quatro casos, que têm merecido o devido tratamento da corte, composta por mais de duas dezenas de elementos.

A corte, para além de guardar aquele importante espaço, a memória histórica, preserva a cultura angolana. “Só para terem noção, nesta sala, em que nos encontramos, funciona o Tribunal Consuetudinário, onde julgamos os casos de conflitos registados nas comunidades. O património está conforme e estável”, disse.

Afonso Mendes reconhece que tem uma responsabilidade enorme, a de ocupar o cargo de representante da corte do antigo Reino do Congo, um reino de tamanha envergadura, pelo que acredita que tem cumprido com todo zelo o trabalho e cuidadosamente a corte preserva tudo aquilo que foi deixado pelos ancestrais.

Trabalho para educar a geração jovem.

O representante da corte disse ainda que a juventude de Mbanza Congo respeita as autoridades tradicionais e o valor histórico que tem a província, apesar da aculturação ou da globalização.

“Nós temos envidado esforços no sentido de incutir neles a nossa cultura. Não ficamos atrás e tem surtido efeito. Devem saber respeitar a cultura, os mais velhos, pois amanhã serão eles. Quando acabarmos a nossa época, são os jovens de hoje que ocuparão o nosso lugar, por isso, não podemos caminhar sem educar estes jovens, sem mostrá-los o valor da nossa história”, reforçou.

A corte é composta por 25 elementos, a contar com o representante máximo do antigo Reino do Congo. O património está conforme, desde a data que esta estrutura passou a categoria de Património Mundial, e tem sido visitado por várias entidades, tanto nacionais quanto estrangeiras.

Muitos são os turistas, segundo o entrevistado, que têm recebido, bem como os jovens da cidade de Mbanza Congo, que passaram a valorizar o sítio. Os elementos que fizeram com que fosse considerado Património Mundial pela UNESCO têm sido motivo de curiosidade, nomeadamente o Kulumbimbi, o Cemitério dos antigos Reis do Kongo, o Yala- Nkuwu – a árvore historial, o Sumbilole – local onde se lavava os corpos dos reis, entre outros.

Boa coabitação com o MINJUSDH

Nesta questão da actuação do Tribunal Consuetudinário é chamada a comentar o Ministério da Justiça e dos Direitos Humanos (MINJUSDH) e, neste particular, o delegado provincial do Zaire, Nicolau Sozinho, disse que a coabitação com o referido tribunal tem sido boa.

“Nós temos o Tribunal Tradicional, que julga casos que ocorrem nas comunidades e muitas vezes que envolvem práticas de feiticismo e conflitos de terra. A nível do fórum jurídico esta questão do feiticismo não tem respaldo legal e enviamos ao Tribunal Tradicional”, referiu.

Nicolau Sozinho reforçou que está montado um sistema para protecção e promoção dos direitos humanos na província do Zaire, com a constituição, desde 2020, do Comité Provincial dos Direitos Humanos.

Integram ao referido comité os membros da sociedade civil, as autoridades tradicionais, os responsáveis das igrejas mais representativas, e os observados da magistratura judicial, bem como o Ministério Público da província. Este sistema tem ajudado bastante no controlo das violações dos Direitos Humanos naquela província.

“A coabitação entre o Tribunal Tradicional e o Comité tem sido boa. Os próprios membros do comité trazem muitas boas-novas e não temos tido qualquer problema com os mais velhos do Lumbo (antigo Reino do Kongo)”, reforçou.