PGR 42 anos: Mudanças no panorama político “injecta” maior proactividade na recuperação da credibilidade do país

PGR 42 anos: Mudanças no panorama político “injecta” maior proactividade na recuperação da credibilidade do país

Especialistas convergem na ideia de que, se, no passado, a PGR, que hoje está a completar 42 anos de existência, tivesse maior actuação e proatividade, talvez, no presente, não estariam em elevada medida o número de gestores públicos às contas com a justiça, dos quais destacam-se ex-ministros, governadores, directores de empresas públicas, directores de gabinetes estratégicos e até mesmo filhos e pessoas próximas ao ex- Presidente da República, José Eduardo dos Santos

Para muitos especialistas, 2017 foi o ano do acordar da letargia que, durante décadas, a Procuradoria- Geral da Republica (PGR) estava submetida ao assistir impávida e serenamente a uma série de denúncias contra gestores públicos e instituições estatais.

Durante anos, a falta de actuação do órgão, que hoje comemora 42 anos de existência, desde que foi fundada, no dia 27 de Abril de 1979, contribuiu para a disseminação do sentimento de impunidade, o que levou o país ao descalabro com graves consequências económicas e sociais.

Porém, a grande maioria de denúncias que hoje se assiste de gestores públicos que faziam “festinhas privadas” com dinheiros públicos, são resultados das más acções de um passado em que a PGR assistia serenamente, advogam observadores da política nacional.

A título de exemplo, recentemente, o procurador-geral da República, Hélder Pitta Gróz, anunciou que nos últimos anos foram instaurados mais de 1.500 processos crimes, envolvendo corrupção, peculato, nepotismo, branqueamento de capitais, entre outros, além de recuperados activos acima de cinco mil milhões de dólares.

Neste sentido, especialistas convergem na ideia de que, se, no passado, a PGR tivesse maior actuação e proatividade, talvez, hoje, não estariam em elevada medida o número de gestores públicos arrolados em casos de corrupção e que já estão às contas com a justiça, dos quais destacam-se ex-ministros, governadores, directores de empresas públicas, directores de gabinetes estratégicos e até mesmo filhos e pessoas próximas ao ex-Presidente da República, José Eduardo dos Santos.

No entanto, para os entendidos, o “princípio do fim da festa” em torno do bem público deu-se em 2017 com a mudança de paradigma político, o que o forçou a uma maior proactividade e acção da PGR, sobretudo para a recuperação da imagem do país quer internamente quer no exterior, sendo certo que devido a forma como o país foi gerido asfixiou e afugentou muitos investidores internacionais.

Em declarações a OPAÍS, na avaliação de desempenho do órgão, Albano Pedro, jurista, disse não ter dúvidas de que a filosofia de governação de João Lourenço, cujo foco centra-se no combate à corrupção, obrigou a PGR a acordar da letargia, situação que, no seu entender, está a contribuir para a credibilidade do sector da justiça diante dos cidadãos e a recuperação da imagem do país no exterior.

A recepção de Angola do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) de Portugal da lista de fortunas que vários cidadãos angolanos têm naquele país europeu, é, para o jurista, parte deste processo de mudança e maior proactividade que a PGR está a engendrar.

Porém, a notícia, avançada ontem, pela imprensa portuguesa, refere que da lista constam nomes de filhos do ex-Presidente de Angola, como Isabel, Tchizé e Zenu dos Santos, o antigo chefe da Casa Militar Manuel Hélder Vieira Dias e o antigo chefe das secretas angolanas, Leopoldino Fragoso do Nascimento.

O relatório com a informação tem mais de 7 mil páginas e detalha as contas bancárias, aplicações financeiras em fundos de investimento, mas também imóveis e participações em empresas.

A decorrência de um alinhamento

Em Fevereiro do ano passado, a Procuradoria-Geral da República de Angola solicitou auxílio a Portugal para localizar bens de cidadãos angolanos que tivessem, em Portugal, imóveis, investimentos mobiliários e contas bancárias. O pedido tinha sido feito numa reunião entre Hélder Pitta Grós, procurador- geral da República de Angola, e a homóloga em Portugal, Lucília Gago.

Para Albano Pedro, todo esse processo decorre do alinhamento e da posição política em acção. Conforme explicou, diferente dos tribunais, que são órgãos que devem ser independentes, a PGR é um órgão hierarquizado e depende efectiava e directamente do Presidente da República por ser o topo da pirâmide.

“E, naturalmente, toda aquela situação de apatia que assistíamos durante o mandato do Presidente José Eduardo dos Santos, em que a PGR basicamente não acionava crime público nenhum, estava relacionada a conjuntura anterior. E o que se assiste actualmente deve ao momento político inaugurado pelo Presidente João Lourenço na qualidade de mais alto magistrado da Nação”, apontou.

Alargar a actuação Ontem, a Procuradoria-Geral da República abriu a semana da legalidade com uma série de eventos desde colóquios, palestras, encontros e ciclos de conferência que, até amanhã, dia 28, tem como propósito elucidar o público sobre o papel e importância do órgão no sistema nacional de justiça. Para o sociólogo Castro Santareno, apesar dos ganhos a nível do sector da justiça, a actuação da PGR tem sido parcial na medida em que parece ter maior actuação contra um grupo menos contra outros.

“Actuação deve ser alargada. Ainda temos muita gente próxima ao actual poder que é acusada de diversos crimes e não são tocados pela PGR. Dá um sentimento de parcialidade o que não é bom”, apontou.

Desafios

Uma das dificuldades que o órgão de justiça enfrenta, segundo o procurador-geral, Hélder Pitta Gróz, prende-se com a diminuta quantidade de recursos humanos.

Conforme deu a conhecer, recentemente, em 2020, a PGR funcionou com 565 magistrados do Ministério Público em todo o país, um rácio de 1,8 por cada 100 mil habitantes, o que se mostra aquém das recomendações das organizações internacionais que apontam para um ideal de sete procuradores para cada 6 mil habitantes.

Hélder Pitta Gróz disse igualmente que é também insuficiente o número de funcionários administrativos e técnicos de justiça.

Continuar a luta

Apesar de muitos continuarem ainda a remar em sentido contrário, o Presidente da República, João Lourenço, já deixou claro, recentemente, que a luta contra a corrupção, branqueamento de capitais e a impunidade, o tráfico de drogas e de seres humanos vai continuar no país.

João Lourenço, denunciou ainda a existência de pessoas que, após delapidarem o erário, têm-se forçado e organizado campanhas para denegrir ou desacreditar a justiça e o Estado angolano, tendo assegurado que o seu Executivo não se vai imiscuir na acção da justiça, tendo incentivado os juízes a cumprirem com o seu papel.